Sexta-feira, 10 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 3 de abril de 2021
Animada após uma noite de sono bem dormida, mas ainda com a voz cansada — reflexo dos últimos três meses e meio de batalha travada na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) —, a deputada Isa Penna (PSOL) considera o período de 113 dias entre o assédio sexual cometido contra ela, pelo deputado Fernando Cury (Cidadania), no plenário da Alesp, em 16 de dezembro, e a decisão unânime pelo afastamento do parlamentar pelo período de 180 dias, na última quinta-feira (1º) como “os piores meses” que já viveu ao longo de seus 30 anos.
Confira trechos da entrevista a seguir:
1) Em mais de uma ocasião ao longo desses meses a senhora disse que foi “revitalizada”. O que é a revitimização e como ela torna esse processo ainda mais difícil? Pode dar exemplos?
Tem algumas dimensões. Primeiro, porque eu tenho certeza de que o assédio mesmo, ele se estendeu. Esse caso… Eu já fui procurada por algumas instâncias que querem levar esse caso como um caso que é muito demonstrativo da violência politica institucional de gênero. A coisa de você ter de entrar e você saber… A diferença é de que é um processo político, então, tudo está sempre em disputa. Eu tive de me colocar num lugar de, eu sou a vítima, eu sou a minha própria advogada, no sentido de quem eu, como parlamentar, tenho voz. Eu tenho que tomar decisões muito importantes, eu tenho que dialogar e escutar pessoas que eu sei que fizeram parte e arquitetaram essa violência toda contra mim. Essa violência toda não foi uma tentativa contra a Isa Penna. Essa violência toda foi uma violência contra a presença das mulheres na política e nos espaços de poder. Eu não acho que fui revitimizada, acho que fui vítima de uma sequência de episódios de assédio. Aqui, estou me referindo especificamente aos deputados lá no Conselho de Ética. Em especial a figura do deputado Wellington Moura (Republicanos). Eu não sei ainda o que ele ganhou nessa história, mas nós veremos. Eu não acho que eu fui vítima de um episódio. Eu fui vítima de um episódio de assédio físico. Depois disso, fui vítima de episódios de violência psicológica, igual a Mari Ferrer naquela audiência.
2) Como foi essa articulação para a construção do PL?
Foi uma articulação que surgiu, principalmente, das mulheres do PSOL, mas que a gente convida todas as mulheres de todos os partidos políticos, que sabem o que é ser mulher na política, a se somarem a isso. Não importam se concordam com a gente em todo o resto que a gente defende. A gente quer que as mulheres do PSDB que estavam comigo, as mulheres do Novo, todas as mulheres. Queremos que elas venham conosco nesse projeto de lei. Esse PL vai ser encampado pela líder de bancada do PSOL, a Talíria Petrone (RJ), que, inclusive tem ameaça de morte, a ONU está cuidando do caso dela, mas também vai ser protocolado em todas as casas legislativas que o PSOL está. Nós convidamos todos os partidos a serem coautores e todas as autoridades a aprovarem esse projeto de lei, essas medidas que vão vir desse pacote para repensar acultura do estupro no Brasil, a violência institucional. É um convite a todas as mulheres que estiveram comigo até aqui, para a gente conquistar vitórias que sirvam ainda mais para todas as mulheres.
3) O episódio do assédio teve repercussão nacional. Acredita que o impacto da decisão terá a mesma proporção?
Senti imediatamente (a repercussão). Foi uma coisa de muita comoção. No fim da sessão, eu tava pensando sobre os seis meses não ser exatamente… Mas na hora em que eu vi a comemoração das mulheres, e mais, eu acho que é interesse público que essa decisão precisa ser divulgada. É um dever das instituições divulgarem isso. Porque ela abre um precedente inédito na história do Brasil. Essa decisão reconhece que há violência política de gênero, que há violência institucional de gênero, que a violência machista está dentro do Estado brasileiro e isso é histórico. Essa decisão vai servir de subsídio para outras mulheres que queiram questionar essa realidade em seus locais de atuação.