Terça-feira, 26 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 9 de junho de 2019
Em um recente café da manhã no hotel onde ele reside em Brasília, o ministro da Economia, Paulo Guedes, percebeu em uma mesa próxima o rosto familiar: era o ex-chefe da Casa Civil do então presidente Michel Temer (2016-2018), Eliseu Padilha, famoso pela habilidade política no trato com o Congresso Nacional.
“Lembra de mim?”, disse a ele, sorridente, o emedebista gaúcho. Sem titubear, Guedes foi até o colega de café e, após os cumprimentos, lascou a pergunta: “Com quem devo falar para aprovar a reforma da Previdência?”.
Padilha nem precisou refletir. Abriu o manual da “velha política” e foi direto ao ponto. “Procure os senadores Renan Calheiros [MDB-AL], Eduardo Braga [MDB-AM] e o deputado Arthur Lira [PP-AL].” O “superministro de Bolsonaro concordou, agradeceu e foi embora.
Guedes, na verdade, já havia jantado com Renan e conversado duas vezes com Braga, em reuniões da bancada do MDB. Faltava Lira. Dias após receber a dica de Padilha, foi a vez de uma reunião com parlamentares do PP.
Guedes conheceu Renan no fim do ano passado, em Brasília. De lá para cá, os dois têm trocado “diagnósticos”. O ex-presidente do Senado, no entanto, não assegura apoio integral às mudanças na aposentadoria propostas pelo governo. A cautela marca, ainda, o discurso de Braga e Lira sobre o assunto.
“Eu não tenho a pretensão de ser conselheiro do Paulo Guedes”, disse Renan a interlocutores. “Não é possível fazer uma única reforma, nem dá para cobrir o déficit fiscal com a economia desabando.” Irônico, o senador afirmou que, antes de tudo, o governo precisa mesmo é ir atrás do apoio da bancada do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro.
“Em um cenário desses na política, que papel é reservado à oposição?”, provocou ele, na semana passada, ao assistir a um bate-boca entre o senador paulista Major Olímpio, que comanda a bancada do PSL, e a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), líder do governo no Congresso Nacional.
Adversário de Renan, Lira disse que, após a conversa de Guedes com deputados do PP, muitas dúvidas foram resolvidas. “Tenho mantido contatos diários com Rogério Marinho (secretário especial da Previdência e do Trabalho). Ninguém está mais atualizado do que ele”, afirmou o líder do PP na Câmara. “Nós somos a favor da reforma, mas é preciso tirar de lá o BPC (Benefício de Prestação Continuada), a aposentadoria rural e os Estados e municípios.”
Reuniões
Batizado de “Posto Ipiranga” na campanha eleitoral e hoje chamado de “PG” (suas iniciais) por Bolsonaro, Guedes procura medir bem os passos em suas incursões pelo mundo político. Além de seguir os conselhos de Padilha, ele acatou a ideia do assessor especial Guilherme Afif Domingos e abriu as portas de seu gabinete. Desde fevereiro, quando o Congresso iniciou a nova legislatura, o ministro recebeu 312 parlamentares de vários partidos.
As reuniões seguem sempre o mesmo ritual. Senadores e deputados são acomodados ao redor de uma longa mesa oval. O ministro embala, então, seu pedido de apoio à aprovação da reforma da Previdência com a defesa do pacto federativo e da descentralização de recursos para Estados e municípios.
“O senhor constrói o céu, mas nós, deputados, não teremos a chave dele. Então, vamos ajudar o governo a construir o céu e viver no inferno”, disse a Guedes o líder do DEM na Câmara, Elmar Nascimento (BA).
O Palácio do Planalto precisa do apoio de 308 deputados e 49 senadores, em duas votações, para que as mudanças propostas na aposentadoria saiam do papel. Rogério Marinho garantiu ao ministro, recentemente, que o número está “quase lá”, mas, nos bastidores, deputados dizem haver muito chão pela frente.
Nas conversas em seu gabinete, Guedes sempre diz que consertar o Brasil não é questão “de direita nem de esquerda”, mas ouve queixas de muitos parlamentares preocupados em avalizar uma proposta com pouca aceitação popular. Ex-professor, ele adota o estilo “fala que eu te escuto” e procura convencer os mais resistentes.
“O ministro tem uma avaliação simplista, mas nós sabemos que não é bem assim”, argumentou a deputada Professora Dorinha (DEM-TO). “Muitos do nosso partido que fizeram a defesa cega da reforma trabalhista (na gestão de Michel Temer) perderam as eleições.”
O próprio Rogério Marinho, então relator do tema na Câmara, foi derrotado, após oito anos de mandato. Não é só: dos 23 parlamentares que àquela época votaram a favor das mudanças na Previdência, na Comissão Especial, apenas cinco se reelegeram. Guedes, porém, sempre diz ser um homem “de muita fé”. E já virou adepto das planilhas de Padilha.