Sábado, 21 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 10 de agosto de 2024
O “desaparecimento” de 12 milhões de brasileiros entre a projeção realizada pelo IBGE em 2018 e o Censo realizado em 2022 pode não ser apenas um problema relacionado a dificuldades na montagem e execução da pesquisa ou queda da taxa de natalidade. Para especialistas, a migração para o exterior pode ter atingido entre 2 milhões até 3 milhões de pessoas no período, se tornando fator importante para explicar a contagem abaixo da esperada.
O montante pode também representar a maior debandada de brasileiros do País entre Censos, superando com folga a década de 1980, marcada pela crise econômica e pela emigração. Uma pesquisa organizada pelo próprio IBGE estimou em aproximadamente 1,5 milhão o saldo migratório naquele período.
Ex-diretor do IBGE, o economista Paulo Tafner estima que cerca de 3 milhões de brasileiros podem ter deixado o País na última década. É uma tese polêmica, ele reconhece, mas encaixa com o fato de que a maior diferença entre a projeção de 2018 e o encontrado pelo Censo ficou concentrada em grupos etários até 40 anos, faixa tradicionalmente mais propensa a migrar.
“Acredito que o Brasil está perdendo população porque está exportando mão de obra. O país se tornou um lugar inóspito para os jovens adultos e seus filhos”, diz. “A questão é saber quem está migrando. Há razões para acreditar que o perfil é muito diferente daquele que existiu na década de 1980, quando jovens de baixa qualificação começaram a ir para os Estados Unidos para ocupar posições de baixa qualificação. Acredito que não seja mais este o caso. Estamos perdendo mão de obra qualificada, jovens adultos bem preparados que estão deixando o Brasil com sua família.”
Divulgado pelo IBGE em 2023, o Censo mostrou que o Brasil tinha 203,08 milhões de habitantes em 2022. São 11,74 milhões a menos que os 214,82 milhões projetados pelo próprio instituto em 2018. Entre faixas etárias, aquelas que correspondem à população até 39 anos tiveram 10,25 milhões a menos do que estimava a projeção.
As incongruências entre a pesquisa de 2022 e a projeção de 2018 trouxeram novamente à luz a miríade de problemas encontrados pelo instituto para a condução do Censo: corte de verba, falta de pessoal, adiamento por causa da pandemia, atraso no pagamento a recenseadores, fake news e crescimento dos casos de moradores que se recusavam a receber pesquisadores em suas casas, entre outros. Há uma elevada suspeita de subenumeração dentro da pesquisa, ou pessoas que deixaram de ser contadas. Tafner estima que ela pode ser de 6 milhões a 7 milhões.
Partindo dos números de 2010 e utilizando os registros de nascimentos, óbitos e de entrada e saída de brasileiros e imigrantes, Tadeu Oliveira, ex-demógrafo do IBGE, chegou a aproximadamente 211 milhões de pessoas em 2022. “Nesse exercício, a parte que ‘sumiu” em relação à pesquisa de 2022 pode ser dividida em aproximadamente 2,7 milhões para migração. Outros 5,3 milhões seriam de subenumeração”, diz o atual coordenador Estatístico do Observatório de Migrações Internacionais (OBMigra), ligado aos ministérios da Justiça e Segurança Pública e do Trabalho.
Segundo o Itamaraty, 5 milhões de brasileiros moravam no exterior em 2023, contra 3,1 milhões em 2010. Este número, no entanto, pode ser muito maior, se contabilizados os ilegais e os em situação indefinida, apontam pesquisadores.
Apenas o Sistema de Tráfego Internacional (STI), da Polícia Federal, mostra que 3,9 milhões deixaram o País e teoricamente não voltaram entre 2010 e 2023. Este movimento parece estar se intensificando: a média anual de pessoas que não voltam passou de 287,8 mil entre 2010 e 2019 para 453,6 mil entre 2021 e 2023. Durante todo esse período, apenas em 2020, no ano da pandemia, mais brasileiros voltaram ao país que saíram (saldo de 334 mil).
Houve períodos em que essa situação se amenizou. Nos últimos anos da década de 2000 e primeiros da década de 2010, houve algum refluxo, explicado pelo fato de que o país foi um dos países que saíram mais rápido da crise financeira de 2008. “Essa situação voltou a acelerar depois da crise de 2016. Com certeza esse período teve o saldo mais negativo que o de décadas anteriores. Foi um período de crise, em que o PIB per capita diminuiu”, afirma.
Pesquisa do instituto RealTime Big Data revelou que 67% dos brasileiros de 16 a 35 anos sairiam do País, se pudessem. Dos entrevistados, 18% também se disseram decididos a buscar oportunidade de deixar o país.