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Mundo O balanço das convenções: num país rachado em dois, Donald Trump e Joe Biden apelam para o medo do futuro

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Chance de Trump (D) e Biden conquistarem 269 delegados, cada, é remota, mas não improvável. (Foto: Reprodução)

O adversário é uma ameaça ao futuro dos Estados Unidos. Essa mensagem de temor pela própria sobrevivência do país foi o alerta tanto de republicanos quanto de democratas nas convenções dos partidos, que terminaram nesta semana. A rejeição ao outro lado é tão profunda que ultrapassa visões de mundo: eleitores de cada um dos lados enxergam realidades diferentes sobre os próprios problemas que afligem o país.

“O que Trump fez, e, de certa forma, Joe Biden também, foi colocar a eleição em termos de bem contra o mal, nós contra eles, luz contra escuridão”, diz o professor de Ciências Políticas David Schultz, da Hamline University, sobre os discursos do presidente e do candidato democrata nas convenções de seus partidos. “Nem Trump nem Biden enfatizaram muito políticas públicas ou suas visões para os EUA, ainda que Biden tenha feito isso um pouco mais. Ambos tentaram assustar os eleitores indecisos”, completou.

A estratégia do presidente é energizar a base. Como a maioria dos americanos já decidiu quem prefere, a questão é quem irá se animar a votar em um país em que o voto não é obrigatório. Entusiasmar os eleitores deixando-os com raiva e medo pode funcionar, acredita o professor, já que a base de Trump está mais empolgada do que a de Biden.

O discurso do presidente também tentou atingir os indecisos, principalmente mulheres dos subúrbios. Nesse caso, o objetivo não é ganhar o voto, mas sim convencê-las a não sair de casa para votar em Biden. Trump teve o apoio dos subúrbios em 2016, mas, em 2018, as mulheres dessas regiões deram vitória aos democratas no Congresso, o que garantiu ao partido maioria na Câmara.

“Trump tem que ter a esperança de convencer eleitoras suburbanas de que não devem votar em Joe Biden e que um voto nele pode ser um convite para que os tumultos se expandam para os subúrbios”, diz o professor.

O objetivo do discurso do presidente não é expandir sua base de homens brancos trabalhadores, sem educação superior, geralmente morando em áreas rurais e em alguns dos subúrbios, acredita David. Esse grupo apoiou o presidente há quatro anos e, se comparecer novamente em número maior, Trump poderia ganhar as eleições contando apenas com ele.

Dois Estados Unidos

Já os democratas precisam unir um grupo mais diverso para garantir as eleições. Por isso, o discurso foi além do medo, em uma narrativa de “esperança” e “luz”, duas das palavras mais usadas no discurso de Biden. O especialista em pesquisas e estratégias eleitorais John Zogby chama esse grupo heterogêneo que o ex-vice-presidente precisa conquistar de “Coalizão Obama”: eleitores não brancos, jovens, a classe criativa e da economia do conhecimento e jovens mulheres.

As duas convenções falaram para dois Estados Unidos diferentes, baseados em recortes raciais, etários, geográficos e religiosos. As principais questões da campanha deste ano serão economia, coronavírus, sistema de saúde, racismo, imigração e mudanças climáticas.

Mas a divisão entre os dois Estados Unidos trará também duplas de temas que se oporão dependendo de que lado da disputa os eleitores estão, segundo Zogby. De um lado, ciência e de outro ceticismo, temas relacionados tanto ao coronavírus quanto a mudanças climáticas. Também estarão em jogo: empatia e raiva; estabilidade e ruptura; a saúde como um direito ou a saúde como um privilégio; e os movimentos “Vidas Negras Importam” e “Vidas Azuis Importam”— o azul, nos EUA, é associado às forças policiais.

O desejo por estabilidade é o que teria feito Trump perder apoio entre eleitores com mais de 65 anos, que reprovam seu trabalho frente ao coronavírus. O presidente poderia tentar reconquistá-los, acredita Zogby. Já os temas da lei e da ordem podem ter apelo entre mulheres do subúrbio. Uma última aposta seria tentar ganhos marginais entre negros e latinos, entre os quais o presidente tem baixíssimo apoio —teve apenas 9% do voto negro em 2016. Um apoio um pouco maior, entre 15%, já melhoraria sua situação.

Somando esse eleitorado mais velho, as mulheres, poucos negros e latinos e o núcleo da base, Trump já poderia contar com um eleitorado mais heterogêneo.

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