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Por Redação O Sul | 16 de fevereiro de 2018
Embora as forças armadas já tenham atuado em diversos Estados nos últimos anos, a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro anunciada nesta sexta-feira (16) é a primeira desde a promulgação da Constituição de 1988. A ferramenta mais utilizada em operações deste tipo é a GLO (Garantia da Lei e da Ordem), que é menos invasiva na autonomia política e administrativa da localidade, e seria configurada mais como uma “parceria”, como a que ocorreu em fevereiro de 2017 no Espírito Santo.
Especialista em Direito Constitucional e professor da USP (Universidade de São Paulo) e do IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público), o advogado Daniel Falcão explica que a intervenção federal é diferente e tem alcance significativamente maior que um decreto de lei e ordem.
“GLO (garantia de lei e ordem) acontece em várias ocasiões e não mexe em nada no Estado. É uma questão específica, uma situação muito pontual, menor e peculiar: vão lá as forças armadas, intervêm e resolvem. O próprio governador pode pedir essa ajuda, aí o governo federal manda tropas. Mas, em tese, quem coordena tudo ainda é o governador”, diz Falcão.
É muito maior e muito mais grave
“A intervenção é muito maior e muito mais grave: está sendo substituído o governador num determinado assunto, a segurança pública.” No Rio de Janeiro, o secretário de segurança pública, Roberto Sá, foi afastado para dar lugar ao general Walter Souza Braga Netto, que tomará as decisões sobre segurança, com total submissão das polícias civil, militar e também dos bombeiros.
“O Governo Federal passa a ter respaldo jurídico para tomar decisões sem prestar qualquer tipo de satisfação ao governador”, explicou o Fernando Veloso, ex-chefe da Polícia Civil e comentarista de Segurança Pública da TV Globo.
Instrumento de força
Antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, houve intervenções federais nos Estados, principalmente na República Velha, no Estado Novo e na ditadura militar. “Esses institutos que realmente têm força coercitiva e são mais dramáticos e radicais foram usados na época da ditadura, entre 1964 e 1985”, afirmou a advogada constitucionalista Vera Chemim.
Entre 1995 e 2003, o presidente Fernando Henrique Cardoso ficou perto de duas possíveis intervenções. Em 1997, Alagoas passou por uma grave crise financeira, e o governo federal ajudou na solução, mas não houve intervenção formal.
Já em 2002, entidades pediram intervenção federal no Espírito Santo por causa de corrupção e crime organizado. O então ministro da Justiça Miguel Reale Jr. acatou o pedido, mas FHC barrou a medida, o que provocou o pedido de demissão de Reale.
“A intervenção federal demonstra uma crise gravíssima na unidade da federação, obviamente isso não é bom para democracia. A questão é analisar se os pressupostos estão presentes. O presidente faz uma primeira análise, mas quem tem a palavra final é o congresso”, afirmou Nestor Castilho Gomes, professor de Direito Constitucional da Univille.
Procedimento formal
O decreto de intervenção precisa ser enviado ao Congresso em 24 horas. A Câmara e o Senado vão decidir, separadamente, se aprovam ou rejeitam o decreto em votações por maioria simples. Na Câmara, a análise deve ser feita na semana que vem. Outro órgão que também deve se manifestar sobre a medida é o Conselho da República, que é formado pelo vice-presidente, os presidentes da Câmara e do Senado, os líderes da maior e da minoria nessas duas Casas, o ministro da Justiça e mais 6 cidadãos brasileiros natos, com mais de 35 anos – 2 nomeados pelo Presidente, 2 eleitos pelo Senado e 2 eleitos pela Câmara.
A Constituição não especifica em qual momento o Conselho deve se pronunciar, mas segundo Gomes há um entendimento de juristas constitucionais de que ele deveria ser consultado antes do decreto. Até agora não há notícia de que o conselho foi convocado.
Além dele, o Conselho de Defesa Nacional também deve se manifestar em casos de intervenções federais. Ele é quase igual ao Conselho da República, mas sem os 6 cidadãos brasileiros, que são substituídos pelo ministro da Justiça.
“A ausência de manifestação destes dois conselhos tornaria o decreto inconstitucional”, afirma Nestor Gomes.
Enquanto um Estado estiver sob intervenção federal, o Congresso não pode aprovar mudanças na Constituição. Por exemplo, a reforma da Previdência, que está em tramitação, não poderá ser votada durante a intervenção no Rio.
Dentro do governo, chegou a ser discutida a hipótese de a intervenção ser suspendida durante a votação da PEC da Previdência, e depois retomá-la. Mas ainda não há definição sobre essa estratégia.