Quarta-feira, 27 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 11 de maio de 2022
Frio, calor, violência física e psicológica, fome, contração de doenças, depressão e até suicídio estão entre os problemas vividos por detentos em presídios nacionais. Mas, para parte considerável dos brasileiros que estão presos no exterior, o martírio relatado a familiares e advogados inclui a barreira da língua, o isolamento e a condição de imigrante.
Dados do Itamaraty mostram que, em 2020 – última atualização – havia 3.138 brasileiros que cumpriam ou aguardavam julgamento em 84 países. O número está 37% abaixo do ano anterior. Apesar de ter diminuído de 2019 para 2020, é um número superior ao registrado em 2011, quando havia 2.586 presos, aumento de 21,35% em relação ao volume contabilizado no início da década. Segundo o levantamento, obtido pelo jornal O Globo por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), do total de presos em 2020, 67,65% eram homens e 88,8% tinham mais de 18 anos.
Gleiston Andrade, de 53 anos, que está em uma prisão no estado da Califórnia, foi condenado por crime sexual a 203 anos e já cumpriu 12 deles. Sua irmã, Ligiane Andrade, garante que ele é inocente e que estava no local e na hora errada. Mas que o fato de ser imigrante culminou num julgamento desfavorável.
“A polícia vinha sendo muito criticada, porque não conseguia pegar um estuprador em série, que havia atacado cinco mulheres. As vítimas diziam que o homem era russo e meu irmão não tinha medo, pois era inocente. Porém, no dia do julgamento, meu irmão, um imigrante, sem dinheiro, foi condenado”, diz ela.
Ligiane só consegue visitar o irmão uma vez por ano. Ela fica na Costa Leste dos Estados Unidos e ele está na Costa Oeste. Gleiston tem dois filhos, um de 24 e outro de 20 anos, que moram a sete horas de distância do presídio. Antes de ser preso, o brasileiro, que está há 25 anos nos EUA, trabalhava como caminhoneiro e mecânico.
Uma vez na prisão, Gleiston passou por outros apuros: foi ferozmente atacado por um colega de cela. Está cego de um olho, surdo de um ouvido e com vários problemas de saúde.
“Estamos tentando a extradição dele para o Brasil e também aguardamos uma reavaliação do presídio, que deverá acontecer em 2024, para a redução da pena”, diz Ligiane.
Segundo o Itamaraty, a Europa concentrava 40% dos brasileiros detidos, com 1.258 pessoas, ou 40% do total, com Portugal à frente (319). Em seguida estão América do Sul (32,5%), América do Norte (12,75) e Ásia (8,7%).
A maior parte dos crimes é por narcotráfico e porte de drogas, com um total de 748 pessoas, mais do que o triplo dos casos de homicídio (219), que estão na segunda posição. Os demais ilícitos relatados são furto ou roubo (199), prostituição ou proxenetismo (113), estupro e outros crimes sexuais (103), agressão (98) e fraude (56), entre outros.
O advogado Maurício Ejchel, especialista em direito internacional, confirma que a maioria das pessoas para as quais presta assistência jurídica, direta ou indiretamente, está detida por tráfico de drogas em diferentes países, tanto nos EUA e na Europa, quanto em nações extremamente complexas no trato com estrangeiros que cometem crimes.
“Há um volume muito grande de pessoas na Turquia e em alguns países do Oriente Médio, como Dubai, e do Extremo Oriente, como Tailândia e China. Alguns desses países chegam a ter pena de morte por tráfico internacional de drogas”, diz o especialista.
Ele lembra que dois brasileiros, Marco Acher e Rodrigo Gularte, foram executados na Indonésia por esse motivo em 2015. E ressalta que, recentemente, três outros brasileiros foram presos com cocaína na Tailândia e correm o risco de também serem condenados à morte: Mary Helen Coelho Silva, Jordi Vilsinski Beffa e Ricardo de Almeida Rosa.
Presa por tráfico de drogas em fevereiro, a mineira Mary Ellen, de 21 anos, é atendida por um defensor público na Tailândia. Telêmaco Marrace, advogado que lhe presta assistência no Brasil, reclama que há dificuldade de comunicação. A maioria dos agentes prisionais não fala inglês.
Marrace diz que tenta trazer Mary Ellen para ser julgada no Brasil, onde pegaria uma pena menor do que na Tailândia, que prevê períodos longos de detenção, além de prisão perpétua e até pena de morte. Ele também avalia a possibilidade de um perdão real, mas acredita que isso só é possível para condenados, o que demoraria mais tempo.
“Muitas pessoas, como Mary Ellen, estão em situação vulnerável e se tornam mulas para o tráfico, sem saber que estão entrando em uma grande fria”, disse Marrace.
Renata Castro, advogada de imigração de atende brasileiros nos EUA, destaca que muitas pessoas saem do país em busca de uma vida melhor, mas são barradas por desconhecerem a legislação do país. “A grande dificuldade que as famílias têm ao saber que há um ente detido pela imigração é entender que existem consequências reais nos EUA por violar leis imigratórias. O que a gente ouve muito é: não sou um criminoso, não sei por que me prenderam, não sabia que iam me prender”, diz a advogada, que lembra que o preço a pagar é alto, como os custos de representação legal, por exemplo. As informações são do jornal O Globo.