Sexta-feira, 24 de janeiro de 2025
Por Juliana Brizola | 24 de janeiro de 2025
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
A humanidade perde com a partida do ex-presidente dos Estados Jimmy Carter, um líder mundial que sempre militou em defesa dos direitos humanos e também perde com a volta de Donald Trump ao poder prometendo infernizar a política e atacar o planeta. A posse do eleito presidente Republicano aconteceu dois dias antes da data do aniversário de 103 anos do meu avô Leonel Brizola (1922/2004), no dia 22/01/2025.
O falecimento de Jimmy Carter, em 29/12/2024, aos 100 anos (1924-2024), causou comoção mundial. Político do partido Democrata, que governou de 1977 a 1981, ele foi incansável no seu trabalho humanitário, que realizou durante décadas, mesmo depois de deixar o cargo. Era um político filantropo.
Carter tornou-se um grande amigo de Brizola, que estava vivendo circunstâncias terríveis com nossa família durante o exílio no Uruguai, em 1977. Sob pressão da Operação Condor – união entre as ditaduras do Brasil, do Uruguai, da Argentina e do Chile contra seus adversários – Brizola foi expulso do Uruguai. Inesperadamente ele recebeu ordens para deixar o País em 48 horas. Brizola vivia no Departamento de Durazno, uma vida rural como tanto apreciava, onde comercializava sua produção de leite, ele mesmo dirigindo uma kombi. Sua vida pacata foi interrompida quando sua casa foi cercada por grande aparato policial. Sem documentação, ele era um apátrida. E não tinha passaporte. Novo golpe duríssimo em Brizola, que como saída decidiu testar a política de direitos humanos do então presidente Jimmy Carter. Todos se espantaram com essa decisão, afinal Brizola era visto como inimigo dos Estados Unidos, sendo perseguido pela Central Intelligence Agency (CIA) após o Golpe de 1964, porque quando era governador do Rio Grande do Sul nacionalizou as empresas americanas: a companhia elétrica filial da Bond and Share, em 1959, e a telefônica Internacional Telegraph & Telephone (ITT), em 1962, justificando que ambas prestavam mau serviço à população.
No entanto, Carter autorizou a ida de Brizola aos Estados Unidos e concedeu-lhe asilo. E junto com minha avó, Neusa Goulart, e meu pai, José Vicente, embarcaram na segunda fase do exílio em Nova Iorque, em 1977. Sem conhecer bem a cidade. Brizola recebeu um visto americano e todos os microfones e veículos de comunicação lhe deram voz. Desde então, foi crescendo a amizade entre Carter e Brizola.
As voltas que a vida dá. O ex-exilado Leonel Brizola foi eleito Governador do Rio de Janeiro e Carter veio visitar o Brasil pela primeira vez, na condição de ex-presidente. Foi um encontro emocionante. Era o período festivo da democratização do País, com a eleição de Tancredo Neves pelo Colégio Eleitoral após a campanha das diretas.
Brizola o recebeu com honras de chefe de Estado no Palácio Laranjeiras, sede do governo do Estado do RJ. Carter pediu para conhecer uma favela e Brizola o levou ao morro Pavão/Pavãozinho, onde andaram pelas vielas e entraram nas casas.
Brizola fez questão de apresentá-lo aos filhos e aos netos crianças. Trago esse momento na memória e registrado em uma foto do nosso álbum de família: a contagiante alegria do meu avô, emocionado, sorridente e sempre muito grato ao lado de Jimmy Carter. A imagem congelada mostra suas netas carregando um buquê de flores, que em seguida entregamos para a ex-primeira-dama dos EUA, Rosalyn. Na foto, um carinhoso Jimmy Carter pousa as mãos em meus ombros de menina. Simbolicamente, hoje esse gesto significa que tenho um exemplo duplo a seguir!
Não posso adivinhar, mas conhecido pelas suas frases hilárias e espirituosas, fico pensando: “O que diria, meu avô Leonel sobre Trump?”.
(Juliana Brizola é vice-presidente da Internacional Socialista da América Latina e Caribe, Secretária de Relações Internacionais do PDT, ex-deputada Federal pelo PDT-RS, graduada em direito, Mestre em Ciências Criminais)
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.