Segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 24 de março de 2019
A duras penas, o ministro da Justiça, Sérgio Moro, começa a descobrir as agruras da política. No dia 14 de março, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, criou um grupo de trabalho para analisar o projeto de lei anticrime apresentado pelo ministro junto com mais duas propostas que já tramitavam no Congresso. O grupo tem 90 dias para emitir seu parecer, e só então será instalada uma comissão especial para discutir o projeto, prazos que formam parte dos ritos regulares da Casa. Não procedem, portanto, as críticas de que o projeto não está recebendo prazo suficiente para ser debatido pela sociedade em detrimento da tramitação da reforma da Previdência, que só agora, com a apresentação da reforma militar, começa de fato a ser discutida. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Apesar disso, o ministro Moro manifestou insatisfação, declarando que o pacote poderia tramitar em conjunto com a reforma da Previdência. Na madrugada da quarta-feira passada, teria encaminhado mensagens a Rodrigo Maia cobrando celeridade e supostamente acusando-o de descumprir um acordo, o que levou o presidente da Câmara a passar uma reprimenda pública ao ministro. “Eu acho que ele conhece pouco política. Eu sou presidente da Câmara, ele é funcionário do presidente Bolsonaro. Então, o presidente Bolsonaro é quem tem que dialogar comigo. Ele está confundindo as bolas. Ele não é presidente da República. Não foi eleito para isso.” E ainda observou que Moro “está copiando projeto do ministro (do Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes”, razão pela qual o projeto “prioritário”, segundo Rodrigo Maia, “é o do ministro Alexandre de Moraes”.
Quando sua popularidade como figura mais emblemática da Operação Lava Jato escalava, Sergio Moro declarou que não existia o risco de entrar para a política: “Sou um homem da Justiça, não sou um homem da política”. Ao aceitar se tornar ministro da Justiça, disse que o fazia porque estava “cansado de tomar bolas nas costas” em sua luta contra a corrupção. Provavelmente acreditou que, como ministro, seria mais fácil implementar sua agenda, mas a realidade da política começa a se impor. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, teve de lembrá-lo que há um acordo com o governo para priorizar a reforma da Previdência neste momento.
É mais um dissabor que vem se juntar a outros na curta carreira política de Moro. Começou com o desconforto de integrar um governo cujo presidente viu seu partido, o PSL, envolver-se em denúncias de uso de candidatos laranjas durante a eleição. Depois, teve de fatiar seu projeto de combate ao crime, retirando a criminalização de caixa 2 em razão da previsível resistência dos parlamentares. Na ocasião, o ministro Moro, contrariando o que dizia o juiz Moro, admitiu que caixa 2 é “crime grave, mas não tem a mesma gravidade que corrupção, crime organizado e crimes violentos”. Recentemente, o ministro Moro foi obrigado pelo presidente Bolsonaro a destituir do Conselho Nacional de Política Criminal uma especialista em segurança pública por ele indicada e que foi hostilizada pela militância bolsonarista, indignada com o fato de que ela havia criticado o afrouxamento do acesso às armas.
Não há por que duvidar das boas intenções do ministro em seu anseio de combate ao crime. Mas Sérgio Moro acreditou que bastava querer – e talvez contar com sua popularidade – para que seus projetos fossem aprovados. Começa a perceber, de maneira às vezes constrangedora, que depende de apoios que lhe escapam, a começar pelo próprio presidente.
Não há surpresa nisso. Primeiro porque o presidente e sua equipe têm mostrado dia a dia uma clamorosa falta de articulação, com trocas de farpas entre seus próprios membros, recuos, declarações de um desautorizadas por outros e diversos outros quiproquós institucionais característicos de neófitos no Poder Executivo. Mas principalmente porque parecem não entender que política é negociação. Os integrantes do governo precisam aceitar que, por mais que tenham a si próprios e a seu chefe em alta conta, Jair Bolsonaro não foi o único eleito pelo povo.