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Política Lula, o Supremo e o Ministério Público tentam driblar o Congresso para fechar cerco sobre big techs

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Google é alvo da ações na Justiça americana e Apple também enfrentarão governo nos tribunais. (Foto: Reprodução)

Após a regulamentação das plataformas digitais ser enterrada no Congresso em maio de 2023, outros atores vêm tentando contornar a omissão do Legislativo para impor algum tipo de responsabilização às empresas detentoras de redes sociais. O governo federal, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Ministério Público Federal (MPF) já deram passos nessa direção, cada um com seus instrumentos.

O tema ganhou holofotes no começo do governo Lula depois de duas campanhas eleitorais, em 2018 e 2022, pautadas pela grande circulação de ataques virulentos e desinformação. Mesmo com apoio do presidente da República e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a pressão das chamadas “big techs” como Google (dona do YouTube) e Meta (WhatsApp, Facebook e Instagram), prevaleceu. O projeto conhecido como PL das Fake News foi enterrado, e hoje o entorno de Lula não vê clima para voltar a pautar o tema.

Atores incumbidos de fiscalizar e acompanhar assuntos na órbita das plataformas digitais, no entanto, têm se movimentado. Na semana passada, a Secretaria Nacional do Consumidor, comandada pelo petista Wadih Damous, publicou uma nota técnica exigindo das plataformas o mesmo nível de transparência em relação a dados e publicidade que elas apresentam na Europa.

A disparidade no tratamento de usuários, principalmente em relação aos europeus, é o cerne das críticas de especialistas e considerada um calcanhar de Aquiles na atuação das empresas – e que tem lhes rendido derrotas internacionais nos últimos anos. Mas, sem força normativa, o documento foi visto como um movimento solitário de Damous contra as plataformas e não deve gerar efeitos concretos nas empresas de tecnologia. Autoridades consultadas pelo Estadão definem a nota como “abstrata”, e enxergam nela pontos que deveriam ser tratados via projeto de lei e um problema de legitimidade.

A leitura é que se trata de uma tentativa de fazer pressão e contornar a obstrução do PL das Fake News no Congresso Nacional. A iniciativa não foi alinhada com o restante do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), a que a pasta está subordinada. Parlamentares envolvidos com o tema também dizem não estarem a par dessa decisão.

Uma das críticas recai ao fato de a Senacon, que tem entre suas atribuições garantir a proteção e exercício dos direitos dos consumidores, tentar responsabilizar as big techs por via administrativa. Aberto o precedente, o ministério sob um eventual governo de oposição ganharia poderes para desfazer a medida e tomar decisões no sentido contrário, favorecendo as empresas em vez disso.

Seguindo na linha de driblar a omissão legislativa, o Supremo pode julgar uma ação sobre o Marco Civil da Internet que questiona o artigo 19 da lei. O trecho em questão isenta as plataformas digitais de responsabilidade por danos causados por conteúdo de terceiros e tem sido usado pelas big techs como justificativa para não remover postagens nocivas e ilegais. Atualmente, as empresas são passíveis de multa e indenizações apenas quando descumprem decisões judiciais sobre o assunto – algo que o PL das Fake News prometia mudar.

A regulamentação de obrigações para as plataformas via Judiciário também é vista como problemática por especialistas e autoridades que acompanhavam o tema, para quem a definição dessas regras deveria passar pelo Legislativo.

Raquel Saraiva, fundadora e presidente do Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife (IP.rec), diz que a nota técnica é uma “medida juridicamente frágil e potencialmente ilegal”, que pode suscitar questionamentos no Judiciário por extrapolar o limite de regulação pela Senacon. E defende que o enquadramento das plataformas digitais em normas claras seja feito via Congresso.

“Existe um movimento de tentar a regulação por outros meios que não o Legislativo. Todos concordamos que as plataformas precisam ser reguladas de forma apropriada, que devem ter obrigações específicas a serem cumpridas, mas essa regulação deve ser feita pelo Congresso”, diz ela.

Depois de uma década e meia de um processo de popularização a nível global, as gigantes do Vale do Silício começaram a enfrentar questionamentos ao redor do mundo. Desde então, autoridades vêm tentando impor limites à forma com que atuam no mercado e como seus serviços são oferecidos.

No mês passado, em uma ação sem precedentes na história da privacidade de dados no Brasil, como mostrou o Estadão, o MPF pediu a condenação do WhatsApp em R$ 1,7 bilhão por violação de direitos dos usuários no País, cerca de 150 milhões de pessoas.

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