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Por Redação O Sul | 13 de outubro de 2019
Enquanto procuradores e juízes da primeira instância têm arquivado, nos Estados, os desdobramentos do inquérito aberto pelo STF (Supremo Tribunal Federal) para apurar fake news e ameaças contra integrantes do tribunal, há em Brasília uma confluência entre Supremo, governo federal e Ministério Público que respalda o prosseguimento da investigação.
A AGU (Advocacia-Geral da União), que representa o governo Jair Bolsonaro, tem dado pareceres favoráveis à continuidade do inquérito, cuja constitucionalidade é questionada em ações no próprio Supremo e na Justiça Federal de primeiro grau em Brasília.
No entendimento da AGU, o ministro Alexandre de Moraes, que preside a investigação, não será o responsável por denunciar e julgar os suspeitos, o que assegura a separação entre as funções prevista na Constituição.
“Não há qualquer indício d e que essa corte [STF] teria a pretensão de oferecer denúncia criminal. O que está em curso consiste apenas em fase prévia, de cunho investigativo […] A privatividade na promoção da ação penal pública pelo Ministério Público resta, assim, preservada”, tem sustentado o órgão.
Moraes tem remetido braços da investigação às Procuradorias nos estados onde considera haver indícios de crimes. A ideia é que os procuradores locais avaliem as provas colhidas pelo STF e, se entenderem que houve crime, ofereçam denúncia. A estratégia, porém, tem sido mal recebida.
Para São Paulo, por exemplo, foram enviados quatro “filhotes” do inquérito, como foram apelidados os desdobramentos da apuração principal. Eles apontam para suposta produção massiva de notícias falsas e divulgação de ofensas e ameaças graves aos membros da corte.
Dois desses casos já foram arquivados pela Justiça Federal a pedido de procuradores que atuam na capital e no ABC paulista. Num terceiro, a Procuradoria também pediu o arquivamento, que está pendente de análise pelo juiz. Todos os procedimentos tramitam em sigilo.
“É inconcebível que um membro do Poder Judiciário acumule os papéis de vítima, investigador e julgador. Soma-se a isso o fato de o STF ter instaurado a investigação de ofício e descrito o objeto da apuração de forma ampla e genérica, o que contraria o devido processo legal”, afirmou a Procuradoria em São Paulo, por meio de nota, sobre o caso arquivado na capital.
Numa guinada em relação a Raquel Dodge —que buscou arquivar o inquérito em diversas ocasiões e entrou em atrito com o STF por causa disso—, o novo procurador-geral, Augusto Aras, afirmou que não há inconstitucionalidade na apuração, desde que suas conclusões sejam submetidas ao Ministério Público, único órgão capaz de propor ações penais.
“Não há nulidade de inquéritos […] Poderia ser aberto pelo próprio STF, pela autoridade policial, pelo Ministério Público. O que é relevante firmar é o destinatário das conclusões do inquérito, e ele só pode ser um: o Ministério Público”, disse Aras à reportagem.
No Supremo, com exceção do ministro Marco Aurélio, mesmo os críticos ao procedimento têm evitado comentá-lo, seja para não enfraquecer o tribunal perante o público, seja porque, como observam, desconhecem a gravidade do que a apuração ainda pode encontrar.
Fechando o ciclo dos operadores do direito, o presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, disse considerar que a medida adotada pelo STF foi útil para coibir milícias virtuais que não eram enfrentadas nem pelo Ministério Público nem pela Polícia Federal.
“Esse inquérito tem sua natureza heterodoxa, tem que ser discutido com tempo, temos que ter cuidado, sim. Fato é que ele, bem ou mal, vem gerando ao menos alguma cautela de quem vinha abusando claramente do poder econômico para manipulação dessas milícias digitais”, declarou à reportagem, sugerindo que as ações na internet são orquestradas por grupos poderosos.
“Vou submeter a questão à Comissão de Estudos Constitucionais da Ordem, mas, a partir do momento que o próprio procurador-geral da República tem dito que em fase de inquérito não há inconstitucionalidade, nós estamos ouvindo o posicionamento dele.”
O motivo dos questionamentos sobre o inquérito é que, segundo seus críticos, há uma série de vícios de origem.
A investigação foi aberta em março pelo presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, sem provocação de outro órgão —no jargão jurídico, foi instaurada de ofício.
Moraes foi escolhido relator por Toffoli sem que houvesse um sorteio entre todos os ministros. E o objeto da apuração é amplo demais, sem um fato criminoso bem definido, o que permite que várias situações sejam enquadradas no escopo da investigação, como tem ocorrido. As informações são do jornal Folha de S. Paulo.