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Reforma Tributária: a incrível dificuldade do Congresso de dizer “não”

Votação do projeto que regulamenta a primeira parte da reforma tributária. (Foto: Lula Marques/Agência Brasil)

A imposição de uma trava para a soma das alíquotas dos futuros Imposto e Contribuição sobre Bens e Serviços, criados pela reforma tributária, foi comemorada por políticos de todos os matizes ideológicos como o maior avanço da regulamentação aprovada nessa semana na Câmara dos Deputados.

De acordo com o texto final remetido ao Senado, sempre que a alíquota de referência atingir um percentual superior a 26,5%, o governo deverá encaminhar ao Congresso um projeto de lei complementar propondo reduzir os abatimentos de 30% e 60% para um extenso rol de produtos e serviços que foram considerados merecedores de uma tributação menor do que a aplicada aos demais bens e serviços.

O dispositivo serviu para justificar a nova rodada de concessões dadas a variados setores em meio às pesadas pressões de lobbies ao longo das últimas semanas em Brasília.

O caso das carnes e dos queijos é o que ganhou maior destaque na mídia, mas é importante destacar também a alíquota 30% menor concedida aos planos de saúde animais e a ampliação da alíquota reduzida em 60% para todo e qualquer medicamento registrado pela Anvisa ou produzido por farmácia de manipulação – para ficar em apenas alguns exemplos, pois a leitura atenta das mais de 360 páginas do projeto deve realizar muito mais.

A expansão das isenções e tratamentos especiais para alguns setores inevitavelmente levará a uma elevação da alíquota a ser aplicada aos demais produtos e serviços, uma vez que os governos federal, estaduais e municipais não estão dispostos a abrir mão de arrecadação.

A ideia da trava de 26,5%, portanto, nada mais é do que uma esperta manobra dos deputados em exercício. De um lado, ao criar esse limite superior, passam a ideia de que estão preocupados em não aumentar a carga tributária. Na prática, porém, simplesmente jogaram a responsabilidade por eventuais cortes para o governo e os parlamentares do futuro – com chances mínimas de isso vir a acontecer.

Em outras palavras, os parlamentares, comandados por Arthur Lira, não tiveram a coragem de dizer “não” para os poderosos lobbies que os pressionam e, em alguns casos, os patrocinam, e jogam para a torcida com uma trava que simplesmente não vai funcionar. Afinal, vivemos no país em que metas, tetos e arcabouços são muito bonitos na lei, mas que só duram até serem substituídos por outros instrumentos muito bem-intencionados, mas igualmente inefetivos.

Lobby

E por falar em lobby, alguns dos mais poderosos setores da economia brasileira também conseguiram ampliar suas vantagens.

No caso do agronegócio, além da inclusão das carnes na cesta básica, houve a expansão de outros benefícios, como as alíquotas reduzidas para insumos como defensivos agrícolas, o tratamento ainda mais especial para as cooperativas ou a retirada da aplicação dos novos tributos ao Fiagro.

As mineradoras, por sua vez, protagonistas de alguns dos maiores desastres ambientais e sociais do país nos últimos tempos, como Mariana, Brumadinho e o afundamento de Maceió, conseguiram reduzir a alíquota máxima do seletivo de 1% para 0,25%.

O agro e a mineração são, aliás, um caso espantoso de setores que se vangloriam das vantagens comparativas, da competitividade internacional e das exportações recordes, mas que são insaciáveis na busca por mais e mais benefícios governamentais.

Mais incentivos

Outro exemplo de ineficiência que sobrevive à custa do contribuinte e do consumidor brasileiro, sempre convocado a arcar com incentivos fiscais e produtos caros e de baixa qualidade, é o setor automobilístico. Na decisão do Congresso de incluir veículos elétricos na lista dos itens passíveis de cobrança do imposto seletivo, prevaleceu o protecionismo das montadoras instaladas no Brasil, que estão atrasadas no processo de eletrificação e vêm perdendo mercado para as concorrentes chinesas.

A indústria de bebidas também conseguiu arrancar uma legislação posterior que vai diferenciar a cobrança do imposto por tido de produto e teor alcoólico e ainda uma implantação gradual até 2033.

Esses são apenas alguns dos benefícios concedidos nesta nova rodada do feirão de benesses promovido pelo Congresso Nacional na reforma tributária.

A cada votação, o País se afasta mais um pouco das melhores práticas internacionais, beneficiando algumas poucas empresas em detrimento de milhões de pagadores de impostos e consumidores.

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