Por maioria de votos, a 6ª Câmara Cível do TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul) decidiu que o blog sociosgboex.blogspot.com.br deve retirar de sua identificação o ‘‘GBOEX’’, sob pena de multa diária. O colegiado negou, porém, o pedido de indenização por danos morais e materiais, deferido em primeira instância.
A decisão levou em conta que um site não pode usar na composição de seu endereço virtual um nome ou palavra que indique marca já registrada no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), ainda mais se o objetivo é criticar, censura e deprecia a empresa, enfraquecendo-a e marginalizando-a frente ao público.
‘‘Realmente, a marca GBOEX é marca forte, peculiar e de renome, não se trata de marca simplesmente evocativa também chamada de marca sugestiva ou marca fraca, por isso, nesse cenário, não se justifica o réu sacrificar a marca da autora, que sequer registro detém da mesma, criticá-la e depreciá-la pelo só fato de que registrou em seu blog antes’’, registrou o acórdão do TJ-RS.
Já os ataques contra a imagem da empresa no blog não foram objeto da ação. O conteúdo dos textos e demais postagens, atentatórias, em tese, à imagem da empresa, estão sendo analisados em outro processo. Atualmente, há um blog com o endereço sociosxxxxx.blogspot.com – a última postagem foi feita em dezembro do ano passado.
O processo
Fundada em 2013 no Colégio Militar de Porto Alegre, a entidade aberta de previdência complementar tinha como principal finalidade amparar financeiramente as famílias de associados militares falecidos. Em 1965, expandiu a sua abrangência, passando a permitir civis na clientela.
Titular da marca GBOEX, a empresa ajuizou ação ordinária contra o responsável pelo blog, alegando condutas ilícitas e ofensivas. Dentre as alegações, a de que o uso não autorizado da marca estaria confundindo os internautas, que não sabem distinguir entre um órgão difusor de informações oficiais da empresa de outro dedicado a criticá-la. Com isso, pediu a suspensão e abstenção de uso do domínio do blog na internet, com o pagamento de indenizações por danos morais e materiais.
Citado pela 12ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, o titular do blog declarou ser sócio do GBOEX desde 1964, com condições de ser votado, mas foi formalmente declarado ‘‘inimigo capital da administração’’ da empresa em duas oportunidades.
Ele sustentou que o uso da marca para a identificação de seu blog não tem impedimento legal, não tem objetivo comercial e não é capaz de causar prejuízo ao seu caráter distintivo. Também mencionou decisões em demandas semelhantes, nas quais foi indicada a possibilidade de uso da marca ou expressão, e argumentou que o conteúdo das mensagens não causa ofensa à honra da parte autora.
O juiz Juliano da Costa Stumpf julgou improcedente a ação ordinária, por entender que, no caso concreto, não ficou caracterizada a prática de ilícito cível. Ou seja: não houve ‘‘uso indevido’’ de domínio registrado por terceiro, já que a parte ré utilizou o seu próprio domínio, registrado na plataforma blogspot.com
‘‘Assim, certo entender que não se está a tratar efetivamente do uso de um domínio que incorpora a marca GBOEX, mas sim de blog que tem a expressão no seu nome ou elemento de identificação, o que não se confunde tecnicamente com domínio’’, analisou na sentença.
Por outro lado, o magistrado observou que o registro de marca no INPI não assegura, necessariamente, o direito ao domínio na internet, pois vigora no Brasil o princípio da primazia, segundo o qual o direito ao nome de domínio será conferido ao primeiro requerente que satisfizer, quando do pedido, as exigências para o registro.
‘‘A denominação ou o nome do blog, assim, não permite concluir que o réu tinha a intenção de se passar pelo próprio GBOEX. O conteúdo crítico das postagens revela justamente o contrário e reforça a compreensão que se trata de meio de identificação para os interessados em seu conteúdo e não o uso indevido de domínio ou marca registrada em nome do autor’’, diz o texto da sentença.
Apelação
O relator do recurso de apelação na 6ª Câmara Cível, desembargador Luís Augusto Coelho Braga, se convenceu de que a questão foi solucionada de forma eficaz pelo juízo de primeiro grau, ‘‘sem merecer reparos’’. Afinal, segundo Braga, os autos não trazem provas de que o domínio sociosgboex.blogspot.com.br esteja causando desvio de clientela ou diluição da marca, indução dos consumidores em erro ou aproveitamento parasitário, de forma que inexiste violação à marca ou atos de concorrência desleal.
No entanto, a apelação acabou parcialmente provida porque prevaleceu o entendimento majoritário capitaneado pelo voto divergente do desembargador Niwton Carpes da Silva, que redigiu o acórdão. No efeito prático, Carpes decidiu que o réu deve se abster de usar o nome GBOEX no domínio de seu blog, pois essa marca pertence à parte autora e está devidamente registrada no INPI desde julho de 1971.
‘‘Se a utilização do mesmo nome registrado no INPI já é algo agressivo e ilegal, imagine-se a hipótese de um dos domínios se prestar à veiculação de propaganda e crítica sistemática e depreciativa a respeito do outro, justamente contra quem detém o registro e proteção marcaria. É impensável’’, complementou no voto vencedor.
Para Carpes, a adoção do princípio da primazia não é absoluta, exigindo ponderação e reflexão: ‘‘A orientação jurisprudencial do egrégio STJ [Superior Tribunal de Justiça] defende a aplicação do alegado princípio, mas pondera com a relativização do mesmo em algumas hipóteses, que eu penso seja exatamente o caso telado, onde o réu usa o nome da autora no domínio de internet em seu blog e ainda a crítica, censura e a deprecia, obviamente que enfraquece, difama e marginaliza a marca protegida’’.
(Marcello Campos)