Terça-feira, 26 de novembro de 2024
Por Márcio Coimbra | 15 de fevereiro de 2024
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Vivemos em uma jovem democracia, estabelecida tal como conhecemos em 1985, com uma Constituição promulgada em 1988 e a primeira eleição presidencial pós-regime militar ocorrendo em 1989. Até lá nenhum pleito presidencial brasileiro havia contado com a participação de mais de 20% da população e desde então vivemos o mais longo período de estabilidade democrática de nossa história. Antes disso, somente dois líderes eleitos pelo voto popular para a Presidência completaram o mandato: Eurico Gaspar Dutra e Juscelino Kubitschek.
Porém, a democracia não vive um período de grande popularidade ao redor do mundo, algo que se debruça também sobre o Brasil. Atualmente apenas 62% dos brasileiros têm opinião positiva sobre a democracia liberal, segundo pesquisa AtlasIntel. A sondagem também aponta 20% de opinião positiva sobre o comunismo, 13% sobre ditadura militar e 4% sobre fascismo – todos regimes de exceção. Enquanto isso, o Latinobarómetro indica dados mais alarmantes, ou seja, que existe apenas 46% de apoio à democracia em nosso país.
O Brasil já passou por nove golpes de Estado desde nossa independência. Empilham-se outros fracassados, onde insere-se o mais recente descoberto pela Polícia Federal. Considerando que estamos na América Latina, um território propício para movimentos golpistas, a tentativa não soa como novidade. Entre 1907 e 1966 a região passou por 20 golpes de Estado. Da segunda metade do século XX até hoje foram 34. Nosso 31 de março de 1964 faz parte desta estatística.
Fato é que o desgaste da democracia ao redor do mundo chegou ao Brasil e nossas instituições indicam que carecem de confiança da população neste período delicado. Vejam estes dados. Apenas 11% dos brasileiros avaliam positivamente o trabalho do Senado e 8% da Câmara dos Deputados. A aprovação do STF caiu para 17% no final de 2023 e diante da falta de confiança no trabalho da imprensa, 41% dos brasileiros evitam o consumo de notícias e de conteúdo jornalístico – número que supera a média mundial, de 36%. Estamos diante de um barril de pólvora.
Estes dados mostram que a mais recente tentativa de golpe em nosso país deixou de se concretizar por incompetência dos atores envolvidos no enredo, porém, é importante lembrar, poderia encontrar respaldo popular diante da enorme falta de confiança da população nas instituições. Isto evidencia uma democracia fraca, altamente manipulável e capaz de pender diante de arroubos autoritários tanto para a direita, quanto para a esquerda. Em resumo, um sistema à espera de um oportunista.
Vivemos um período de enorme desgaste da democracia como sistema de organização política e econômica com uma população cansada de esperar por melhorias prometidas pela abertura. Neste vácuo, ressurge a ilusão de retorno de nossos militares ao poder, os mesmos que entregaram um país destruído depois de duas décadas no comando do país. De um lado, o brasileiro precisa entender que a democracia é uma construção que precisa andar de mãos dadas com a economia de mercado, império da lei, responsabilidade e combate à corrupção. De outro, se nossa classe política e econômica, não entender seu papel, em breve pode se tornar vítima da própria ambição e tornar nosso país uma republiqueta refém de um populista.
Márcio Coimbra é Presidente do Instituto Monitor da Democracia e Conselheiro da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig). Cientista Político, mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-Diretor da Apex-Brasil e do Senado Federal
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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