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Por Redação O Sul | 22 de setembro de 2019
A epidemia de HIV no Brasil teve, na última década, uma taxa anual de crescimento estável na população geral, como um carro que avança na estrada com uma velocidade de 100 km/h. Entretanto, quando analisamos diferentes subgrupos, é nítido que existem parcelas da população para quem o ponteiro do velocímetro do HIV encontra-se subindo.
Dois dos grupos que preocupam pela aceleração nesse crescimento são os jovens com menos de 30, e os idosos a partir dos 55 anos de idade. Segundo o último Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde, nos últimos 10 anos, por exemplo, a taxa de detecção de casos de Aids entre homens de 20 a 24 anos saltou de 15 para 36, enquanto entre maiores de 60 anos, de 10 para 13, ambas por 100.000 habitantes. Já no miolo da pirâmide etária, que vai de 30 a 55 anos, o Brasil tem uma epidemia em franca desaceleração.
Tudo aquilo que diz respeito aos jovens costuma chamar mais a atenção da grande mídia. Porém, os idosos, mesmo que apresentem um crescimento relativamente menor dos casos no período, merecem urgentemente um olhar atento de cuidado à saúde nesse campo da prevenção e tratamento do HIV e outras ISTs (infecções sexualmente transmissíveis).
Os estudos que tentam delinear o perfil epidemiológico do crescimento do HIV na terceira idade encontram principalmente a via de transmissão sexual entre indivíduos que, por não estarem cientes dos riscos que corriam, não se preocupavam em usar estratégias de prevenção com boa adesão.
São inúmeros os casos de pessoas que durante a vida tiveram relacionamentos fixos em que não usavam o preservativo, chegando à terceira idade muitas vezes desquitados ou viúvos, ainda com vida sexual ativa e sem a percepção de risco nem as orientações sobre a importância de se prevenirem em relações sexuais com suas novas parcerias casuais. Soma-se a esse cenário, a mudança na cultura brasileira, que valoriza que a vida sexual continue até idades mais avançadas, e fatores fisiológicos, como a disfunção erétil que muitas vezes é potencializada no contexto do uso do preservativo masculino.
Apesar de os casos da doença estarem aumentando nesse grupo, não houve ainda uma reação franca, direcionada e eficiente dos órgãos de saúde pública responsáveis pelo controle da epidemia.
A invisibilidade, no entanto, da população idosa no debate do acesso à saúde não se restringe ao HIV, mas está presente em todo o cuidado da saúde física e mental dessa população, e fica ainda mais escancarada quando estamos falando de grupos marginalizados pela sociedade. Esse é o caso, por exemplo, de idosos LGBTs. Afinal, não poderíamos esperar que quem foi durante toda a vida excluído e discriminado, na terceira idade tivesse sua saúde bem assistida.
Atualmente, um estudo conduzido pela Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) está mapeando o acesso à saúde da população idosa no Brasil e pode ajudar no desenvolvimento de propostas para melhorar essa questão. Ele pretende investigar se a diversidade de orientação sexual e identidade de gênero têm algum papel nas vulnerabilidades que acompanham o envelhecimento. Por isso, essa é uma pesquisa direcionada para todos os brasileiros com mais de 50 anos de idade, sejam eles LGBTs ou não.
O crescimento da epidemia de HIV entre os mais velhos é apenas uma das faces do descaso com a atenção à saúde de um grupo que só tende a aumentar nas próximas décadas. Melhor começarmos a olhar para esse tema desde já, enquanto ainda é possível controlar o ponteiro do velocímetro, para não termos que enfrentar um cenário ainda pior no futuro.