Terça-feira, 24 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 13 de setembro de 2024
O jogo oferecido pelas bets tem similaridade com videogames, pois precisam ter a medida certa de dificuldade para que o jogador pense que pode ganhar.
Foto: ReproduçãoO avanço dos jogos online no País e o aumento do número de adeptos às bets, depois da sua legalização em 2018 pelo governo de Michel Temer, preocupa o grupo de Jogadores Anônimos (JA), entidade voltada para a recuperação de viciados. “A bet é o novo crack, é uma pandemia. A tendência dos últimos dois anos e para os próximos dois anos é que isso cresça muito”, disse um membro do JA, sob a condição de anonimato, em uma reunião realizada na quinta-feira (5). O jornal Estado de S.Paulo acompanhou o encontro.
O grupo se define como uma “irmandade cujos membros compartilham suas experiências, energia e esperança para parar de jogar, manter-se abstinente e ajudar outros jogadores compulsivos a fazerem o mesmo”. Embora não colete dados ou estatísticas formais, um membro do JA relata um aumento significativo nos casos e afirma que o impacto das apostas afeta homens e mulheres de forma semelhante, independentemente da classe social.
O membro relata que há casos em que carros, casas, economias de anos são perdidas nas bets e outros jogos de azar. As dívidas dos viciados muitas vezes chegam a R$ 2 milhões. “As histórias que mais me doem são as de pessoas que saem de casa com o dinheiro para comprar o almoço para a família e deixa tudo no caça-níquel”, conta.
Na visão do neurocientista Álvaro Machado Dias, professor doutor da Unifesp e sócio do Instituto Locomotiva, o tipo de jogo oferecido pelas bets tem similaridade com videogames, pois precisam ter a medida certa de dificuldade para que o jogador pense que pode ganhar. “O mesmo desenho comportamental, tudo igual. É como também se vende fichas de fliperama. A pessoa sente que na próxima ele vai bater a máquina. Na próxima, vai virar o campeão”, diz.
Mas, segundo o Instituto Brasileiro Jogo Legal (IJL) – uma ONG que trabalha pela legalização e criação de um marco regulatório para essas atividades –, é “fácil culpar as bets”. “Pesquisa da OMS (Organização Mundial da Saúde) comprova que 97% dos jogadores têm uma relação saudável com as apostas. No Reino Unido, onde as bets são mais comuns, só 1% dos apostadores têm problemas graves e precisam ficar abstêmio por meio de mandatos de auto-exclusão, como previsto nas normativas do Ministério da Fazenda”, conta Magno José, presidente do IJL.
A OMS estima que até 5,8% da população pode preencher os critérios para o diagnóstico de ludopatia, a compulsão pelo jogo, e a porcentagem de pessoas impactadas pela prática é, pelo menos, três vezes maior.
O instituto afirma que os problemas dos jogadores compulsivos só serão resolvidos com a regulação das bets, que entra em vigor em 2025. “O problema foi a falta de regulação durante longo período. O governo Bolsonaro não regulou porque o jogo é uma pauta negativa para os conservadores. A consequência da falta de proteção aos apostadores que observamos hoje é por causa desses anos em que o setor esteve desregulado”, explica José.
No Jogadores Anônimos, a principal medida para superar o vício é tirar o controle financeiro da pessoa. O Pix, o meio eletrônico de pagamento, é a principal ferramenta para os aplicativos de aposta, por causa da rapidez da operação. Os viciados em jogo, por vezes, colocam sua vida em risco e afetam a vida dos familiares. Segundo o JA, o objetivo dos tratamentos deve sempre ser trazer de volta a serenidade para a pessoa.