Sábado, 22 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 21 de fevereiro de 2025
Após a denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas no inquérito da trama golpista, a defesa dos investigados identificou uma brecha no regimento do Supremo Tribunal Federal (STF) que pode fornecer a saída que eles buscam para tentar tirar o caso da Primeira Turma da Corte, formada por Alexandre de Moraes e outros quatro ministros, e levá-lo para julgamento dos 11 magistrados no plenário.
Um dos pontos que devem ser trazidos pelos advogados de Bolsonaro e outros denunciados é o artigo 22 do regimento interno do Supremo, que prevê que o relator pode enviar o processo para o plenário “quando, em razão da relevância da questão jurídica ou da necessidade de prevenir divergência entre as turmas, convier pronunciamento do plenário”.
Ou seja: a defesa vai argumentar que dada a relevância do caso, que envolve um ex-presidente e uma tentativa de golpe de Estado, o processo deveria ser analisado por todos os ministros em conjunto.
O regimento também permite que o relator encaminhe o processo ao plenário “quando houver relevante arguição de inconstitucionalidade ainda não decidida” – argumento a ser usado na tentativa de derrubar a delação de Mauro Cid, que fundamenta a denúncia, o que poderia atrair a competência do plenário, na avaliação de advogados dos investigados ouvidos reservadamente pela equipe da coluna.
A estratégia não é garantida, uma vez que depende de decisão do relator, Moraes. Uma mudança de postura pode depender da pressão interna, uma vez que parte dos ministros não está satisfeita com a possibilidade de o caso ser decidido na turma, ou mesmo da pressão da opinião pública – mas Moraes não tem dado, até aqui, sinais de que vai ceder nesse ponto.
Ainda assim, os advogados dos investigados consideram que não há dúvidas de que o inquérito da trama golpista se enquadra nessa hipótese de “relevância da questão jurídica”, considerando a gravidade das acusações contra Bolsonaro e militares de alta patente, denunciados por golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado. Os crimes somam 43 anos de prisão.
Conforme informou o blog, a defesa de Bolsonaro considera crucial tirar o julgamento da denúncia da trama golpista da Primeira Turma (conhecida como “câmara de gás”) em razão da influência de Moraes sobre os outros quatro ministros – Cármen Lúcia, Flávio Dino, Luiz Fux e Cristiano Zanin.
Até agora, a adesão dos colegas de Turma às decisões de Moraes envolvendo o bolsonarismo foi unânime, conforme levantamento feito pelo jornal O Globo.
Para interlocutores de Bolsonaro, trazer o julgamento para o plenário poderia atrair para o ex-presidente dois potenciais votos pela sua absolvição – os de Kassio Nunes Marques e André Mendonça, ambos indicados ao STF por Bolsonaro, e que integram a Segunda Turma.
“É importante que haja posições divergentes no plenário”, diz um influente advogado que atua no caso.
Os dois ministros também poderiam fazer manobras para travar a discussão do caso com pedidos de vista, empurrando o desfecho do julgamento para 2026, em pleno ano eleitoral – algo que Moraes quer evitar.
A ofensiva da defesa dos denunciados, no entanto, esbarra numa mudança no regimento interno do STF, aprovada em dezembro de 2023 com o apoio de quase todos os ministros. A proposta, apresentada pelo presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, devolveu às Turmas a competência das Turmas de julgar denúncias e ações penais.
A decisão de Moraes de manter o caso na Primeira Turma provocou desconforto em uma ala da Corte, que avalia que o plenário seria o melhor ambiente para analisar o tema, considerando a gravidade das acusações e os agentes envolvidos na investigação.
“Essas questões mais relevantes deveriam sempre ir a plenário”, diz um ministro que não vai participar do julgamento e conversou reservadamente com equipe da coluna.
Aliados de Moraes apontam que o novo entendimento foi apoiado por quase todos os ministros – e observam que, já naquela época, se sabia que os futuros casos relacionados ao 8 de Janeiro seriam enviados para a Turma, mantendo no plenário somente os processos onde já havia denúncia pronta para análise dos 11 integrantes do tribunal.
Ou seja: Moraes considera que não haveria motivos para nenhum desconforto agora, já que as novas regras pavimentaram o caminho para Bolsonaro ser julgado futuramente pela turma. O ministro Gilmar Mendes, que integra a Segunda Turma, concorda.
“Foi isso que o Tribunal decidiu ao permitir que fosse para as turmas o julgamento dos processos criminais. Inicialmente, se vocês se lembram, julgamos muitos no plenário. Depois isso passou para a turma. E é uma circunstância. Se o relator é da Primeira Turma, o processo vai para a Primeira Turma. Nós também temos nossos processos que julgaremos na Segunda Turma. Isto é natural como acontece”, disse Gilmar a jornalistas na última quinta-feira (20), após um evento em Brasília.
Para os ministros, a mudança no regimento era importante para descongestionar o plenário da Corte, já que só as investigações em torno dos atos que resultaram na invasão e na depredação da sede dos três poderes em Brasília, em 8 de janeiro de 2023, levaram à abertura de mais de mil ações penais, congestionando, assim, a pauta do plenário.
A alteração também atendeu a um pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que queria garantir o direito de os advogados fazerem suas sustentações orais em julgamentos preferencialmente presenciais – e evitar a discussão de casos no plenário virtual da Corte, em que as defesas gravam suas manifestações e as disponibilizam na plataforma digital, sem ter a certeza de que estão sendo mesmo ouvidas pelos magistrados. As informações são do jornal O Globo.