O distanciamento afetivo entre pais e filhos não constitui, por si, situação capaz de gerar dano moral, nem implica ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana. Antes, trata-se, apenas, de um fato lamentável da vida. A conclusão é da 7ª Câmara Cível do TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul), ao negar apelação de uma mulher que busca indenização por abandono afetivo do pai.
Ela interpôs recurso contra a sentença proferida pela 1ª Vara de Família da Comarca de Pelotas, que considerou improcedente a sua solicitação. Na apelação, a autora se queixou que o pai, réu na ação, deixou de procurá-la após se mudar para o Rio de Janeiro.
Argumentou, ainda, ter se sentido humilhada por ser chamada de “porquinha” diante do próprio juiz durante uma das audiências do processo, e que teria passado a sofrer episódios de depressão por causa da rejeição paterna. Na sustentação, a mulher afirmou que os laudos são “absurdos” por constatarem que, se não há abandono material, não se verifica o abandono afetivo.
Em suas contrarrazões recursais, o pai da mulher considerou que a sentença não merece reparos. Isso porque a mãe da autora praticava alienação parental, afastando-o da filha e, na prática, transformando-o em “um mero pagador de pensão alimentícia”.
Em primeiro lugar, o desembargador Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, observou que a eventual falta de atenção do pai em relação à filha decorreu de quatro fatores básicos. São eles:
O fim do casamento entre a mãe e o pai, o fato de o réu ter passado a residir em outro Estado, a ocorrência de novos relacionamentos afetivos por parte da mãe da autora da ação (levando esta a estabelecer vínculos afetivos com esses padrastos, que assumiram o referencial paterno) e o distanciamento físico e afetivo decorrente de todo esse contexto. Ou seja, o pai não violou direito algum da filha.
“De outra banda, não se pode desconhecer que afeto é conquista e reclama reciprocidade, não sendo possível compelir uma pessoa a amar outra”, sublinhou o magistrado em decisão monocrática. “A convivência familiar somente é possível quando existe amor. E amor não pode ser imposto, nem entre os genitores e nem entre pais e filhos”.
Ponderações
Ainda conforme o desembargador, a simples presença do pai na vida do filho não assegura um desenvolvimento saudável, nem a ausência é fato impeditivo deste desenvolvimento. O mais é importante é que o filho seja educado em um ambiente permeado pelo equilíbrio, onde as relações familiares sejam saudáveis, com ou sem a presença de um dos pais.
“Além disso, pais ajustados podem gerar filhos desajustados, e a ausência do pai ou da mãe também não enseja condenação a uma vida permeada de conflitos”, prosseguiu, mantendo os termos da sentença.
“Por essa razão é que devem ser evitadas soluções simplistas ou maniqueístas e somente em situações excepcionais é que se pode conceber a possibilidade de reparação por dano moral no âmbito do direito de família”, finalizou. “Ou seja, quando se evidencia alguma situação anormal, grave ou teratológica, o que decididamente não ocorre no caso em exame, tanto que sequer foi descrita na petição inicial.”
(Marcello Campos)