Sábado, 08 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 18 de setembro de 2023
Com um discurso focado no resgate da agenda dos países em desenvolvimento, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltará a abrir a Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), nesta terça-feira (19), 14 anos depois de discursar na sede das Nações Unidas, em Nova York (EUA), pela última vez. Lula aproveitará o mote de que o Brasil está de volta ao cenário internacional para criticar o atual sistema de governança, que permite, na sua visão, que o lado desenvolvido do planeta afaste das grandes decisões o chamado Sul Global.
O retorno de Lula ao palco multilateral já se desenhava cheio antes mesmo da chegada do presidente à Nova York. O governo brasileiro recebeu mais de 50 pedidos de encontros bilaterais, um deles já confirmado com o presidente americano, Joe Biden. Existe, ainda, a expectativa por parte de setores da comunidade internacional, sobretudo do próprio governo americano e de países da União Europeia (UE), de um eventual encontro entre Lula e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, após vários desencontros nos últimos meses.
Para o governo brasileiro, não haverá palco melhor para Lula do que a Assembleia Geral para voltar a insistir na presença de outros países, como o Brasil, como membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU – desejo que existe desde a fundação do organismo, em meados da década de 1940. Um dos argumentos a serem usados por Lula é que, mais de um ano e meio após a invasão da Ucrânia pela Rússia, o órgão fracassou na busca de soluções para a paz.
Além disso, essa nova governança global defendida no discurso do presidente brasileiro seria ligada à ONU e teria o poder de forçar países a cumprir, por exemplo, metas de combate ao aquecimento global. Hoje, nenhum Estado ou organismo internacional pode forçar um país a cumprir ordens ou medidas. Uma tentativa ou interferência pode ser vista como violação à soberania nacional.
Lula trabalhará em seu discurso com outros pilares já anunciados por ele, ao assumir a presidência do G20, no último fim de semana, na Índia: uma ação global de combate à fome, a redução das desigualdades e o desenvolvimento econômico sustentável, baseado em aspectos não apenas econômicos, mas ambientais e sociais.
Assim como fez na Índia, quando citou o ciclone no Rio Grande do Sul como exemplo de fenômenos climáticos não esperados, Lula deve dizer que o Brasil tem legitimidade para pedir atenção e cooperação nesse tema e ainda cobrar dinheiro e comprometimento das nações desenvolvidas.
Autor de mais de 40 livros e ex-representante da Organização dos Estados Americanos (OEA) no Haiti e na Nicarágua, Ricardo Seitenfus explica que o Brasil é o primeiro a discursar na Assembleia Geral da ONU como uma compensação por ter ficado de fora na escolha dos membros permanentes e com direito a veto no Conselho de Segurança.
“É uma obsessão inútil tentar participar do Conselho de Segurança”, afirma Seitenfus.
Ele destaca que, entre os membros permanentes, os Estados Unidos são contra a ampliação, mas preferem se manter em silêncio. A China não aceita a ideia, por causa do Japão, que também é candidato. E a Rússia, apesar das declarações de apoio ao Brasil, foi um dos responsáveis pela não aceitação do país, quando era União Soviética, sob a alegação de que o Ocidente já tinha três representantes: EUA, Reino Unido e França.
O cientista político Guilherme Casarões, pesquisador sênior do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e professor da Fundação Getúlio Vargas, destaca que a guerra na Ucrânia é a primeira que acontece na Europa envolvendo uma grande potência desde 1945.
“O governo Lula já se ofereceu como mediador desse conflito e provavelmente insistirá nesse papel, talvez trazendo outras nações em desenvolvimento para a iniciativa, como Índia e África do Sul”, diz ele.
Interlocutores do governo afirmam que poderá ocorrer reunião bilateral entre Lula e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. O líder ucraniano já declarou que só admite negociar um plano de paz de sua autoria, e não um texto elaborado por outro país, como o Brasil.
Para Casarões, Lula resgatará a relevância da agenda de desenvolvimento, que se desdobra em reformas do sistema financeiro global e em políticas de combate à pobreza e à desigualdade. Ele compara o discurso de Lula com o de seu antecessor, Jair Bolsonaro.
“Todos esses pontos demarcam uma diferença enorme com relação às participações de Bolsonaro na Assembleia Geral das Nações Unidas. O ex-presidente desprezava o multilateralismo e apostava numa diplomacia bilateral e seletiva. Seus discursos foram defensivos, acusatórios e conspiratórios, rompendo com a longa tradição diplomática do país”, destaca o cientista político. As informações são do jornal O Globo.