Quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 6 de julho de 2022
O senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, decidiu pautar na sessão da CCJ da quarta (6) a proposta de emenda à Constituição (PEC) que autoriza parlamentares a manter o mandato se assumirem alguma embaixada.
Integrantes da CCJ disseram que foram pegos de surpresa com a decisão. Isso porque souberam somente na noite anterior que a PEC havia sido incluída na pauta da quarta.
A proposta tem recebido críticas de senadores e debatedores. Eles manifestaram preocupação com os efeitos dessa medida para a política externa brasileira, e citaram como um de seus riscos o conflito entre interesses nacionais e motivações políticas e paroquiais, além de questionamentos quanto à constitucionalidade da proposta.
Segundo alguns integrantes da CCJ, Davi Alcolumbre não comunicou com antecedência que pautaria a PEC, como é praxe quando se trata de projeto considerado polêmico. “Recebemos a pauta e estava o projeto lá, sem qualquer chance de mobilizarmos uma reação ou a presença física, como seria importante neste caso”, afirmou um senador.
Alguns senadores afirmaram que o texto da PEC tem tramitado a toque de caixa, sob patrocínio de Alcolumbre. A pauta contaria com a simpatia do presidente Jair Bolsonaro, segundo outro membro da CCJ disse ter ouvido do próprio Alcolumbre.
Atualmente a Constituição prevê a manutenção do mandato parlamentar quando deputados federais ou senadores estiverem chefiando missão diplomática temporária. Mas para exercer o cargo de embaixador (missão diplomática permanente), o parlamentar tem de abandonar seu mandato.
Conflito de interesses
Para o ex-ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira, a carreira feita por meio da política permite acúmulo de experiências. No entanto, diferentemente do diplomata de carreira, um parlamentar não teria, segundo o ex-senador, o mérito, conhecimento suficiente e a obediência hierárquica que o cargo de embaixador exige.
— Hoje um parlamentar, se fosse investido nessa função, sem se licenciar, poderia simplesmente desconsiderar uma determinação do presidente. E o que aconteceria com ele? Seria demitido da sua função e retornaria ao mandato. Já o diplomata, não. Teria seriíssimos prejuízos se porventura viesse a descumprir uma determinação, uma orientação da sua chefia — salientou.
Guilherme Stolle Paixão e Casarões, cientista político e professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas, citou como possíveis consequências da aprovação da PEC 34/2021 o uso de embaixadas brasileiras no exterior para atender interesses paroquiais e o risco de se gerar imprevisibilidade na política externa do país. Ele se disse preocupado que as embaixadas sejam utilizadas como moeda de troca num sistema de presidencialismo de coalizão. “E traz um certo componente do “toma lá dá cá” que eu vejo como muito prejudicial em se tratando de política externa”, avaliou Guilherme.
Princípio da isonomia
Segundo o deputado federal Marcelo Calero (PSD-RJ), que é diplomata e também já assumiu cargos nos Executivos federal e estadual, a PEC transmite à sociedade a “mensagem equivocada” de que o Brasil estaria fragilizando um dos seus maiores ativos em termos de função pública: a diplomacia. Segundo ele, este seria o momento de mostrar à sociedade que, independentemente de situações políticas, as carreiras de Estado serão preservadas em nome do interesse público.
Presidente da Associação e Sindicato dos Diplomatas Brasileiros (ADB-Sindical), a embaixadora aposentada Maria Celina de Azevedo Rodrigues observou que a proposta poderia abrir uma brecha para que outros ocupantes de mandatos questionem o princípio da isonomia.
Apresentada pelo senador Davi Alcolumbre (União-AP), a PEC 34/2021 está em análise na CCJ, que é presidida por ele. A relatora da matéria é a senadora Daniella Ribeiro (PSD-PB), que já deu parecer favorável ao texto.