Quarta-feira, 25 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 20 de julho de 2024
Poucas vezes uma disputa presidencial, em qualquer país democrático, teve uma semana com candidatos em momentos tão díspares como a vista nos Estados Unidos. De um lado, um ex-presidente Donald Trump sobrevivente de um atentado e louvado em uma convenção feita para consolidar seu domínio do Partido Republicano. De outro, um presidente Joe Biden enfraquecido, e cuja desistência da campanha é uma hipótese cada vez mais aceita dentro do Partido Democrata, apesar de sua relutância.
Biden passou a enfrentar intensa pressão desde o debate com Trump, no final de junho, quando seu desempenho assombrou aliados, rivais e eleitores. E, até a tarde de sexta-feira, 35 parlamentares democratas — quatro senadores e 31 deputados — pediram oficialmente que ele desista. Na semana passada, em artigo no New York Times, o ator e ativista George Clooney disse que, com Biden, os democratas serão derrotados.
Neste contexto, a semana da Convenção Nacional Republicana, que coroou Trump como candidato e dominou as manchetes e programas de debates na TV, inicialmente parecia uma chance de ouro para Biden ajustar suas estratégias, permitir que o rival se expusesse e, especialmente, acalmar os ânimos entre os democratas.
Mas eis que vieram, no sábado passado, o comício de Trump na Pensilvânia e uma bala de fuzil que passou a centímetros da cabeça do republicano. O que seria uma convenção para unir o Partido Republicano em torno do ex-presidente se tornou uma cerimônia de exaltação quase religiosa ao hoje favorito para vencer a eleição em novembro.
“Se vocês não acreditavam em milagres antes de sábado, melhor começar agora. No sábado, o diabo foi à Pensilvânia segurando um fuzil. Mas um leão americano se levantou e rugiu”, disse o senador Tim Scott, da Carolina do Norte, na segunda-feira.
O próprio Trump, que antes de chegar ao poder não era exatamente conhecido por suas credenciais religiosas, abraçou a tese de que foi salvo por um milagre.
“Havia sangue por toda parte, mas de certa forma eu me sentia muito seguro, porque tinha Deus ao meu lado. Eu não deveria estar aqui na noite de hoje. E digo a vocês: estou aqui nesta arena apenas pela graça de Deus”, disse o ex-presidente na quinta-feira, quando aceitou a nova indicação à Presidência, a terceira consecutiva.
Nada a comemorar
Enquanto Trump consolidava uma liderança quase messiânica do Partido Republicano, cada vez mais moldado à sua imagem e semelhança, e indicava um vice, J.D. Vance, um “ex-Trump-cético” de 39 anos que parece destinado a sucedê-lo, os dias de Biden não trouxeram qualquer razão para comemorar.
A começar pelas gafes: na semana anterior, em entrevista coletiva após reunião de cúpula da Otan, chamou o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, que estava ao seu lado, de Vladimir Putin, líder russo que ordenou a brutal invasão contra o território ucraniano em 2022. Na quinta-feira, em entrevista à Black Entertainment Television, pareceu esquecer o nome do secretário de Defesa, Lloyd Austin, e se referiu a ele como “o negro”.
O presidente também fez um mea culpa, durante entrevista à rede NBC, por ter dito, na véspera do atentado contra Trump, que era necessário que o rival fosse posto “no alvo”, durante um discurso de campanha — um comentário que, diante do momento de comoção nacional e internacional, envelheceu extremamente mal.
Para “coroar” uma semana a se esquecer, Biden, cuja saúde já era questionada mesmo antes do fatídico debate com Trump, foi diagnosticado com Covid-19, no que alguns viram como um sinal (talvez divino) para considerar a desistência: há duas semanas, em entrevista à rede ABC, Biden disse que só a intervenção de “Deus Todo Poderoso” o faria sair da briga pela reeleição.
Pressão democrata
Segundo a imprensa americana, citando integrantes do Partido Democrata, Biden está mais receptivo à ideia de ceder o lugar e poderia anunciar a desistência já no domingo. Mas, ao contrário do que se especula, ele não endossaria sua vice, Kamala Harris, hoje apontada como favorita para liderar a chapa democrata “pós-Biden”. A definição pode acontecer antes da Convenção Democrata, daqui a um mês.
Neste contexto, integrantes da campanha do presidente dizem que ele e seus assessores estão furiosos com a ofensiva, que teria o apoio velado do ex-presidente Barack Obama e da ex-presidente da Câmara Nancy Pelosi.