Terça-feira, 04 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 3 de fevereiro de 2025
A América Latina até deu sinais de que poderia surfar uma nova “onda rosa”, mas o que as urnas indicaram, eleição após eleição, era o descontentamento com os governos, não viradas ideológicas. No poder, líderes da esquerda se deparam com múltiplas crises — violência, imigração, disputas políticas fraticidas, desempenho econômico claudicante — e tem dificuldade em dar respostas satisfatórias. Desafio que deve ser acentuado com a ascensão da direita radical na potência ao norte, os Estados Unidos.
No México, Claudia Sheinbaum surfa na popularidade dos programas sociais, mas enfrenta a guerra deflagrada entre os carteis. Em Honduras, Xiomara Castro se vê no meio de um escândalo de corrupção. Na Colômbia, o plano de “paz total” de Gustavo Petro é ameaçado pela escalada da violência. No Brasil, Lula está às turras com o mercado. No Chile, os anseios por mudança foram frustrados, sem consenso para a nova Constituição, e Gabriel Boric amarga a popularidade em baixa.
Isso sem falar da Venezuela, onde Nicolás Maduro enfrenta sanções renovadas por se perpetuar no poder com eleições marcadas por denúncias de fraude e repressão aos opositores. Ou de Cuba, onde a crise energética provoca apagões constantes.
“A distribuição de recursos que sustenta a legitimidade da esquerda obviamente se torna menos viável quando os recursos são escassos”, observa o analista boliviano Roberto Laserna, pesquisador do Centro de Estudos da Realidade Econômica e Social (Ceres).
“Há pouco espaço no repertório da esquerda para o investimento privado e a criação de riqueza com mercados integrados”, acrescenta, destacando que essas alternativas devem ganhar força com os sucessos do presidente argentino Javier Milei e o retorno de Donald Trump.
Com o republicano na Casa Branca, esses países entram na mira de um governo americano que dá mais atenção para América Latina. Mas sinaliza uma atitude negativa em relação a região, que vê como fonte de problemas, da imigração ao tráfico de drogas. Assim, crises domésticas somam-se às ameaças que vêm dos Estados Unidos.
A intimidação não é tática exclusiva para os governos de esquerda e a prova disso é o Panamá. O presidente José Raúl Mulino, um conservador, é pressionado a entregar o controle sobre o Canal do Panamá aos Estados Unidos. E Trump já disse que não descarta uma ação militar para conseguir o que quer.
Mas os líderes da direita, mais notadamente Javier Milei, esperam contar com a proximidade que tem com Donald Trump. E tem o motivo para acreditar que essa pode ser uma oportunidade de estreitar laços com os Estados Unidos: o secretário de Estado americano, Marcio Rubio.
Ele defende que os EUA devem se fazer mais presentes na América Latina para conter a influência da China e fez acenos públicos a Milei. O argentino, o primeiro líder internacional recebido por Trump após a eleição, teria papel importante nos planos de Rubio para criar uma espécie de coalizão conservadora na região.
Em audiência no Senado que confirmou sua nomeação, Rubio citou três países — todos com governos de direita — que na sua visão estão dispostos a cooperar com os Estados Unidos: Equador, República Dominicana e Argentina. E defendeu o estreitamento de laços.
Em outros países da região, ainda que Donald Trump não atue diretamente apara apoiar os políticos conservadores, “seu governo pode fortalecer o clima político favorável à direita”, afirma Will Freeman, do núcleo de estudos da América Latina no Council on Foreign Relations (CFR).
Sem poder contar com ventos favoráveis, os governos de esquerda precisam descobrir como lidar com o republicano no poder ao mesmo tempo em que enfrentam seus desafios domésticos.
O analista político mexicano Francisco Jimenez, vê esquerda latino-americana “convulsionada”, depois que a maré rosa dos anos 2000 perdeu força. “Isso faz com que os Estados Unidos explorem as fragilidades desses países, que possuem uma cultura relativamente comum, mas acabam sendo dominados econômica, social e politicamente, e os pressione por meio de sanções”.
Violência no México
Na fronteira, o México é alvo de tarifas de 25% sobre os produtos que vende para os Estados Unidos. Como mostrou o Estadão, a dependência do mercado americano torna o país vulnerável às pressões econômicas.
Como aconteceu no primeiro governo Trump, o México pode se ver forçado a receber imigrantes impedidos de entrar nos EUA. Claudia Sheinbaum e seus auxiliares buscam marcar posição contrária à políticas do republicano, mas se mostram abertos a negociações, evitando embates diretos. E recebeu mais de 4 mil deportados na primeira semana de Trump.
A violência é citada nas pesquisas de opinião — as mesmas que dão aprovação de 80% para Claudia Sheinbaum — como a maior preocupação entre os mexicanos. O crime é o principal problema do país para 55% da população. As informações são do portal Estadão.