Terça-feira, 26 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 20 de novembro de 2022
Depois de muita pressão do governo do Catar, a Fifa anunciou que bebidas alcoólicas não serão vendidas nos perímetros dos estádios da Copa do Mundo. As vendas só serão permitidas nas áreas do FIFA Fan Festival e em outros locais voltados para torcedores – além de suítes de luxo reservadas para dirigentes da entidade e outros convidados ricos. O pedido de proibição da venda teria partido do sheik Jassim bin Hamad bin Khalifa al-Thani – irmão do emir governante do país-sede e a realeza mais ativa no planejamento do torneio – e conversa diretamente com a cultura, os costumes e a política do país.
Professora de História Árabe do Departamento de Letras Orientais da Universidade de São Paulo (USP), a historiadora Arlene Clemesha explica que o consumo de bebida alcoólica não é proibido pela religião islâmica, mas desaconselhado pelo Corão, livro sagrado dos muçulmanos.
“O consumo de bebida alcoólica de qualquer natureza, historicamente falando, sempre foi um assunto polêmico. O Corão diz que não é recomendável o consumo de qualquer substância entorpecente, incluindo o álcool, em conjunto com a reza (a Salat, cinco orações feitas ao longo do dia). E o muçulmano mais conservador não bebe e não vê a bebida com bons olhos.”
A historiadora lembra, no entanto, que a interpretação do que é falado no livro sagrado “oscilou” ao longo do tempo:
“O Corão não é taxativo, não existe uma proibição, mas há indícios ao longo da história islâmica de que isso oscilou. No Irã no período do Xá (Reza Pahlavi, que governou o Irã entre 1941 e 1979, antes da Revolução Islâmica liderada por Ruhollah Khomeini), havia uma permissividade maior. Hoje, principalmente desde os anos 1970 e em países mais conservadores ou mesmo fundamentalistas, como a Arábia Saudita e o Irã, a bebida é proibida.”
O Catar não proíbe o consumo de bebidas, que são vendidas em bares, restaurantes e hotéis autorizados. Em público, no entanto, o consumo não é permitido.
Ainda segundo Clemesha, generalizar a relação do álcool com países islâmicos é incorrer em erro. Isso porque outros fatores impactam na presença de bebidas no dia a dia desses locais, e até mesmo na proibição ou não.
Ela lembra que no Egito, por exemplo, o álcool não é proibido, mas há regras: as bebidas são vendidas em lojas específicas e são entregues em embalagens opacas, que disfarçam o conteúdo.
“Certamente a presença de uma população árabe cristã no país pesa numa circulação maior de bebidas alcoólicas, mas não dá para generalizar. O sistema político também influencia, como no Líbano, que apesar de problemas, é uma democracia”, analisa.