Terça-feira, 21 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 20 de janeiro de 2025
O presidente do Bradesco, Marcelo Noronha, cobra medidas mais fortes do lado das despesas para que o Brasil consiga caminhar em direção a um maior equilíbrio fiscal. O pacote do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desencadeou um cenário de quebra de expectativas, e, ainda que os juros subam para ancorá-las, o Banco Central (BC) não pode agir sozinho, alerta o banqueiro.
“Precisamos de medidas mais fortes para chegar a um equilíbrio maior do ponto de vista fiscal. É preciso fazer um grande esforço para conter a dívida. Não é só política monetária que resolve”, diz Noronha, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
No mundo, a sua principal preocupação é a inflação, que também “pode sair um pouquinho do controle” no Brasil, com um câmbio na casa dos R$ 6,00. “Aí é que está o desafio.” Leia abaixo alguns trechos da entrevista.
– Todo início de ano, consultorias, o próprio Fórum Econômico Mundial, definem os principais riscos para a economia global. O que mais preocupa? “Do ponto de vista global, o desafio ainda é a inflação. É um tema que o mundo está olhando. As questões geopolíticas, essas guerras também são coisas ruins para a humanidade.”
– E no Brasil? “A maior preocupação hoje no Brasil é um cenário macroeconômico mais adverso para 2025 do que se imaginava há algum tempo. As preocupações são mais internas do que externas.”
– Como o sr. vê o País posicionado nesse xadrez global? “Em relação aos Estados Unidos, prefiro esperar para ver as medidas. Se houver aumento de tarifas, isso pode ser inflacionário. Em um ambiente inflacionário, a política monetária pode agir. Se a taxa de juros subir ou ficar onde está, o dólar se fortalece e é ruim para mercados emergentes como o Brasil. Mas os dados da inflação nos EUA reforçaram a perspectiva de continuidade de queda das taxas americanas, o que reduz a pressão sobre as moedas emergentes. Para o Brasil, o impacto (da gestão Trump) deve ser neutro.”
– Em recente entrevista, o sr. disse que um cenário de estresse na economia só ocorreria se as medidas fiscais fossem muito aquém do esperado. Chegamos a ele? “Não, mas é um cenário de quebra de expectativa pelo mercado de uma forma geral. O cenário de estresse seria um cenário recessivo. O nível de desemprego está baixo, a renda real ainda pode crescer 2% este ano, depois de ter avançado 4%, 5% em 2024. Não é um cenário de estresse. Agora, é um cenário de menor apetite a risco. Porque a taxa de juros deve ficar perto dos 15% ao ano, a inflação ao redor dos 5% com esse câmbio depreciado a mais de R$ 6. É um cenário em que você onera mais as empresas alavancadas e isso diminui o apetite a risco e a perspectiva de crescimento.”
– Como fica o PIB? “O PIB, que aparentemente cresceu 3,6% no ano passado, pode crescer ao redor de 2% neste ano. Esse é outro indicador que não dá para dizer que é cenário de estresse, mas a economia brasileira deve crescer por conta de dois fatores: o carrego estatístico de 2024 e o setor de agronegócios, cujo cenário é bem positivo e deve ter um bom crescimento na primeira metade deste ano.”
– O sr. vê o Banco Central agindo sozinho para ancorar as expectativas? Eu acho que a equipe econômica está fazendo esforço, mas uma coisa é fazer esforço, outra é conseguir efetivamente. Porque o problema fiscal brasileiro não é novo, deste governo. O Brasil tem um problema estrutural, e não se muda isso da noite para o dia. A nossa equipe econômica acha que o governo vai bater a meta primária neste ano, mas a dívida pública deve superar 80% e pode, em 2026, bater 88%. É preciso fazer um grande esforço para conter a dívida. Não é só política monetária que resolve.”
– O pacote fiscal não atenuou as preocupações com as contas públicas no Brasil. O governo deve fazer mais? “Precisamos de medidas mais fortes para chegar a um equilíbrio maior do ponto de vista fiscal. Isso não significa que vai resolver de uma vez por todas o desafio estrutural do Brasil. E não se trata só de receitas. A carga tributária no Brasil já é alta. É o nível de despesa. O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, tem boa relação com a equipe econômica, isso facilita a conversa sobre política fiscal. Mas temos de esperar para ver porque tem uma variável que pode sair um pouquinho do controle, que se chama inflação, por conta do câmbio. Aí é que está o desafio.” (Estadão Conteúdo)