Sexta-feira, 22 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 30 de abril de 2019
Lançado semana passada, “Vingadores: Ultimato” ocupou mais de 2.700 das 3.300 salas do circuito cinematográfico e causou indignação de parte do setor audiovisual brasileiro. Para efeito de comparação, até a última quarta-feira (24), “Shazam!” e “Capitã Marvel”, estavam sendo exibidos em 975 salas.
Segundo alguns cineastas, “Vingadores: Ultimato” teria sido favorecido, principalmente, pela ausência da cota de tela para este ano, que espera para ser assinada pelo presidente Jair Bolsonaro, e por regras de controle do setor criadas pela Ancine (Agência Nacional de Cinema) que não estão mais em vigor.
Em sua coluna, o jornalista Ancelmo Gois aponta que, por causa da estreia massiva do filme da Marvel, a comédia brasileira “De pernas pro ar 3”, com mais de um milhão de ingressos vendidos em duas semanas, perdeu 300 salas do circuito.
Mariza Leão, produtora do filme, argumenta ainda que o título ficou em 524 salas de 484 cinemas, dos quais apenas 132 colocam-no em salas com três a quatro sessões durante o dia. “Em 153 cinemas, o filme é colocado em duas sessões diárias, e em 199 cinemas, fica em apenas uma sessão diária. Isto é uma perversidade do ponto de vista cultural e econômico.”
Mariza enviou uma carta à diretoria colegiada da Ancine protestando justamente contra a falta de regras reguladoras do mercado cinematográfico. Além da ausência da cota de tela, ela menciona no texto a regra da “dobra”, segundo a qual os exibidores eram obrigados a manter o filme em cartaz se ele atingisse uma média de público.
“Filmes com performance acima de média saem de salas sem nenhuma explicação, sem nenhuma defesa. Tal fato gera prejuízos incalculáveis a investimentos tanto públicos quanto privados”, disse ela.
Outra regra da Agência de Cinema, derrubada pela Justiça Federal em novembro do ano passado, limitava a ocupação de 30% de um complexo por um único título. Em seu perfil no Facebook, o cineasta pernambucano Kleber Mendonça Filho, cujo filme “Bacurau” foi selecionado para a mostra competitiva do Festival de Cannes, publicou um comentário em que faz menção à regulamentação agora extinta.
“‘De pernas pro ar 3’ estava dando dinheiro. Quando o mercado corre sem lei, sua lógica é a de subtrair para ganhar, e não a de somar com diversidade. Os dois filmes poderiam ir bem, sem desequilíbrio”, comentou.
O gaúcho Ricardo Difini Leite, presidente da Federação Nacional das Empresas Exibidoras e diretor da rede de cinemas GNC, diz que é preciso cautela para analisar o caso. Segundo ele, não é possível afirmar com certeza que a ocupação do filme da Marvel corresponde a 80% das salas brasileiras, porque muitas delas são compartilhadas com outros filmes. Além disso, trata-se de um caso excepcional.
“Estamos falando de um lançamento, que é o maior do ano e que teve uma procura fenomenal. É um tanto precipitado dizer que um filme como “Ultimato” vai prejudicar a performance do filme com Ingrid Guimarães. O filme brasileiro continua em muitas salas, mas teve diminuição da média de forma natural. O mesmo vai acontecer com o filme da Marvel, que deve cair um pouco na segunda semana. Isso é um caso isolado”, diz Leite.
Em nota, a Agência Nacional de Cinema disse que vai “monitorar a questão”: “O assunto é pauta da Câmara Técnica de Salas de Exibição, que conta com representantes de associações de distribuidores, exibidores e produtores do audiovisual”.
Daniel Caetano, presidente da Associação Brasileira de Cineastas, declarou que a regulação é necessária e ajuda o mercado a funcionar, sendo construída em conjunto com os agentes desse mercado.
“Eu entendo que o mercado tenda a esse modelo, mas acredito que faz parte das funções do governo criar mecanismos regulatórios que evitem que as leis de mercado acabem canibalizando o próprio mercado”, comentou ele sobre a situação causada pela estreia de “Vingadores: Ultimato” no Brasil.