Há quase dois meses no comando da Caixa Econômica Federal, a presidente Rita Serrano tem dito que o banco público deve atuar com papel anticíclico na economia e participar do desenvolvimento do país. Em entrevista, ela aprofundou a tese ao defender que uma eventual redução dos juros por parte do banco, assim como foi feito anteriormente em governos petistas, pode ser um modo de competir com outros bancos no sistema financeiro, mas ponderou que sua gestão não fará nada que traga prejuízo.
No passado, governos petistas foram criticados por utilizar bancos públicos para forçar queda nos juros no restante do sistema financeiro.
“Dentro de uma política de concorrência e anticíclica, [reduzir juros] é uma possibilidade, mas precisa seguir regras de governança e precificação”, ponderou Serrano, que é crítica do atual patamar da taxa Selic, de 13,75%, definida pelo Banco Central. “A política monetária tem premissas, como gerar empregos [um dos objetivos do BC, previstos na Lei da Autonomia, é fomentar o pleno emprego] e desenvolver o país.” Muitos economistas defendem, por outro lado, que o atual patamar dos juros é necessário para controlar a inflação.
“Os bancos privados deveriam ter um compromisso com o país, investindo no desenvolvimento”.
Indicada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o comando do banco, Serrano afirmou não existir dicotomia entre a atuação social e comercial da Caixa.
A executiva informou que o banco está analisando a regularidade de um empréstimo de R$ 450 milhões concedido pela Caixa à Americanas no final de dezembro, antes de o rombo contábil de R$ 20 bilhões vir à tona. “Em princípio, seguiu os trâmites, mas acho que, por ter sido feita no dia 20 de dezembro, a prudência deveria ser esperar a nova gestão para avaliar.”
A Caixa vai tentar junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) prorrogar a devolução de R$ 20 bilhões ao Tesouro. Previstos para quatro anos, a presidente informou que o banco negocia devolver em oito. Caso o órgão de controle não aceite, disse, haverá comprometimento na oferta de crédito.
Serrano também afirmou que a Caixa não vai operar o consignado no Bolsa Família após as novas regras editadas pelo governo. “Isso tem de ser anulado”, disse a presidente, que ainda reafirmou: “a Caixa nunca abandonou e não vai abandonar o atacado, mas nossa prioridade é microcrédito, a pequena e a média empresa.”
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que os bancos públicos voltarão a ser protagonistas em seu governo. O que mudará na Caixa e o que foi feito no primeiro mês de gestão? Rita Serrano respondeu que o mais relevante e a primeira coisa que vai mudar é que o banco vai se manter público. O desenho que estava colocado no governo anterior era vender todos os ativos, ou abrir capital das subsidiárias, e havia uma discussão de abrir o capital da própria Caixa. Isso não existe mais, empresas públicas voltam a ser valorizadas e utilizadas para o desenvolvimento do país. Somos um banco seguro e vamos nos preparar para atender clientes e população. Até o fim de março, teremos refeito todo o plano estratégico, de negócios e orçamentário. Em abril, teremos um novo banco. No primeiro mês, iniciamos um processo de mudança na direção.
Como conciliar a atuação comercial e social? Serrano respondeu que não existe dicotomia. Inclusive os bancos privados deveriam ter um compromisso com o país, investindo no desenvolvimento. No caso de um banco público, como a Caixa, todos os convênios com o governo são remunerados, faz parte do portfólio de produtos do banco, que não faz nenhuma operação gratuitamente. O banco tem demanda muito maior sobre benefícios sociais, isso bancariza a população e fideliza clientes.