Domingo, 09 de março de 2025
Por Redação O Sul | 3 de agosto de 2024
O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional a emenda constitucional 123/2022, chamada de “PEC das bondades”, aprovada pelo Congresso Nacional durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro. A corrente vencedora entendeu que a abertura de gastos extraordinários pelo poder público e a distribuição de benefícios sociais em ano eleitoral teve o potencial de interferir na igualdade dos candidatos nas eleições e configurou “constitucionalismo abusivo”. No entanto, os ministros ressaltaram que os valores repassados na época aos cidadãos não terão que ser devolvidos.
A alteração constitucional feita durante a gestão Bolsonaro estabeleceu estado de emergência para viabilizar gastos em ano eleitoral e destinou R$ 41,25 bilhões até o fim de 2022 para benefícios sociais como a ampliação do Auxílio Brasil e do vale-gás, além da criação de auxílios a taxistas e caminhoneiros.
Na época, a oposição criticou a medida, classificada como eleitoreira. O então ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a batizar a primeira versão da proposta de PEC Kamikaze. A emenda também permitiu a alíquota zero para a gasolina até 31 de dezembro de 2022. Na época, a justificativa da PEC foi o aumento dos combustíveis no mundo ocasionado pela guerra entre Ucrânia e Rússia.
Embora os benefícios sociais previstos na emenda tenham durado só até dezembro de 2022, os ministros entenderam que o processo deveria ser julgado como uma “dimensão profilática” – conforme palavras do ministro Flávio Dino. Ou seja, para evitar que outros mandatários articulem leis que beneficiem os seus governos em ano eleitoral.
O relator, ministro André Mendonça, votou pela perda de objeto da ação. Isto é, como os benefícios já foram pagos e a emenda não teria mais efeitos nos dias atuais, o Supremo não teria que discutir o assunto. Porém, Mendonça perdeu.
Prevaleceu a corrente divergente aberta pelo decano Gilmar Mendes no sentido de que era preciso julgar a matéria para passar o recado de que os mandatários de cargos eletivos não podem desequilibrar o pleito eleitoral aproveitando-se da condição de estar no poder.
“É de extrema importância um pronunciamento desta Corte sobre essa matéria sob pena de evitar situações que venham a surgir no futuro em desacordo com a anterioridade eleitoral e igualdade eleitoral – que reconhecemos como base do sistema da igualdade de chances”, afirmou Mendes. “Vários dos benefícios valiam até 31 de dezembro de 2022 em explícita ameaça aos eleitores”, acrescentou.
O ministro Alexandre de Moraes mudou o voto proferido no julgamento em plenário virtual, em dezembro de 2022, e acompanhou Gilmar Mendes. “Ninguém acredita que esse pacote de bondades não teve impacto eleitoral”, afirmou. Antes, Moraes havia acompanhado o voto de Mendonça.
Além de Moraes, acompanharam Gilmar Mendes os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Dias Toffoli e Flávio Dino. Este último chegou a propor que o Supremo comunicasse a decisão do STF à Procuradoria-Geral da República (PGR), ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para a responsabilização cabível, mas a ideia não teve adesão dos demais colegas.
Em seu voto, Mendonça afirmou que não viu inconstitucionalidade da tramitação da PEC. Além disso, lembrou que a Constituição pode ser emendada. O ministro também afirmou que o Congresso agiu diante de uma situação de emergência e lembrou que o mesmo poderia ter sido feito no caso da tragédia do Rio Grande do Sul.
Quanto à emenda criar distorções nas eleições de 2022, Mendonça argumentou que o Novo não conseguiu demonstrar violação direta à regra da anualidade eleitoral, pois a EC 123/2022 não alterou a legislação eleitoral a menos de um ano das eleições.
O ministro Nunes Marques entendeu que não havia perda de objeto, mas declarou a ação improcedente, inaugurando uma terceira via. Já o ministro Cristiano Zanin se declarou impedido porque foi advogado do PT durante as eleições.