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Política A década foi marcada pelo declínio do PT, uma nova onda conservadora e enfraquecimento de partidos

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Petista (E) não citou o nome de Jair Bolsonaro, mas fez referências a um governante (Foto: Divulgação)

Pela primeira vez não vamos ter um candidato de direita na campanha”, celebrava o então presidente Lula em um evento no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, um ano antes da eleição que consagraria Dilma Rousseff como sua sucessora. A ideia de que a ausência da direita em um pleito presidencial seja algo desejável, de outro lado, embute um nítido componente autoritário: Lula afirmava, em essência, que a democracia mais saudável é aquela em que só um campo político está representado. E agora a tal direita que esteve ausente nas eleições de 2010 chegou ao poder na sua versão mais agressiva: Jair Bolsonaro. Essa virada de um extremo ao outro define a trajetória política brasileira na década que se encerra. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Já se dizia que o País saiu dividido do pleito de 2014, quando Dilma reelegeu-se no segundo turno com uma estreita vantagem de cerca de 3,5 milhões de votos em relação a Aécio Neves. Mas a polarização só se tornou realmente abissal com a emergência recente de Bolsonaro.

Se durante o governo de Michel Temer o PT conseguira tornar corrente nos círculos de esquerda a ideia de que o impeachment de Dilma Rousseff em 2016 fora um golpe, a revisão de conceitos tornou-se ainda mais selvagem sob Bolsonaro: o País de repente começou a discutir se o golpe de 1964 foi mesmo golpe, e se a ditadura que então se instaurou foi mesmo ditadura. Bolsonaro constitui uma ruptura drástica de consensos estabelecidos no debate público brasileiro.

A erosão dessa hegemonia começou justamente quando a maior força da esquerda, o PT, ocupou o poder: o partido “perde o charme” de força opositora, na definição do cientista político Fernando Schüler, do Insper. A debacle econômica do governo Dilma certamente contribuiu para o declínio da legenda, mas Schüler prefere enfatizar um processo mais estritamente político: “Lula criou uma narrativa excludente, do ‘nós contra eles’, do ‘nunca antes neste País’. E uma narrativa assim cria o seu oposto”, avalia. “Em uma sociedade aberta e complexa como o Brasil, se você tem uma carga ideológica pesada de um lado, você também vai ter alguma resposta do outro lado.”

A expressiva votação de Aécio em 2014 parecia qualificar os tucanos como porta-vozes das insatisfações com o projeto petista, mas a divulgação, em 2017, do comprometedor diálogo em que o político mineiro pede um empréstimo de R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, da JBS, sepultou de vez suas ambições presidenciais. E o PSDB, pondera Schüler, sempre foi um “partido parlamentar”, sem quadros ou militância que pudessem encampar o antipetismo que fermentava nas ruas desde 2013.

O ano de 2013 foi fundamental na virada conservadora no Brasil. As manifestações que tomaram as ruas em junho começaram com movimentos minoritários da esquerda que protestavam contra o aumento da tarifa de transporte público em São Paulo, mas as massas que saíram às ruas naquele mês expressaram anseios mais variados. A bandeira do combate à corrupção também estava lá, antecipando uma corrente essencial do compósito de forças que viria a sustentar o governo Bolsonaro: o “lavajatismo”.

Fernando Schüler observa que a comunicação rápida por Facebook, Twitter e WhatsApp “diminuiu o custo” da participação efetiva na política, trazendo mais pluralidade ideológica à democracia brasileira. Graças à destreza na elaboração de posts e memes, os arrivistas da direita podiam competir com as pesadas e burocráticas instituições de esquerda – centrais sindicais, por exemplo – na guerra de propaganda.

As redes sociais baixaram a barreira de entrada na política”, concorda Pablo Ortellado, da USP, um estudioso dos impactos da internet na política.

Em política, é claro, qualquer simetria entre lados opostos será sempre imperfeita, quando não enganosa, e o quanto cada lado atenta de fato contra a democracia é matéria aberta para debates renhidos. Eugênio Bucci diz que o governo Lula não é comparável ao governo Bolsonaro, que representaria, sim, uma ameaça real à democracia – ele cita a permanente ridicularização da imprensa e a insistência em medidas como o excludente de ilicitude para policiais (que a Câmara dos Deputados retirou do pacote anticrime) como evidências da vontade autoritária do presidente.

Fernando Schüler prefere ver a eleição de Bolsonaro como uma prova da pluralidade e da vitalidade da democracia brasileira, que, afinal, tem um governo de direita depois de um longo ciclo esquerdista.

Resta o fato indisputável de que a polarização tornou-se a dinâmica da política hoje. Bolsonarismo e lulismo alimentam-se mutuamente – Pablo Ortellado observa que, em resposta ao antipetismo radical hoje vigente, o PT tornou-se ainda mais centralizado em torno de Lula. “Antigamente, o PT ainda fazia de conta que tinha debates internos e prévias. Hoje em dia, eles (dirigentes do partido) nem disfarçam: dizem que estão à espera das decisões de Lula.” Pode-se supor que o confronto dessas forças extremadas vai dominar a política por muito tempo. Mas, claro, no início da década, ninguém imaginava que Jair Bolsonaro seria presidente.

 

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