Sexta-feira, 31 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 3 de dezembro de 2020
Na disputa pela vacina da covid-19 em 2021, ter dinheiro na mão deve fazer pouca diferença no Brasil, pelo menos nos primeiros meses. Por conta da demanda do setor público, clínicas particulares de imunização só esperam começar a receber as primeiras doses do produto somente no segundo semestre do ano, e isso num cenário otimista.
A estimativa é da ABCVAC (Associação Brasileira das Clínicas de Vacinas), que representa o segmento privado do setor. Segundo Márcia Faria Rodrigues, da diretoria científica da entidade, não faz sentido, nem é possível, travar uma disputa agora com os governos.
“A prioridade mundial neste momento é direcionar a vacina para os grupos de risco. Se você distribui doses agora para as clínicas privadas, como garante que a vacina vai chegar primeiro em quem realmente precisa?”
A médica afirma também que antes de as campanhas de vacinação começarem e o cenário público ficar mais claro, não é possível nem saber quais fabricantes terão excedente de vacina para clínicas privadas. O governo federal anunciou na última terça (2) que a campanha de vacinação do Brasil deve começar num grupo restrito que inclui profissionais de saúde e idosos acima de 75 anos.
Das dez vacinas que estão em fase final de testes mundo afora, apenas uma já obteve autorização balizada por resultados de eficácia (a Pfizer, no Reino Unido), e ainda não é possível saber quais serão os imunizantes disponíveis para o setor privado após os governos comprarem seus lotes.
“Achamos que é num segundo momento, com a aprovação de mais vacinas, que a gente pode ter direcionamento para as clínicas particulares”, diz Márcia. “Esperamos isso no segundo semestre de 2021, ou só mesmo em 2022. Vai depender da capacidade dos produtores.”
Segundo Mônica Levi, médica do corpo clínico da Cedipi, centro de imunização particular no bairro dos Jardins, em São Paulo, uma boa parte da clientela já busca saber informações sobre chegada da vacina. Os médicos, porém, não possuem resposta ainda.
“Acho provável que no segundo semestre teremos vários produtos licenciados e que terá algo para atender o mercado privado também. Nós só não sabemos quais vacinas serão, quanto vão custar nem para quais idades estarão aprovadas. Tem gente fazendo bolão, apostando se vai vir ou não vai vir no ano que vem”, afirma.
Imunizacão caiu
Desenvolvedores de vacina estão limitando a negociação de fato ao setor público.
“São sim os grupos prioritários que vão receber a vacina por enquanto. Não existe nenhuma sinalização por parte da empresa de se trabalhar no mercado privado de clínicas de vacinação nem em hospitais”, diz Alejandro Lizarraga, diretor da área de vacinas da Pfizer Brasil.
Segundo o executivo, se a farmacêutica não conseguir fechar um acordo com o governo brasileiro para direcionar sua produção da nova vacina para o SUS, os lotes devem ser negociados com o setor público de outros países, não com o setor privado do Brasil.
A ausência de uma vacina de covid-19, porém, não deve ser motivo para que clínicas particulares de vacinação fiquem vazias em 2021. Segundo a SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), o índice de imunização para quase todas as doenças caiu em 2020.
“As recomendações para isolamento e distanciamento social impostas pela pandemia de covid-19, o medo da população de se expor ao vírus e outros fatores estruturais levaram a uma importante redução na procura pela vacinação em 2020”, escrevem as médicas Flávia Bravo e Isabella Ballalai, na última nota técnica do grupo. “O cenário resultou em um grande contingente de crianças em atraso com seus calendários vacinais.”
Em comparação com 2015, caíram coberturas vacinais da tríplice viral (de 80% para 56%), poliomielite (98% para 66%) e BCG (95% para 64%), entre outras, continuando tendência preocupante já observada em 2019. Se uma pequena fração das crianças em atraso vacinal se direcionar a clínicas privadas, como é de costume, já será o suficiente para devolver o movimento ao setor, afirma a ABCVAC.