Quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

Porto Alegre

CADASTRE-SE E RECEBA NOSSA NEWSLETTER

Receba gratuitamente as principais notícias do dia no seu E-mail ou WhatsApp.
cadastre-se aqui

RECEBA NOSSA NEWSLETTER
GRATUITAMENTE

cadastre-se aqui

Colunistas Capitalismo, assim te fez a humanidade

Compartilhe esta notícia:

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

Há, de quando em vez, crise econômica. Muita gente, exigindo condições dignas de vida, pelo menos emprego, pragueja contra o capitalismo, com mais ênfase contra o neocapitalismo. Personaliza-se o capitalismo e se o xinga, imputando-se-lhe os males do viver a vida. Fala-se desse sistema econômico (em verdade, um sistema social) como se a execrar um demônio miasmático atemporal; um efeito sem causa.

Não existe capitalismo como entidade autogerada. Somos o\as humano\as que inventamos formas de viver, dentre tantas, o capitalismo. Se pusermos a História em marcha à ré, volveremos à agricultura primitiva, ou à selva. Se tocarmos adiante as relações sociais, será o que, dialeticamente, fizermos ser, ou a História engendrar. O\as humano\as, em qualquer maneira de existir que arranjemos, seremos responsáveis pelo devir, preste o futuro, ou não.

O busílis da questão: parte da humanidade há-se por boa e atribui as agruras da Terra à outra fração, que conspiraria para o mundo seguir como está: frio, interesseiro, violento, calculista, consumista; numa palavra, desumano. Ora, tudo o que a humanidade fez, faz, ou fará, foi, é, será humano.

O melhor que encontramos é humano, o pior que há é humano. A humanidade produz a humanidade: as condições materiais, as circunstâncias ideológicas; o modo de produção, os valores circulantes. Do resultado, há quem goste, há quem não. Aprecia quem leva vantagem e quem seja ideologicamente (no sentido marxiano) ludibriado\a; o\as excluído\as que tenham consciência das circunstâncias não estarão contentes. Fico com o\as descontentes.

Contudo, a pensar: esse modo de produzir – que também é um modo de viver – chamado de capitalismo espalhou-se pelo mundo quando nascia o século XIX. Tem pouco mais de 200 anos. Que mudou desde então? Ou seja: o mundo, o capitalismo no mundo, nós todos no mundo capitalista, no que demos?

Em 1800 éramos um bilhão de pessoas; somos oito. Morríamos com 27 anos; vivemos quase 80. Crianças trabalhavam até o esgotamento, mulheres eram “coisa” dos homens. Morriam 200 pessoas por mil nascidas; hoje, 6. O analfabetismo era a regra. Dormia-se entre piolhos, percevejos, pulgas, chatos, ratos, morcegos. Morríamos de desinteria.

Isso mudou muito. Já não somos vassalos, ainda que à maior parte de nós falte plena cidadania, o\a patrão\a já não dispõe de 80 horas semanais do empregado\a, grande parte das crianças é protegida, mulheres conquistaram independência significativa, temos vacina, o poder das igrejas foi relativizado, a Terra arredondou-se.

O que avançamos sobre o mundo de miséria que a Idade Média católica nos deixou é contribuição do capitalismo. São avanços consideráveis. Parece que estou tecendo loas ao resultado capitalista? Não! Antes, gostaria de vê-lo superado por um sistema social igualitário, sem nenhuma ordem de privilégio. Não obstante, reconheço a obra capitalismo. Alguém disse (parece que não foi Diderot, mas Meslier) que a humanidade só seria feliz quando o último rei fosse estrangulado nas tripas do último padre.

Concordo, e quero incluir o\a último\a capitalista. Mas aí, para ser coerente, não posso escrever meus textos em um computador capitalista, publicá-los em um jornal capitalista, levá-los à internet capitalista, lê-los com óculos capitalistas, sentado em uma poltrona capitalista. Se sou contra um sistema, sou contra o que do sistema decorra. Ou sou cínico\a.

O reclame por vida digna sempre será razoável. Um emprego é condição de dignidade. Todavia, ironicamente, resta um reclamo capitalista: mais emprego requer mais produção, mais consumo, mais poluição, mais destruição do planeta, mais maldito capitalismo. Clamores legítimos não autorizam simular ingenuidade sobre o modo de produção e de vida vigentes.

Dignidade é mais que emprego; emprego é subsistência. Pedir o justo emprego, porém, é um pedido de produção e consumo no sistema. Sim, há muito é tempo de revolucionar as iníquas relações capitalistas, não só as de produzir, mas as de viver. Paradoxalmente, entretanto, urge que o capitalismo, reforçando-se, empregue o\as excluído\as do sistema capitalista. A solução dessa equação ainda vai demorar.

(Léo Rosa de Andrade – Doutor em Direito pela UFSC, Psicanalista e Jornalista – Instagram: @leorosadeandrade)

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

Compartilhe esta notícia:

Voltar Todas de Colunistas

Comissão de Educação e Cultura da Assembleia gaúcha debaterá futuro do mural pintado no prédio do Daer, em Porto Alegre
De saída da Secom da Presidência, Paulo Pimenta aguarda decisão de Lula sobre futuro no governo
https://www.osul.com.br/capitalismo-assim-te-fez-a-humanidade/ Capitalismo, assim te fez a humanidade 2025-01-15
Deixe seu comentário
Pode te interessar