Segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 9 de outubro de 2022
Há épocas do ano em que acumulamos tanta comida que não sabemos o que fazer com ela. É o que acontece, por exemplo, no final do verão com tomates, pimentões, abobrinhas e outros vegetais, principalmente se tivermos uma horta. Para aproveitar toda essa comida e não ter que jogar fora, costuma-se fazer conservas caseiras: ratatouille, pimentões assados, molho de tomate e etc. Assim, garantimos que esses alimentos permaneçam em boas condições por vários meses, prontos para consumo em qualquer período.
As etapas para fazer conservas caseiras consistem em lavar e cortar os alimentos, colocá-los em potes junto com um líquido, que pode ser água com sal ou óleo, fechar esses recipientes com tampa e aquecê-los em banho-maria. Após um tempo, eles são removidos e deixados esfriar de cabeça para baixo para verificar se está completamente vedado.
A técnica, que é transmitida de geração em geração há décadas, parece ser simples. É por isso que existem inúmeros artigos e vídeos na internet incentivando a fazer conservas caseiras seguindo estas instruções. O problema é que alguns fatores essenciais para garantir a segurança e evitar riscos à nossa saúde são, muitas vezes, omitidos.
Riscos
O “segredo” das conservas se baseia em dois pontos. Em primeiro lugar, o aquecimento que aplicamos durante a preparação elimina os microrganismos presentes (especialmente bactérias), responsáveis por estragar os alimentos e que também podem nos deixar doentes. Em segundo lugar, o recipiente deve ser bem vedado para evitar a contaminação dos alimentos. É por isso que esta técnica permite que os alimentos sejam mantidos em boas condições por bastante tempo.
Quando não são bem preparados, eles podem se contaminar com patógenos. O que mais preocupa é o Clostridium botulinum, uma bactéria potencialmente perigosa e resistente ao calor, que pode sobreviver ao tratamento caseiro, se não for bem feito.
Esta bactéria está presente em diferentes ambientes, por exemplo no solo ou em sedimentos aquáticos, por isso pode estar nos alimentos. Ela é capaz de desenvolver formas esporuladas, muito resistentes a condições adversas para a maioria das bactérias, como falta de oxigênio, umidade e nutrientes.
Elas também são muito resistentes a altas temperaturas. De fato, a maioria das bactérias, normalmente encontradas na forma vegetativa, são facilmente mortas por aquecimento abaixo de 100ºC, mas as formas esporuladas de C. botulinum podem resistir até 120ºC. O aquecimento em banho-maria, onde são atingidos 100ºC, pode não ser suficiente.
Essa bactéria produz um dos compostos mais tóxicos conhecidos: a toxina botulínica — a dose letal para uma pessoa de 70 quilos é de apenas 70 microgramas. É uma neurotoxina que causa paralisia muscular. Em caso de envenenamento, a maioria dos pacientes se recupera, mas é uma doença grave. Com uma taxa de mortalidade entre 5% e 10%, pode causar morte por parada respiratória, especialmente se não tratada a tempo.
A esta altura, costuma-se dizer que “bom, na minha casa as conservas sempre foram feitas assim e nunca aconteceu nada”. O mais comum é que nada de ruim aconteça, já que a incidência dessa doença é muito baixa. Na Espanha, são notificados entre nove e 12 casos por ano, um valor pequeno se comparado com o de outras doenças transmitidas por alimentos. Mas a questão é que quando um risco é avaliado, dois aspectos devem ser levados em consideração: a probabilidade de ocorrência e a gravidade.
Talvez isso seja melhor compreendido com um exemplo simples. Ao atravessarmos uma estrada por onde passam poucos trens, como a frequência é muito baixa, é improvável que soframos um atropelamento. Mas em caso do acidente acontecer, será muito grave, por isso é aconselhável ter muita atenção ao atravessar. Da mesma forma, a incidência de botulismo é também possivelmente tão baixa, porque são poucas as conservas caseiras feitas hoje.
Segurança
É possível preservar os alimentos com segurança em casa, mas para isso há algumas coisas muito importantes a ter em mente. Em primeiro lugar, é essencial manter condições higiênicas adequadas:
Nossas mãos, utensílios e superfícies da cozinha devem estar limpos e secos.
Os potes e tampas devem estar limpos, higienizados e secos. Para desinfetá-los, recomenda-se mergulhá-los em água fervente por 15 minutos e depois deixá-los escorrer até que estejam secos. Além disso, os frascos devem estar em bom estado e as tampas devem ser novas, para garantir que fechem hermeticamente.
Os alimentos devem estar limpos e em boas condições. No caso de vegetais (frutas, legumes, verduras), recomenda-se lavar e desinfetar (para isso podemos usar alvejante próprio para uso alimentar, seguindo as instruções do fabricante). Finalmente, é conveniente secá-los com papel de cozinha.
A próxima coisa que devemos fazer é preparar os ingredientes (cortar, descascar, etc.), colocá-los nos frascos, deixando um espaço de cerca de dois ou três centímetros na parte superior para que no final do processo o vácuo possa ser feito bem e, por fim, mexa o conteúdo do frasco para que não se acumulem bolhas de ar no interior.
Depois de fechar os fracos, é hora da etapa mais importante: o aquecimento. Ao aplicar um tratamento térmico, é necessário considerar dois parâmetros: tempo e temperatura. Assim, se a temperatura que aplicamos for muito alta, o tratamento exigirá pouco tempo e vice-versa.