Terça-feira, 26 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 19 de dezembro de 2022
A história trilhada por Lionel Messi como um dos jogadores mais lendários da história do futebol teve um dos seus melhores capítulos finais no domingo (18), quando o craque liderou a Argentina na conquista do tricampeonato da Copa do Mundo numa vitória épica sobre a França nos pênaltis (4 a 2) após empate em 3 a 3 na prorrogação, no Catar. Com o único título que faltava no currículo, a discussão sobre a posição do sete vezes Bola de Ouro no panteão dos maiores jogadores da história se intensificou. Seria Messi comparável ou até maior que Pelé, o Rei do Futebol? Ou que Diego, um deus para os argentinos? Entenda o patamar das discussões.
Nos frios números absolutos, o argentino equipara-se fortemente ao Rei. São 793 gols oficiais, contra 767 de Pelé. Todavia, contando com jogos não oficiais (muito frequentes na época em que atuava), a contagem de Pelé vai a 1282. Pela seleção da Argentina, Messi foi às redes 98 vezes, sendo 13 vezes pela Copa do Mundo. No Mundial do Catar, superou os 12 gols marcados pelo Rei nas três vezes que disputou a competição. Pelé marcou, no total, 77 vezes com a Amarelinha (em jogos oficiais).
Na história do Rei, um feito inalcançável para “La Pulga” é, definitivamente, o tricampeonato – marca que não será alcançada até, pelo menos, antes da Copa completar 100 anos. Aos 35 anos, Messi anunciou que se despediria das Copas. Sai com um único título, mas comparável em simbolismo à histórica conquista do bi em 1986, com protagonismo de Diego Maradona.
A segunda-feira pós-conquista amanheceu com comparações e referências. “Líos é argentino”, escreveu o jornal “Olé” em sua capa para retratar a conquista, um trocadilho com o nome de Deus e de Messi, por muito tempo atribuído também a Maradona. “Hoje, Messi se transforma no melhor jogador da história – perdão, Diego”, escreveu Hernán Claus em texto para o diário. “Que ele aproveite, é o melhor de todos os tempos. Se algum idiota tinha dúvida, já não tem mais, ele é o melhor. Não vai haver ninguém como ele”, esbravejou o meia De Paul, empolgado com a conquista do título.
Apesar do tom de exaltação, ainda é difícil entre os argentinos traçar uma divisão exata entre Messi e o próprio Maradona. O segundo é alvo de literais cultos, uma entidade no país – imagem ainda mais intensificada por sua morte recente, em 2020. A magia da Copa de 1986 ainda sobrevive no imaginário argentino: naquele mundial, Maradona foi o melhor jogador, autor de cinco gols e cinco assistências, incluindo os icônicos tentos da arrancada e da “Mano de Díos” contra a Inglaterra nos 2 a 1 nas quartas de final. Ainda deu o passe para o gol decisivo de Burruchaga na final contra a Alemanha Ocidental (3 a 2). Não à toa, os argentinos assistiram Messi brilhar com dois gols na decisão – dos seus sete na Copa, além de duas assistências – de uma antiga casa em que morou o ídolo.
A mesma problemática na comparação de imagem vale para o próprio Pelé. O ex-primeiro camisa 10 da seleção brasileira é um ícone cultural do futebol. Foi retratado em inúmeros filmes, série, livros, documentários, obras de arte, entre outros. Fruto de um talento avassalador, um jogador que mudou o futebol nos quesitos físicos, táticos e técnicos. A concorrência é ainda mais difícil analisando os números de Pelé em Copas: são seis gols e um desempenho histórico no Mundial de 1970 – até ali, o mais jovem a vencer o título, a marcar no torneio e na final –, aos 17 anos. Lesionado na campanha de 1962, ainda faria mais quatro aos 29 anos, na Copa de 1970, um deles na final. Se eternizou ainda mais na história ao dar o passe na medida para Carlos Alberto Torres fechar o 4 a 1 sobre a Itália na decisão, um gol cinematográfico.
Assim como na comparação com Diego, colocar Messi frente a frente com Pelé levanta um problema geracional, quase anacrônico. Pelé atuou a maior parte da carreira no futebol brasileiro numa época de ouro nos anos 50 e 60, quando times do país faziam excursões à Europa e eram atrações. Messi, por outro lado, foi revelado e fez carreira num futebol europeu já estabelecido como o mais forte do mundo, no fim dos anos 2000.
Nesse meio, um isolamento crescente dos continentes, fruto de desenvolvimento em caminhos separados, tirou de jogadores sul-americanos a possibilidade de reconhecimento mundial pelos grandes prêmios individuais internacionais. Messi ganhou sete Bolas de Ouro (2009, 2010, 2011, 2012, 2015, 2019, 2021), um recorde da premiação que Diego e Pelé praticamente não tiveram a chance de disputar (ela só foi aberta a não-europeus em 1995, quando Maradona foi convidado a receber o prêmio pelos feitos ao jogo). Em 2015, a “France Football”, revista que organiza a premiação, promoveu uma reavaliação histórica e “concedeu” o mesmo número de sete Bolas de Ouro “retroativas” a Pelé (1958, 1959, 1960, 1961, 1963, 1965 e 1970), além de duas a Diego (1986 e 1980).
Ainda há a questão de documentação. Os gols e grandes lances de Messi estão compilados quase inteiramente em plataformas de vídeo, como o Youtube. Os de Maradona, entre arquivos e digital. De Pelé, mais nos arquivos. Por ora, é difícil bater qualquer martelo, mas a discussão entre os três promete crescer e ganhar mais forma com o distanciamento histórico nas próximas décadas. As informações são do jornal O Globo.