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A amizade na visão de Cícero

Em julho, comemora-se o Dia da Amizade. (Foto: Reprodução)

Em julho, comemora-se o Dia da Amizade. É comum tentarmos não tratar dessa instituição de maneira valorativa: dizemos que amigos são os pais, que a amizade não existe ou que, se existe, só serve às boas horas de bonança: na privação, os amigos dispersam. A verdade é que as “amizades” construídas pelos propósitos errados, sim, são dispersivas, superficiais, passageiras. Então, a fim de delinear critérios mais verdadeiros e justos para a existência, encerramento ou utilidade das amizades, comento a seguir alguns pontos da obra “Da Amizade”
de Marco Túlio Cícero, filósofo e jurista romano.

Para começo, discutamos o fim (teleologia) da amizade: é comum que se confunda uma simples reunião de pessoas, suprindo umas a carência das outras, com amigos. No entanto, um dos pontos centrais da ética ciceroniana é a visão de que a sociabilidade humana é natural e nobre (ideia retomada no seu Da República) e não se justifica pela debilidade e carência humanas.

Trocas de favores e confortos não são amizade, portanto. O jurista romano observa que a verdadeira amizade surge pela inclinação natural das pessoas a viver com seus pares, por amor, e não pelo desejo de ver suas necessidades supridas por outrem.

Em sequência, a amizade é uma expressão da harmonia: a sua essência está no compartilhamento dos gostos, preferências e princípios. Diz-nos o filósofo: “sendo os amigos de conduta irrepreensível, deve haver entre eles, sem nenhuma exceção, uma comunhão de ação, pensamento e vontade”. Ou seja, ao buscar amigos, devemos fazê-lo sempre olhando para onde está o nosso coração, a nossa cosmovisão e os nossos valores. E essa não é uma visão autoritária, mas a consequência evidente da falta de confluência entre amigos é que ambos seguirão caminhos opostos, findando a amizade.

Por fim, Cícero leciona que a amizade só nasce e se conserva pela virtude. E, com isso, quer dizer: o bem, a verdade, a justiça. É frequente vermos “amigos” serem licenciosos ao pedir favores escusos aos seus pares, como encobrimento por atos errados, favorecimentos etc. Cícero, no entanto, sanciona a primeira lei da amizade: nada de imoral pedir, nada de imoral conceder.

Em suma: amizade é a reunião natural das pessoas, por amor, para compartilhamento dos mesmos valores em um ambiente de prática das virtudes. Na era da individualidade, é comum refutarmos a ideia de amizade. Mas tenhamos em conta o que disse um sábio (Arquinas de Tarento): “Se um dia alguém subisse ao céu para contemplar o universo inteiro, o espetáculo lhe seria desagradável se não tivesse alguém a quem contar as maravilhas vistas.”

Matheus Pitaméia, advogado

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