Terça-feira, 24 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 28 de fevereiro de 2023
Uma semana após a constatação de que trabalhadores contratados por empresa terceirizada como mão-de-obra em serviços para vinícolas da Serra Gaúcha eram submetidos a condições análogas à escravidão, o incidente continua a repercutir de forma negativa. O capítulo mais recente é uma nota divulgada pelo Centro da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves (CIC-BG), associando ao programa Bolsa Família o crime flagrado na região.
No mesmo texto em que defende punição aos responsáveis pelos abusos e isenta de culpa as vinícolas (sob o argumento de que ignoravam o regime brutal imposto aos trabalhadores aliciados para tarefas relacionadas à safra de uva), a entidade formulou uma tese: a exploração se deve a um contexto de falta de mão-de-obra, por culpa de iniciativas assistenciais patrocinadas pelo governo. Isso porque a maioria das vítimas é procedente da Bahia, onde foram aliciadas.
“Há uma larga parcela da população com plenas condições produtivas e que, mesmo assim, encontra-se inativa, sobrevivendo através de um sistema assistencialista que nada tem de salutar para a sociedade”, diz um trecho da manifestação. O conteúdo foi mal recebido por diversos segmentos e, nas redes sociais, não faltaram críticas severas, inclusive por parte de consumidores prometendo boicote às marcas. Confira a íntegra da posição expressa pelo CIC:
“Na condição de entidade fomentadora e defensora do desenvolvimento sustentável, ético e responsável dos negócios e empreendimentos econômicos, o Centro da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves vem acompanhando com atenção o andamento das investigações acerca de denúncias de práticas análogas à escravidão no município. É necessário que as autoridades competentes cumpram seu papel fiscalizador e punitivo para com os responsáveis por tais práticas inaceitáveis.
Da mesma forma, é fundamental resguardar a idoneidade do setor vinícola, importantíssima força econômica de toda microrregião. É de entendimento comum que as vinícolas envolvidas no caso desconheciam as práticas da empresa prestadora do serviço sob investigação e jamais seriam coniventes com tal situação.
São, todas elas, sabidamente, empresas com fundamental participação na comunidade e reconhecidas pela preocupação com o bem-estar de seu colaboradores/cooperativados por oferecerem muito boas condições de trabalho, inclusive igualmente estendidas a seus funcionários terceirizados. A elas, o CIC-BG reforça seu apoio e coloca-se à disposição para contribuir com a busca por soluções de melhoria na contratação do trabalho temporário e terceirizado.
Situações como esta, infelizmente, estão também relacionadas a um problema que há muito tempo vem sendo enfatizado e trabalhado pelo CIC-BG e Poder Público local: a falta de mão-de-obra e a necessidade de investir em projetos e iniciativas que permitam minimizar este grande problema. Há uma larga parcela da população com plenas condições produtivas e que, mesmo assim, encontra-se inativa, sobrevivendo através de um sistema assistencialista que nada tem de salutar para a sociedade.
É tempo de trabalhar em projetos e iniciativas que permitam suprir de forma adequada a carência de mão de obra, oferecendo às empresas de toda microrregião condições de pleno desenvolvimento dentro de seus já conceituados modelos de trabalho ético, responsável e sustentável.
Suspensão pela Apex
Nesta terça-feira, a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) informou a suspensão da participação das vinícolas Aurora, Garibaldi e Salton de suas atividades e eventos. O motivo é que as três empresas da Serra Gaúcha recorriam à terceirizada investigada pela situação degradante dos trabalhaores.
O órgão é vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços e promove produtos brasileiros em iniciativas fora do País. “A ApexBrasil suspendeu a participação das três empresas em quaisquer iniciativas apoiadas pela agência, como feiras internacionais, missões comerciais e eventos promocionais, até que as investigações das autoridades competentes sejam concluídas”, informou.
As três suspensas são atendidas pela Apex no âmbito do do projeto “Wines of Brazil”, em parceria com a União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra). O mesmo acontece com outras 20 empresas.
“No dia 25 de fevereiro, a ApexBrasil cobrou esclarecimentos à Uvibra, com prazo de 48 horas para resposta, a respeito de medidas internas já adotadas pelas empresas, bem como ações que serão tomadas para mitigar os riscos de conformidade e integridade nas suas cadeias de fornecedores e prestadores de serviços”, destacou.
A agência afirmou ainda que solicitou à Uvibra um posicionamento quanto às condições de trabalho da produção de uva e vinho de todas as empresas que participam do Projeto Wines of Brazil. “A Agência repudia qualquer ato de violação aos direitos humanos e trabalhistas, conforme diretrizes e normas internas de integridade”, destacou por meio de nota.
(Marcello Campos)
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