Sexta-feira, 29 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 28 de julho de 2024
A decisão de um mafioso italiano de iniciar um processo de colaboração com a Justiça deverá trazer mais detalhes sobre os negócios entre a máfia calabresa e o PCC, a principal facção criminosa brasileira. De acordo com autoridades brasileiras e italianas, os dois grupos operam uma parceria que envolve o comércio de cocaína e de armas.
Em entrevista ao jornal Valor Econômico, Giovanni Borbardieri, promotor de Justiça da região italiana da Reggio Calábria e integrante da direção distrital antimáfia, disse que o acordo de colaboração pode ajudar a abrir novas frentes de investigação na Itália e também no Brasil.
O mafioso colaborador é Vincenzo Pasquino, integrante da N’Drangheta, organização que nasceu na Calábria e que se tornou uma das forças dominantes nos negócios das drogas na Europa.
Pasquino foi preso no Brasil em 2021 e enviado para a Itália, onde está preso. Ele iniciou um acordo de colaboração com a Direção Distrital Antimáfia de Reggio Calabria, disse o promotor.
“Trata-se de um dado investigativo de particular relevância que deverá ser aprofundado em razão do importante papel de intermediário da ‘Ndrangheta que Pasquino desempenhou”, afirmou ele.
“Os elementos que Pasquino pode fornecer podem abrir caminho para o avanço de investigações no campo do tráfico internacional de entorpecentes e além disso constituir base de trabalho a ser apresentada às autoridades brasileiras para o início de conexões investigativas muito importantes.”
Pasquino foi detido junto com um chefão da ‘NDrangheta, Rocco Morabito, que também estava no Brasil – em João Pessoa. Outros acusados de serem membros da máfia já tinham sido presos no Brasil, Argentina e Paraguai.
A ‘Ndrangheta é uma das organizações criminosas mais difundidas e perigosas do mundo.
Mesmo com o surgimento de novos protagonistas no narcotráfico internacional, como as organizações criminosas albanesas, a ‘Ndrangheta continua sendo, um interlocutor privilegiado dos cartéis sul-americanos”, afirmou Bombardieri, que há anos atua no combate à máfia.
Nos últimos anos, a caçada à ‘Ndrangueta passou a revelar a extensão da sociedade entre os criminosos italianos com traficantes do Brasil. “Podemos dizer que hoje as relações entre o PCC e a ‘Ndrangheta são cada vez mais fortes”, disse Bombardieri.
Segundo ele, não está claro quando os dois grupos começaram a operar a parceria. “Mas nossas investigações nos permitem verificar que cada vez mais o PCC mantém relações com expoentes da ‘Ndrangheta no tráfico internacional de drogas e de armas.”
Além da colaboração de Pasquino, o quebra-cabeças sobre os acordos entre PCC-‘Ndrangheta vem sendo montado graças a investigações que incluem a decodificação de chats criptografados usados no tráfico de drogas.
Bombardieri diz que os laços com o PCC e que a entrada de novos players na logística do narcotráfico estão mudando o quadro de oferta de cocaína à Europa. “Com certeza o tráfico se intensificou e as formas de envio de drogas e os fluxos financeiros com os quais esses envios são pagos se diversificaram, inclusive com o envolvimento de organizações criminosas chinesas”, disse o promotor.
“Nas últimas investigações, descobriu-se que a ‘Ndrangheta, para transferir as grandes somas de dinheiro necessárias para pagar os carregamentos de narcóticos, também usa organizações criminosas chinesas que providenciam o saque do dinheiro em espécie e, em seguida, transferem-no para pontos de coleta na Itália e no norte da Europa e, a partir daí, providenciam o envio, por meio de compensação, para os fornecedores na América do Sul e para indivíduos indicados por eles.”
A cocaína é produzida na Colômbia, no Peru e na Bolívia. Parte da droga passa pelo Brasil e é enviada camuflada em cargueiros para portos europeus. Uma parcela menor segue em voos comerciais. Somente no início de 2021, autoridades rastrearam 30 toneladas da droga na conexão com a máfia calabresa. No Brasil, o porto de Santos, tem sido palco do maior número de apreensões de cocaína; na Itália, é o porto calabrês de Gioia Tauro. Autoridades europeias usam como referência os seguintes números para cotação da cocaína na Europa: o preço do quilo varia de 40 mil a 70 mil euros.
O combate à expansão de organizações criminosas do Brasil para outros países tem sido um dos temas da agenda do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski. Em fevereiro, Brasil e Alemanha se comprometeram a intensificar a cooperação para cercar narcotraficantes e lavadores de dinheiro. Em julho, o ministro discutiu o tema com autoridades de Portugal. O cerco ao crime organizado é uma das prioridades do ministério.
“O PCC é uma organização criminosa grande e perigosa que atua no tráfico internacional de drogas há algum tempo e, portanto, é evidente que seu relacionamento com a ‘Ndrangheta representa uma séria ameaça às políticas italianas e europeias contra o tráfico de drogas”, afirmou o promotor. Para ele, a cooperação internacional tem se mostrado a ferramenta mais importante e eficaz na luta contra o tráfico. As informações são do jornal Valor Econômico.