Sábado, 11 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 5 de novembro de 2023
“Você fica aqui, atrás do presidente”, ouviu a primeira-dama Rosângela da Silva de duas senhoras do cerimonial do Parlamento português, durante um evento em Lisboa, em abril. “Não, amor, eu não fico atrás do presidente. Sempre fico ao lado dele”, corrigiu Janja, de 57 anos, segurando firme nas mãos de Luiz Inácio Lula da Silva, enquanto acompanhava seus passos na cerimônia. Desde então, o gesto tem se repetido. Desembarcando do avião presidencial ou em solenidades, Janja quer estar ao lado do presidente, nunca atrás.
Nem sempre, porém, tem seu desejo atendido. Em entrevista ao jornal O Globo, a primeira-dama falou sobre a vontade de ter um gabinete formal no Palácio do Planalto, onde o presidente despacha. Esse plano foi descartado por conselheiros de Lula que viram risco de atrair a fúria da oposição. Janja contesta a decisão: “A primeira-dama dos Estados Unidos tem um gabinete oficial. Ela tem agenda, tem protagonismo e ninguém questiona isso. Por que o Brasil questiona? Por que aqui tudo parece mais difícil?”.
Na conversa, a socióloga paranaense também falou sobre os desafios de ampliar a presença feminina na política e o incômodo ao ver reuniões em Brasília dominadas por homens.
Entusiasta do design nacional, Janja revelou que está organizando um evento de moda e empreendedorismo com a modelo britânica Naomi Campbell. Da posse de Lula à coroação do rei Charles III, as peças usadas pela primeira-dama são pensadas.
1) Antes de o presidente Lula assumir, você dizia querer ressignificar o papel de primeira-dama. Conseguiu fazer isso?
O papel de primeira-dama sempre foi muito quadrado, colocado numa caixa em que a mulher do presidente recebe pessoas e faz caridade. Eu sou socióloga e nunca fui de gabinete. Ia para o campo. Achava que podia trazer essa experiência para cá. Querendo ou não, quase tudo que falo ganha amplitude. Por que não fazer isso por pautas que são relevantes? Mais mulheres na política, violência contra a mulher, exploração sexual de crianças e adolescentes… Isso é mais importante do que ficar só fazendo jantar ou chá das cinco. Por que a primeira-dama não pode também estar contribuindo com o desenvolvimento do Brasil?.
2) Como tem aproveitado a posição de primeira-dama para ampliar a presença de mulheres na política?
Na campanha, falava com a Gleisi (Hoffmann, presidente do PT): “Está difícil, precisamos de mais mulheres”. Já nos recusamos a sair na foto como cota. Na transição, falamos de mais mulheres nos ministérios. Isso de alguma forma foi atendido. Passamos (ela e o presidente) os fins de semana a sós e conversamos muito. Às vezes, a gente tem umas discussões um pouco mais assim… fortes.
3) O que diria a quem afirma que, por não ter sido eleita, não deveria se meter em política?
Quem faz essa crítica não enxerga o mundo em que a gente vive hoje. Vou continuar ao lado do presidente, porque acho que é esse o papel que tenho que desempenhar. Falam muito de eu não ter um gabinete, mas precisamos recolocar essa questão. Nos EUA, a primeira-dama tem. Tem também agenda, protagonismo, e ninguém questiona. Por que se questiona no Brasil? Vou continuar fazendo o que acho correto.
4) Como é ser a única voz feminina no entorno do presidente?
Há pouquíssimas mulheres mesmo, mas, veja bem, não participo das reuniões do presidente Lula. O povo acha que eu fico lá sentada. Não faço isso. Todo dia, ele tem uma reunião com os ministros do Palácio do Planalto, mas não estou nesses espaços de decisão. Minhas conversas com o presidente são dentro de casa, no nosso dia a dia, no fim de semana, quando a gente toma uma cerveja. Quando estou incomodada, eu vou lá e questiono. Não é porque eu sou mulher do presidente que vou falar só de marca de batom.
5) Qual mensagem pretende passar com seus looks?
Uso as roupas mais com intuito de as pessoas conhecerem a moda brasileira. As pessoas comentam meus looks, umas bem, outras mal. Na coroação do Rei Charles III, disseram que eu estava vestida de abóbora. Aquele vestido era da cor da campanha contra a exploração sexual infantil. É óbvio que eu quero passar uma mensagem.
6) Você tem preferência por peças da Helô Rocha, da Rafaella Caniello e do Airon Martin. Quem te ajuda a escolher os looks?
Quem escolhe sou eu. Mas, às vezes, os estilistas sugerem algo que não vi ainda da coleção. Comecei com a Helô, que já seguia nas redes sociais. Por meio dela, conheci a Rafaella (Caniello, estilista à frente da marca Neriage). Tem também a Heloisa Strobel (fundadora da Reptillia), que trabalha com transformação ecológica dos tecidos. De Brasília, estou usando mais Letícia Gonzaga, que desenvolve roupas mais formais. Faço questão de usar sempre uma roupa diferente quando vou aos eventos internacionais, porque a gente precisa falar mais sobre moda brasileira e divulgar nossos estilistas. Vou te contar em primeira mão: estamos construindo um projeto com a Naomi Campbell.