Domingo, 22 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 22 de fevereiro de 2023
Em um dia qualquer de 2019, na China, um micro-organismo até então desconhecido saltou de um animal ou tubo de ensaio para um corpo humano. Foi como se um meteoro tivesse atingido o planeta: no ano seguinte, as pessoas confinadas em suas casas viam saltar no noticiário números cada dia mais terríveis de hospitalizados e mortos, sobretudo entre idosos e pessoas com doenças crônicas.
A economia não ficou de fora da rota de destruição desse fenômeno, a pandemia de coronavírus. Adultos em idade de trabalho, sobretudo dentre os pobres, viram suas rendas e empregos serem dizimados. Até dezembro de 2021, houve 15 milhões de mortes excedentes no mundo, ao passo que milhões escaparam ilesos à covid mas caíram na extrema pobreza, que aumentou 11% em relação a 2019.
Sob esse cataclismo visível a todos, começava outra tragédia oculta e silenciosa: a da educação. O que aconteceu com as crianças e jovens? O impacto, nesse caso, não foi como de um meteoro, mas de uma pedrinha lançada em um lago. No início, atinge só um ponto minúsculo, mas à medida que as ondas se propagam em círculos concêntricos, afeta toda a superfície. Os efeitos são hoje quase imperceptíveis, porém ao longo dos anos podem ser catastróficos, agravados por uma tendência a ignorá-los.
É natural. O mundo jamais esquecerá. Entretanto, ao mesmo tempo em que o vírus cede à imunização há um esforço para deixar a pandemia no passado e “virar a página” para retomar a normalidade. Nem por isso os efeitos sobre as novas gerações deixarão de se propagar – e se não forem enfrentados, tendem a se multiplicar, como uma pequena onda que se avoluma até tsunami.
“A pandemia causou um colapso oculto, mas massivo, no capital humano dos jovens em momentos críticos do ciclo de vida”, adverte o Banco Mundial em relatório intitulado “Colapso e Recuperação”. Os estudantes de hoje podem perder até 10% de seus ganhos futuros por causa dos choques na educação provocados pela covid. Para as crianças em primeira infância, o déficit cognitivo e emocional pode se traduzir em uma queda de 25%.
No auge da pandemia, a perda de investimentos em saúde e educação para a primeira infância levou a quedas drásticas no desenvolvimento de habilidades cognitivas, linguísticas, socioemocionais e motoras, além de déficits nutricionais e vacinais. Para as crianças em idade escolar, o fechamento das escolas acarretou imensas perdas de aprendizagem e aumento nas taxas de evasão.
Dentre os jovens na faixa de 15 a 24 anos, aumentou o contingente dos que não trabalham nem estudam. Os que se iniciavam no mercado de trabalho perderam empregos ou oportunidades de emprego, e renda. Todos esses impactos foram maiores entre as camadas e países de baixa renda.
“Salários mais baixos, mais pobreza, mais desigualdade e menos crescimento são uma mistura explosiva”, alerta o mesmo relatório. “É imperativo agir agora para construir resiliência do capital humano dos jovens.”
Prioridades
As ações imediatas e emergenciais para as crianças na primeira infância incluem o foco na vacinação e suplementação nutricional, ampliação do acesso à educação pré-escolar e programas de assistência aos pais, especialmente por meio de transferência de renda às famílias vulneráveis.
Crianças nessa faixa precisam de mais tempo de instrução e tutoria para recuperar o tempo perdido. Os currículos também terão que ser adaptados a essas perdas e focar no ensino dos fundamentos de cada disciplina. Também será preciso lançar mão de estratégias especiais para minimizar os riscos de evasão, incluindo aliviar restrições financeiras que obstaculizam a frequência escolar. Para os jovens, será preciso investir em programas de formação profissional, intermediação de emprego e capacitação empreendedora.
“As pessoas com menos de 25 anos hoje, ou seja, as mais afetadas pela deterioração do capital humano, representarão mais de 90% da força de trabalho em idade ativa em 2050″, alertou Norbert Schady, um dos autores do estudo. “Reverter o impacto da pandemia sobre elas e investir em seu futuro deve ser a prioridade mais alta para os governos. Caso contrário, essas tropas representarão não apenas uma, mas várias gerações perdidas.”