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A “defesa da democracia”

Pesquisa revela que 42% das pessoas entre 18 e 35 anos preferem um regime militar como forma de governo. (Foto: Reprodução)

Tão clichê quanto a miss que diz em seus discursos querer a paz mundial é o político que afirma “lutar pela defesa da democracia”. No âmbito político, contudo, ao contrário dos concursos de beleza, isso só faz sentido quando acompanhado de algum ataque aos concorrentes. Insinua-se, como padrão, que os outros representam um ataque à Constituição – e apresenta-se, é claro, como a única solução.

O círculo é tão vicioso que não há concorrente algum isento da exata mesma acusação que infere sobre os outros. E os discursos são estruturalmente tão parecidos que, quando distraídos, podemos até achar que são a mesma pessoa com vozes (e alguns acessórios) diferentes. Os mais experientes conseguem fazer com que conceitos simples e amplamente conhecidos pareçam novos e complexos, para que possam distorcê-los a seu benefício. O nome da arma, segundo George Orwell, chama-se “novilíngua”, e a vítima da vez – atacada de todos os lados – é a democracia.

Quantas atitudes antidemocráticas são necessárias para defender a democracia, afinal? A campanha para presidente do Senado, que será eleito nesta quarta-feira, só reforça que a nova política está longe de ser nova. É com uma frustração cômica que o povo brasileiro consegue, mais uma vez, ser surpreendido por fatos que nunca estiveram realmente fora do seu campo de visão: a interferência entre os poderes ora na base do coleguismo, ora na base do medo, nunca deixou de existir. O prometido diálogo franco, aberto, institucional e republicano segue existindo apenas na teoria. A harmonia entre os poderes, quando vira imposição, passa a ser uma contradição em si. E só evidencia que a concentração do poder aniquilou a tão almejada independência.

Há muitos interessados em defender a democracia, de fato. Mas basta que ela ameace suas posições e sofrerá novas distorções – para ser reapresentada como algo sutil e estrategicamente diferente, antes de voltar a ser defendida com a veemência de sempre. Já que “novilíngua“ é a estratégia da vez, ouso dizer que a democracia, hoje, não passa de uma isca, a desculpa perfeita para qualquer atitude antidemocrática.

Patrícia Bonafé Turmina, empresária e associada do IEE

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