Domingo, 16 de março de 2025
Por Redação O Sul | 15 de março de 2025
Cada vez mais distante do título que ostentou por décadas, o Brasil deixou há muito de ser a grande potência católica do mundo. O País caminha a passos largos para se tornar mais evangélico do que católico e as projeções menos otimistas, mostram que em uma década essa já deve ser a realidade. Essa mudança religiosa é a grande transformação sociológica brasileira no que concerne a sua essência de pensamento.
Trazendo a análise para números, os evangélicos eram 9% nas eleições de 1989, enquanto os católicos representavam 83%, hoje, mesmo sem os dados oficiais do Censo, atrasado pelo IBGE, as pesquisas de opinião apontam para uma média de 35% de evangélicos e 50% de católicos.
Essa queda vertiginosa da população católica encontra guarida em diversos argumentos. O principal deles, medido qualitativamente, é a necessidade por respostas mais rápidas e o engessamento da estrutura ritualística da Igreja. As diferentes ramificações do protestantismo, sejam elas as reformistas clássicas ou as pentecostais e neopentecostais, têm cultos mais dinâmicos, cheios de musicalidade e uma interação entre pastor e rebanho mais próxima e menos protocolar. A alta presença dessas igrejas nas mídias são um outro ponto de contato que atrai a conversão de fiéis. Cultos na madrugada acabam por fisgar pessoas que se sentem desoladas por seus problemas cotidianos e enxergam um caminho para sua consolação.
A Teologia da Prosperidade é uma outra e importante razão pela qual muitos acabam por abandonar o catolicismo, que dogmaticamente defende o voto de pobreza, por uma linha de que é possível alcançar o crescimento material e que isso tem fundamento Bíblico para justificar a vontade de Deus para a vida de quem adere. Esse motivo traz uma reflexão para um embate que é o que muda por completo a percepção social dos fiéis. A Santa Sé propõe que a vida aqui é passageira, que o benefício final está após a morte, enquanto as igrejas protestantes, que ramificaram do Calvinismo, mostram que a recompensa já pode ser recebida em vida, em um mundo em que a materialidade tem grande importância e representa a vitória, dentro do sistema capitalista.
O crescimento em outra ponta do progressismo e a afirmação de direitos minoritários têm feito com que as religiões de matrizes africanas tenham dado um salto de presença na sociedade. Encobridas pelo catolicismo, principalmente pelo histórico de sincretismo religioso, muitos fiéis da umbanda, do candomblé, da quimbanda e das demais denominações têm se assumido publicamente como pertencentes a essas vertentes. Por muitos anos, questionados sobre qual a sua religião, praticantes desses dogmas, respondiam que eram católicos, com receio de julgamentos e preconceito. Vale lembrar que durante a Era Vargas, 40 anos após o fim da escravidão, a prática de religiões africanas sofreu uma grande repressão, sendo extraoficialmente proibida no País.
Com o conservadorismo da Igreja Católica, regida por homens brancos e de origem europeia, as ações afirmativas de comunidades negras e LGBTQIA+ têm encontrado cada vez mais guarida nas religiões de matriz africana, que têm entre suas adorações os orixás, com características humanas, tendo mais identidade com os percalços dos fiéis, do que a figura das santidades imaculadas do catolicismo. A culpa que é um dos pilares do catolicismo é uma outra vertente que tem afastado fiéis. Ao iniciar uma missa, o padre exige dos fiéis que peçam perdão pelos seus pecados e confessem suas culpas. Há um protocolo para aceitação, que com as políticas afirmativas do progressismo moderno parecem não mais ornar.
Com essa perda de fiéis, a Igreja Católica tem tido ramificações internas que buscam se renovar. Em um mundo que vive o maior dilema da sua história entre a clássica guerra do antropocentrismo e do teocentrismo, as religiões têm precisado serem mais imperativas e defender pautas do que apenas se apoiar em seu histórico para sobreviverem. Essa talvez seja a explicação para que no mundo do mais radicalizado conhecimento com tantas inovações tecnológicas e científicas, vemos um crescimento vertiginoso do islamismo e dentro do cristianismo uma substituição paulatina do catolicismo pelo protestantismo.
Mesmo com o sucesso midiático de alguns padres como Marcelo Rossi ou Fábio de Melo, a Igreja Católica tem visto uma diminuição considerável de novos batismos e o envelhecimento do seu rebanho. Como experiência social, vale observar a média de idade do público que vai regularmente às missas dominicais, por exemplo.
Para conter isso, alguns padres têm buscado as redes sociais para alcançar novos fiéis ou pelo menos preservá-los. Frei Gilson, que tem sido acusado por petistas de ser simpatizante de Jair Bolsonaro, por algumas declarações dadas, é um fenômeno de popularidade em tem conseguido atrair milhões de seguidores na madrugada, às 4 horas da manhã, rezando o Santo Rosário, no que tem sido chamada de Quaresma Digital, em função do período entre carnaval e Páscoa, que é de suma importância para o catolicismo.
Com um discurso mais afirmativo e realçando um certo conservadorismo, que é dogmático da Igreja Católica, mas com a característica da solidariedade, algo que é muito caro aos fiéis dessa religião, Frei Gilson tem sido um instrumento de renovação dessa fé. O período quaresmal e a própria situação crítica de saúde do sumo pontífice, o Papa Francisco, parecem criar uma liga ainda mais propícia para esse movimento de resgate do catolicismo. (Opinião/Bruno Soller/Estadão Conteúdo)