Uma das páginas mais importantes da história do automobilismo mundial terminou de ser escrita nesta segunda-feira (20). Aos 70 anos, morreu Niki Lauda, tricampeão mundial de Fórmula 1 e atual presidente não executivo da Mercedes. Em 2018, Lauda passou por um transplante de pulmão e só recebeu alta depois de ficar mais de dois meses internado. No começo deste ano, o tricampeão ficou mais dez dias no hospital após ter febre durante as festas de fim de ano. As primeiras informações dão conta de que ele estava em Viena, teve falência renal e morreu ao lado dos familiares.
“Com profunda tristeza, anunciamos que nosso amado Niki morreu pacificamente com sua família na segunda-feira, 20 de maio de 2019. Suas realizações únicas como atleta e empreendedor são e permanecerão inesquecíveis; seu incansável entusiasmo pela ação, sua franqueza e sua coragem permanecem um modelo e uma referência para todos nós. Era um marido amoroso e atencioso, pai e avô longe do público, que sentirá sua falta”, diz o e-mail assinado com a família de Lauda.
Lauda era casado desde 2009 com Birgit Wetzinger, que lhe havia cedido um rim para transplante quatro anos antes, quando o órgão doado em 1997 pelo irmão Florian teve problemas. Os dois tinham os gêmeos Max e Mia. Entre 1976 e 1991, o ex-piloto já tivera matrimônio com Marlene Knaus, com quem teve dois filhos, Mathias e Lukas. O tricampeão tinha ainda um outro filho fora do casamento chamado Christopher.
No começo de julho de 2018, Niki Lauda descansava com a família em Ibiza, na Espanha, onde pegou uma forte gripe. O quadro evoluiu para febre alta com uma forte tosse, e o ex-piloto viajou em seu jato particular para a Áustria, onde se internou. Inicialmente, Lauda recebeu tratamento intensivo para o vírus, e aparentou melhora. Mas o estado se agravou, e os médicos decidiram transplantar o pulmão, embora tenham garantido que as complicações não eram relacionadas ao grave acidente sofrido na pista de Nürburgring, em 1976 – na ocasião, o austríaco teve graves queimaduras e inalou gases tóxicos, escapando da morte por pouco.
Sem apoio da família, Niki teve ascensão fulminante
Nascido em 22 de fevereiro de 1949, Andreas Nikolaus Lauda era de família rica. Apesar de ter passado uma juventude abastada, o austríaco quis seguir carreira no automobilismo. Sem apoio do avô banqueiro e dos demais familiares, Niki tomou um empréstimo num outro banco e passou a investir na carreira. Depois de comprar uma vaga na equipe March de Fórmula 2, Lauda rapidamente foi convidado para correr na F1, estreando no GP da Áustria de 1971.
Depois de correr a temporada de 1972 pela equipe inglesa, Niki pegou outro empréstimo bancário e passou a correr na antes vitoriosa BRM, que, no entanto, já não vivia seus melhores dias. Mesmo assim, impressionou pela precisão na troca de informações com os engenheiros e mecânicos, e marcou seus primeiros pontos numa época em que apenas os seis primeiros colocados somavam. Indicado por Clay Regazzoni, foi contratado pela Ferrari para 1974.
Numa temporada em que a equipe italiana ressurgiu após longo período de resultados ruins, Lauda marcou nove poles e venceu suas duas primeiras corridas, na Espanha e Holanda. Chegou a liderar a tabela, mas acabou sendo superado nas provas finais, e Emerson Fittipaldi conquistou o título. Em 1975, porém, Niki venceu cinco provas e o campeonato por antecipação.
Inferno em Nürburgring e volta por cima
Em grande forma, Lauda seguiu dominando em 1976. Mas, depois de vencer cinco corridas e subir ao pódio em oito das nove primeiras corridas do ano, Niki sofreu um gravíssimo acidente no perigoso circuito de Nürburgring, na Alemanha. Curiosamente, o austríaco havia liderado um movimento dos pilotos para boicotar a corrida, mas acabou sendo derrotado e ele mesmo sentiu as consequências.
A condição de Lauda após o acidente era tão delicada que um padre foi chamado para lhe aplicar a extrema-unção, mas foi duramente repelido pelo próprio Niki. De forma impressionante, ele se recuperou e, apenas 43 dias depois da batida, estava ao cockpit de sua Ferrari, nos treinos para o GP da Itália. Na volta, com o rosto quase desfigurado, Lauda explicou que, no hospital, se concentrava em não dormir porque sabia que poderia morrer a qualquer momento.
Nas provas finais de 1976, Lauda ainda brigou pelo título com o inglês James Hunt, que, aproveitando a ausência do adversário, encostara na tabela do campeonato. Na decisão do título, em Fuji (Japão), choveu demais e Lauda desistiu da prova, alegando falta de segurança. Hunt terminou em terceiro e se sagrou campeão com um ponto de vantagem. A rivalidade entre Lauda e Hunt foi retratada mais de 30 anos depois no longa-metragem “Rush”.
Cansado de correr em círculos, como ele mesmo explicou, o austríaco decidiu abandonar as pistas repentinamente em 1979, durante os treinos para o GP do Canadá. Já interessado em aviação e milionário, o então bicampeão fundou a Lauda Air.
Retorno pela McLaren
No fim de 1981, Lauda vinha tendo problemas com sua companhia aérea e decidiu aceitar uma milionária oferta Ron Dennis para voltar a correr, pela McLaren.
Aos 33 anos, Lauda voltou em boa forma e, numa temporada que teve 11 vencedores diferentes, ganhou duas provas, em Long Beach e Brands Hatch, e chegou a ter remotas chances de título. Terminou em quinto lugar. Mas em 1983, a McLaren ficou para trás na guerra com as equipes que usavam motores turbo, e o austríaco terminou em décimo.
Após abandonar a carreira de piloto, Lauda seguiu tocando a companhia aérea até vendê-la, em 1999. Depois, o austríaco deu início a uma nova empresa de transporte aéreo, a Niki, que foi adquirida em 2011 pela Air Berlin. Há dois anos, Lauda assumiu o controle da Amira Air e a renomeou para LaudaMotion.
Enquanto isso, o tricampeão seguia na Fórmula 1. Nos anos 1990, foi consultor da Ferrari. Mas Niki teve sucesso mesmo como presidente não executivo da Mercedes, desde o fim de 2012.