Domingo, 12 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 17 de julho de 2024
No dia 28 de agosto de 2020, a Receita Federal demandou ao Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) a abertura de uma investigação interna sigilosa para identificar auditores que teriam vasculhado os dados fiscais do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
O pedido ocorreu três dias após o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) se reunir com advogadas do filho e sugerir uma conversa com o então chefe do Fisco para avaliar o inquérito que apurou suspeita de “rachadinha” no gabinete de Flávio quanto ele era deputado estadual.
Além disso, José Tostes Neto, então secretário especial da Receita, recebeu a defesa de Flávio três vezes depois da reunião. Um dos encontros teve a presença do próprio senador. O desfecho da apuração interna é mantido sob sigilo.
A análise de um possível vazamento de dados era uma estratégia da defesa de Flávio, que pretendia descobrir se auditores teriam repassado ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) dados fiscais que deram origem ao inquérito das “rachadinhas”, que envolvia o senador e o ex-assessor Fabrício Queiroz. O relatório do Coaf foi revelado pelo Estadão em 2018. Na época das supostas ilegalidades, Flávio ocupava vaga na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj).
Um dia após a reunião em que Bolsonaro sugeriu uma “conversa” com o chefe da Receita para avaliação do caso envolvendo o filho mais velho, as advogadas Juliana Bierrenbach e Luciana Pires, defensoras do senador, se encontraram com José Tostes Neto.
A reunião com a sugestão de Bolsonaro ocorreu em 25 de agosto de 2020 e não estava na agenda oficial do então presidente. A transcrição do áudio encontrado pela Polícia Federal revela que, durante o encontro, Bolsonaro afirmou que, diante do inquérito contra Flávio, poderia ser “o caso de conversar com o chefe da Receita”. Também participaram da reunião o então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, e o então diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem. As advogadas estavam na reunião.
Divulgação
O sigilo da gravação foi suspenso anteontem, pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. Após a divulgação do material, Fabio Wajngarten, ex-assessor e advogado de Bolsonaro, afirmou que os áudios “só reforçam o quanto o presidente ama o Brasil e o seu povo”. Já Flávio disse que não foram tratadas ilegalidades durante a reunião.
A advogada Juliana Bierrenbach disse que uma reunião do gênero era “necessária” diante da situação do processo envolvendo Flávio, mas que não tinha conhecimento de que o então presidente estaria na audiência.
“Não tinha a mais remota ideia, foi um susto para mim quando entrei na sala e encontrei o presidente e o Ramagem. Eu achei que fosse ter uma reunião com o general Heleno e com algum assessor dele, foi o que me foi dito”, disse Juliana em entrevista ao portal Metrópoles.
A informação sobre o encontro com o secretário consta em um relatório de agendas do diretor da Receita de junho de 2021, obtidas em resposta a um requerimento de informação da deputada Natália Bonavides (PT-RN). Segundo o registro enviado à Câmara, Juliana e Luciana estiveram com Tostes das 18h às 19h do dia 26 de agosto de 2020, para uma “visita de cortesia”.
Palácio
Além disso, horas antes, Luciana esteve no Palácio do Planalto. É o que aponta um registro solicitado ao GSI via Lei de Acesso à Informação (LAI). De acordo com o documento, que não especifica quem Luciana encontrou no local, a advogada entrou no prédio às 11h05 e permaneceu lá até as 11h26. Apesar dos registros de entrada e de saída, o nome de Luciana não consta em nenhum compromisso da agenda pública da Presidência.
O áudio da reunião de 25 de agosto foi gravado por Ramagem, hoje deputado federal e pré-candidato do PL à prefeitura do Rio. A peça foi periciada pela PF e consta nos autos da investigação que embasou a Operação Última Milha, que apura a existência de um sistema de informações “paralelo”, com fins políticos, dentro da estrutura da Abin durante o governo Bolsonaro.
Além de Bolsonaro, de Ramagem e das advogadas de Flávio, também estava presente no encontro de 25 de agosto o general Augusto Heleno, então chefe do GSI. É a ele que Juliana se dirige ao expor que o Gabinete de Segurança Institucional deveria solicitar uma “averiguação” das investigações da Receita Federal contra Flávio Bolsonaro.
“É, general (Heleno). Especialmente pro GSI. Por quê? É um pedido de averiguação. Dos sistemas de inteligência que atendem à Receita Federal, mas o pedido precisa, a averiguação precisa, feita, feito pelo Serpro”, afirmou a advogada durante a reunião. O Serpro é o serviço que realiza o processamento de dados ao governo federal.