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Colunistas Lembranças que ficaram (53): “Velho cusco do rabo enrodilhado”

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Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

Dias atrás, lendo o jornal, li que nosso Governador Eduardo Leite, pelotense da gema, sugeria uma terceira via política como opção a polarização centrada na dupla Lula/Bolsonaro, para a eleição Presidencial de 2026 e que ele estaria a disposição para a eventual indicação de seu nome como a alternativa viável. Eduardo Leite é um jovem culto, educado e já possuidor de uma considerável bagagem e experiência política, o que nos permite entender como normal sua aparente ambição em aspirar o mais alto cargo administrativo do País. Nada de errado nem de anormal, nisso.

Mas o pensamento da gente corre e, queira ou não, quem tem mais de 85 anos, já viu e ouviu centenas de candidatos a cargos eletivos e participou de muitas eleições. Fez ou não fez campanhas para este ou aquele candidato ou, simplesmente, como cidadão viu e ouviu os acontecimentos pré e pós eleições. Esse é meu caso.

Nos anos finais da década de 50 e nos iniciais da década de 60, por influência e insistência de meu pai, ferrenho participante e líder político “dos brabos,” em âmbito municipal, acabei envolvido em algumas campanhas. Em 58 para Governador e Senador, em 60 para Presidente da República e em 62 novamente para Governador – sem contar as campanhas municipais havidas nesse interregno. Era eleição que não acabava – uma atrás da outra. Quem viveu nessa época, lembra. Era “um Deus nos acuda”. Foi então que lembrei da campanha para Governador, de 1962, quando eram candidatos três grandes e nobres homens, de imenso valor ético, moral e integridade política, respectivamente, o Engº Ildo Meneghetti, o Banqueiro Egídio Michaelsen, e o Economista Fernando Ferrari, qualquer um deles altamente qualificado para governar o Estado. Meu pai apoiava o Meneghetti e “me arrastava” junto nas andanças em campanha pela região Noroeste do RS, até que, certo dia, comparecemos num grande almoço, não lembro bem se em Santo Cristo, Cândido Godoy ou Cerro Largo, promovido pelas lideranças locais da base aliada de apoio político ao candidato Ildo Meneghetti, então composta pelo PSD, PL, UDN e PRP registrada como Frente Democrática. Participavam da Caravana o Dep. Anschau, o Senador Mondin, Tarso Dutra, Daniel Krügher, Paulo Brossard e outras importantes lideranças regionais que não lembro mais e o próprio candidato Ildo Meneghetti. Eu estava lá junto com meu pai. Nesse tempo, Meneghetti já era um cidadão passado da meia-idade e pela sua postura e seu jeito de ser, sempre foi de uma aparência tranquila, modesta, meio simplória, com óculos de lentes grossas. Sabe, aquele tipo que só de olhar você vê que é “gente boa”.

Fazendo uma pequena digressão no assunto, quero destacar que sempre fui admirador e apreciador de três ícones da prosa e verso do tradicionalismo do Rio Grande: Glaucus Saraiva, Jaime Caetano Braum e Apparício Silva Rillo e de tantas coisas lindas que estes gênios produziram, sempre estão na minha mente, respectivamente, os versos de “Chimarrão”, de “Cemitério de Campanha” e “Cusco Cego”.

Pois vai que na hora do tal almoço, todos sentados a volta da mesa, com o lugar de honra e figura central na pessoa do candidato Ildo Meneghetti, o “protocolo” do evento avisa que o menino de 8 anos, “fulano de tal” filho do líder político local “beltrano de tal” saudaria o Dr. Ildo com um poema tradicionalista de Apparício Silva Rillo.

E se aproxima o menino vestido de pilcha gaudéria. Nossa! Coitadinho…”era prá ver” a pobre figura infantil. Parecia um Galpão Crioulo, ou a frente de uma lareira gaudéria – penduraram tudo quanto foi tranqueira na guaiaca do coitado – desde revolver, faca, cuia, tirador, boleadeira, relho, guampa, relógio, laço… e nem sei mais que. Só faltou uma roda de carreta.

E o menino, altivo e firme, se posta frente ao Dr. Ildo e de braço estendido e mão espalmada em direção a ele, “lasca” em alto e bom tom:

“Este cusco brasino, cara branca / Pequenote e rabão / que o parceiro está vendo enrodilhado / aí perto do fogão / foi mordido de cobra na paleta …”

… e seguiu declamando. Parecia se referir ao Dr. Ildo. Um silêncio mortal.

O poema é lindo, mas completamente desapropriado para a ocasião. Meu Deus do Céu… não sei se foi mais trágico ou mais cômico. Coisas de política, intragável como carreteiro de campanha. Dr. Ildo foi eleito e assumiu em janeiro de 63. Hoje, todos aqueles políticos da época, repousam no lugar comum de todos os mortais, onde todos se nivelam, tanto aqueles que “não tiveram como aqueles que não quiseram” sobre sua tumba, uma cruz.

(Luiz Carlos Sanfelice, advogado jubilado, auditor – lcsanfelice@gmail.com)

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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