Sábado, 28 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 11 de agosto de 2018
Cultos, alertas e chamados movem a bancada evangélica no Congresso. Em levantamento realizado pelo jornal Estado de S. Paulo, esse grupo é composto por ao menos 84 parlamentares: 82 deputados e dois senadores. É mais do que o dobro do número de parlamentares federais evangélicos que se elegeu em 2006, segundo o Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), embora não haja um dado oficial sobre o tema.
Esses congressistas estão organizados na FPE (Frente Parlamentar Evangélica). Oficialmente, há 182 integrantes em exercício nela. No entanto, 105 deputados pertencem a outras religiões. Lá entraram com suas assinaturas somente para viabilizar a criação da frente, fortalecendo a representação parlamentar evangélica na Casa.
Os 84 parlamentares representam 23 Estados, 21 legendas e 19 denominações evangélicas. Uma vez no Congresso, porém, para boa parte deles as diferenças regionais e partidárias são esquecidas em prol da união em torno de pautas morais – ou de costumes, como alguns preferem classificar.
Votações que marcaram essa legislatura, como o impeachment de Dilma Rousseff ou a votação da PEC do teto de gastos, não entraram nas conversas da bancada. Não se trata de um grupo homogêneo. O que os une é a defesa dos “valores cristãos e da família”. Organizam-se para aprovar projetos favoráveis a essa plataforma e, especialmente, para barrar projetos desfavoráveis a ela. Na bancada evangélica, portanto, não há problema fiscal – não como um problema político a ser enfrentado. Ali não persevera o debate econômico.
Esse grupo de parlamentares sabe que abundam projetos de cunho moral. Por isso, o grupo evita pautas polêmicas e mantém uma estratégia bem definida de atuação política. Há prioridades claras e declaradas: impedir a realização de abortos, o debate sobre identidade de gênero nas escolas, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a liberação dos jogos de azar, a legalização das drogas. Orientação do grupo é bloquear iniciativas contra “valores cristãos”.
No final de 2017, a votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 181 marcava um avanço na ousadia política dos evangélicos. Originalmente, era uma proposta para ampliar o tempo de licença-maternidade em caso de parto prematuro. No meio do caminho legislativo, um deputado da Frente Evangélica desfigurou o projeto. Este passou a incluir a ideia da “inviolabilidade do direito à vida desde a concepção”, tornando ilegal todo tipo de aborto, hoje permitido em casos de estupro, de risco à vida da mãe ou de bebês anencéfalos.
O grupo conseguiu que uma proposta claramente progressista se tornasse um projeto conservador de altíssimo impacto, com chances de prosperar na Câmara.
Os evangélicos inscreveram-se em peso na comissão que tratava da PEC, chegando a ter quase metade das vagas. “Não é no grito que vamos conseguir o que queremos, é no voto. Daí a importância de estarmos organizados, presentes. Não podemos comer mosca”, diz Leonardo Quintão (MDB-MG), presbiteriano que está no terceiro mandato. Ele avalia que o grupo foi aprendendo com o tempo a operar na Casa.
Os evangélicos fazem reuniões às terças na Câmara, quando são discutidos projetos de interesse do grupo ou iniciativas que merecem posicionamento da bancada – como o repúdio à exposição Queermuseu e à exibição do desenho animado “Festa da Salsicha” pela HBO, por exemplo.
O quórum da reunião nem sempre é alto, mas há os cultos. Realizados às quartas pela manhã num dos plenários da Casa, eles atraem um público fiel. Após a adoração, é comum que os deputados despachem sobre temas de interesse. Por WhatsApp, a qualquer hora de qualquer dia, surgem avisos e lembretes de votações.
“Os deputados da esquerda militam. Entendemos que tínhamos de ter um grupo para militar também”, diz Takayama, que, aos 70 anos, está em seu quarto mandato e, desde o ano passado, preside a FPE. “A Frente funciona como uma espécie de guardiã”.
A comissão da PEC 200, que pretende isentar do pagamento de IPTU templos alugados, é a que recebeu o maior número de integrantes da bancada: 17 dos 21 que a compunham eram evangélicos. Foi aprovada. Apresentada pelo ex-senador e atual prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (PRB), ela ainda precisa ser apreciada no plenário.
No núcleo duro da articulação, ao lado de Takayama, estão nomes como pastor Marco Feliciano (PODE-SP), João Campos (PRB-GO) e Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ). Mas a FPE diz contar com mais de 70 deputados firmes na causa evangélica.
Atualmente, os 82 deputados evangélicos estão distribuídos em 159 das 184 comissões permanentes e temporárias da Casa.