Sábado, 28 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 4 de outubro de 2023
Não havia tubarões-brancos jovens rodeando as famosas praias do centro da Califórnia, nos Estados Unidos, mas à medida que as mudanças climáticas aceleram o aquecimento dos oceanos, as águas mais quentes atraem os animais para o norte — um movimento que pode ter consequências graves para o ecossistema local.
Os tubarões-brancos se tornaram temidos pelos banhistas depois do sucesso da franquia cinematográfica “Tubarão”, na década de 1970,mas quem corre mesmo risco com a presença destes predadores são as lontras.
“Descobrimos que, com o tempo, o número de mordidas em lontras-marinhas aumentou drasticamente nesta região. Isso gera um impacto real na população de lontras”, explica o ecologista marinho Salvador Jorgensen, da Universidade do Estado da Califórnia.
Em uma verdadeira demonstração de como os ecossistemas estão interligados, esta situação pode gerar consequências de longo prazo para todo o tipo de espécies nesta região rica em vida selvagem.
Águas quentes
Com um tamanho em torno dos 4,9 metros, os tubarões-brancos originalmente se alimentam de focas, leões-marinhos e golfinhos. Podendo viver mais de 70 anos, dão à luz a ninhadas de filhotes, que abandonam à própria sorte desde cedo.
Mas como são animais endotérmicos — de corpo quente, como os mamíferos — estes bebês são vulneráveis ao frio das profundezas do oceano, o que os faz passar um tempo em águas mais quentes nas regiões costeiras. Até cerca de uma década atrás, isso significava que espécies mais jovens de tubarões só eram encontradas em áreas no sul da Califórnia. Mas segundo Jorgensen, isso está mudando.
“Documentamos a aparição repentina de tubarões muito menores do que já se tinha visto por aqui. À medida que as temperaturas dos oceanos aumentaram devido a uma série de [fenômenos] El Niño e ondas de calor, muitas espécies têm migrado mais para o norte, para áreas historicamente mais frias”, disse ele, sobre a baía de Monterey, a centenas de quilômetros ao norte da área onde são tradicionalmente observados. Esta alteração de curso os coloca em contato com as lontras-marinhas, que rondam as ricas florestas de algas.
“Os tubarões menores estão deixando de comer peixes e lulas, para um ponto em que vão começar a comer mamíferos marinhos”, explicou o ecologista.
Efeito cascata
Jorgensen explica que, para um tubarão inexperiente, as lontras podem parecer um objetivo adequado, mas estes animais não possuem uma rica camada de gordura e acabam não sendo consumidos. No entanto, mesmo que sejam apenas mordidas, “muitas vezes essas interações são fatais para a lontra”, concluiu ele.
A consequência é um efeito cascata que afeta todo este ecossistema. As lontras se alimentam de ouriços-do-mar, uma espécie que, se não for controlada, transformará uma floresta de algas em um deserto árido, destruindo um habitat marinho vital, que oferece alimento e abrigo para uma variedade de invertebrados, peixes, mamíferos e aves.
Para Eric Mailander, cientista amador e capitão do barco que ajuda o ecologista a identificar os tubarões-brancos, a presença destas espécies jovens na baía de Monterey oferece a oportunidade de observar estes animais de perto. Jorgensen alerta, no entanto, que a presença destes animais enormes tão perto da costa é uma demonstração da rapidez com que o planeta está sendo alterado pela queima descontrolada de combustíveis fósseis.
“Sempre pensei que é uma forma muito tangível de as pessoas entenderem a mudança climática”, explicou, contando que os frequentadores destas praias começam a se acostumar com a aparição destes animais nadando a até seis metros de distância.
“Não se pode olhar para o oceano e pensar que a mudança climática não está acontecendo”, concluiu.