Quarta-feira, 12 de março de 2025
Por Redação O Sul | 11 de março de 2025
Nos bastidores, a avaliação é que a viagem teria um alto risco político.
Foto: Antonio Cruz/Agência BrasilA primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, desistiu de viajar a Nova York, nesta semana, para chefiar a delegação brasileira e discursar na Organização das Nações Unidas (ONU), como representante do Brasil.
O governo Luiz Inácio Lula da Silva organizava a participação da primeira-dama com líder da comitiva a ser enviada pelo País à 69ª sessão da Comissão sobre a Situação da Mulher (CSW). Com o cancelamento, a delegação é comandada novamente pela ministra da Mulheres, Cida Gonçalves. Ela decolou no domingo (9), e disse que o País terá cerca de 150 participantes.
Nos bastidores, a avaliação é que a viagem teria um alto risco político: a presidência de Donald Trump atiçou bolsonaristas nos Estados Unidos que poderiam fazer algum tipo de manifestação, a queda de popularidade de Lula e da própria Janja, as frases ditas pela primeira-dama no G20 sobre o bilionário Elon Musk, além do grande desgaste gerado com agendas e despesas em outras viagens feitas por ela e sua equipe informal.
Um ano depois de compor comitiva brasileira, a primeira-dama não vai mais ter nem sequer um assento na delegação. Após mudança de planos no governo, Cida assumiu a chefia da missão entre 10 e 14 de março, para uma série de compromissos oficiais da ONU e reuniões bilaterais, como encontro com a ex-presidente do Chile Michelle Bachelet.
Na segunda semana, entre 17 e 21 de março, o País será representado pela secretária-executiva do Ministério das Mulheres, Maria Helena Guarezi, amiga pessoal de Janja.
A CSW se reúne anualmente em março, na sede da ONU, em Nova York. Criada em 1946, é a principal instância global a discutir direitos das mulheres. O Brasil patrocina, via Ministério das Mulheres, três debates paralelos sobre os temas Misoginia Online, Justiça Climática e a Aliança Contra a Fome e a Pobreza.
Em março de 2024, o próprio Lula designou Janja como integrante da delegação. O decreto publicado no Diário Oficial da União destacou a formação dela como socióloga e autorizou oito dias de viagem com despesas custeadas pelo erário. Foi a primeira agenda internacional solo da primeira-dama – sem acompanhar Lula.
Órgãos envolvidos nos preparativos – Presidência da República, Itamaraty e Ministério das Mulheres – começaram a ser avisados da desistência de Janja na semana passada. Antes, o planejamento previa que viajassem juntas após ações no Rio, ligadas ao pós-carnaval, e que Janja e Cida dividissem agendas em Nova York.
Mudanças como essa podem implicar em custos porque retardam emissões de passagens e reservas de hotéis – que por praxe de mercado ficam mais caras em cima da hora -, além da reprogramação de quem vai compor a comissão e quando viaja.
Segundo relato de servidores federais, um diagnóstico da Presidência identificou que a viagem era de “alto risco” – não houve detalhamentos se a análise abordou apenas risco político ou também à integridade dela. Mas a conjuntura era considerada complicada.
A viagem seria a primeira aos EUA de alguma figura influente no governo brasileiro, diretamente ligada a Lula, após a posse do presidente Donald Trump, que agitou a oposição bolsonarista radicada no país. O Planalto e a Casa Branca não dialogam em alto nível. Os choques entre Lula e Trump já começaram, com embates sobre liberdade de expressão, tarifas e imigrantes brasileiros deportados.
Em novembro passado, Janja ofendeu com um xingamento um dos principais conselheiros de Trump, o bilionário Elon Musk, durante discurso em evento paralelo do G-20, no Rio. Sem citá-la, Lula desautorizou a manifestação no mesmo dia.
Nomes como o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e os blogueiros Paulo Figueiredo e Allan dos Santos têm feito intensa campanha junto ao governo Trump para punir autoridades brasileiras sob alegação de violarem liberdade de expressão.
No passado, bolsonaristas provocaram autoridades brasileiras em viagem para participar de conferências em NY, como ocorreu com o ministro e então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso. Ele soltou a frase “Perdeu, mané”, que virou bordão da direita brasileira. Considerado foragido da Justiça, Allan dos Santos protestou com megafone em frente ao hotel onde o relator dos casos no Supremo, Alexandre de Moraes, se hospedou na cidade.
As viagens de Janja têm gerado desgaste ao governo federal, e a popularidade dela caiu, acompanhando a do presidente, em recentes pesquisas de opinião. Ela já foi alvo de questionamentos pela oposição e por organizações como a Transparência Internacional sobre a “informalidade” de sua atuação no governo, embora cumpra agenda de representação assídua.
Recentemente, ela passou a divulgar compromissos de maneira informal em sua conta no Instagram, após a deputada Rosângela Moro (União-PR) apresentar projetos de lei sobre a obrigação de publicidade na agenda e despesas da primeira-dama. A parlamentar é mulher do senador e ex-juiz Sergio Moro (União-PR), que prendeu e condenou Lula na Operação Lava Jato. (Estadão Conteúdo)