Quarta-feira, 27 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 11 de fevereiro de 2019
A operação financeira mais exitosa da Venezuela nos últimos anos não aconteceu em Wall Street, mas em primitivos campos de garimpo de ouro no sul do país. Com o derretimento da economia venezuelana, cerca de 300.000 garimpeiros invadiram essa área de floresta rica em ouro para tentar fazer fortuna em minas improvisadas.
Suas picaretas e pás estão ajudando o governo de Nicolás Maduro. Desde 2016, o regime comprou dos garimpeiros 17 toneladas de ouro, que valem cerca de US$ 650 milhões (R$ 2,5 bilhões), de acordo com os números mais recentes do Banco Central venezuelano. As informações são da agência de notícias Reuters.
Pagos em bolívar, moeda local praticamente sem valor, os garimpeiros amadores por sua vez abastecem o governo com moeda forte para que possa importar alimentos e produtos de higiene.
Apesar do pequeno impacto desse comércio de ouro nos mercados internacionais, o governo americano tem usado sanções e intimidação em um esforço para evitar que Maduro use o ouro para manter seu governo.
Donald Trump tem pressionado o Reino Unido a não liberar reservas de US$ 1,2 bilhão (R$ 4,5 bilhões) em ouro que a Venezuela tem depositadas no Banco da Inglaterra. Recentemente, uma empresa de investimentos dos Emirados Árabes Unidos foi punida pelos EUA por ter comprado ouro venezuelano.
A existência do programa de ouro de Maduro é conhecida, mas sua operação não. Para tentar entendê-lo, a Reuters rastreou o ouro das minas na selva por meio do Banco Central em Caracas até refinarias de ouro e exportadores de alimentos no exterior, conversando com mais de 30 pessoas.
O que surge é um retrato de um experimento desesperado de laissez-faire na política industrial pelos líderes venezuelanos. As sanções americanas abateram a indústria do petróleo e prejudicaram a capacidade de empréstimo do país.
O setor formal de mineração foi dizimado pela nacionalização. O governo de Maduro então liberou os garimpeiros para extrair a riqueza mineral do país sem qualquer regulação ou investimento estatal.
A Venezuela agora depende pesadamente de trabalhadores como José Aular, um adolescente de 18 anos que diz ter contraído malária cinco vezes em uma mina na fronteira com o Brasil.
Aular trabalha 12 horas por dia carregando sacos de terra para um pequeno moinho que usa mercúrio para extrair o ouro. Acidentes são comuns nos garimpos, assim como tiroteios e assaltos. “O governo sabe o que acontece nas minas e se beneficia disso. O ouro vai para as mãos deles”, diz o jovem.
Maduro também recebeu apoio crucial do presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan. A Venezuela vende a maior parte do seu ouro para refinarias turcas e então usa parte do lucro para comprar bens de consumo, de acordo com pessoas com conhecimento direto do tema. Massa e leite em pó turcos são agora parte do programa de alimentos subsidiados. O comércio entre os dois países cresceu oito vezes no ano passado.
Uma ordem executiva do governo americano proíbe empresas e cidadãos americanos de comprar ouro venezuelano, mas a norma não se aplica a estrangeiros. Ancara afirmou aos EUA que todo o comércio com a Venezuela está de acordo com a legislação internacional.
Em dezembro de 2016, a Venezuela anunciou um voo direto entre Caracas e Istambul pela Turkish Airlines. Dados de comércio desde então mostram que os aviões estão levando mais que passageiros.
No dia 1º de janeiro de 2018 o Banco Central da Venezuela começou a enviar ouro para a Turquia, com uma carga de US$ 36 milhões do minério para Istambul. As remessas chegaram a US$ 900 milhões (R$ 3,3 bilhões) no ano passado, de acordo com relatórios de comércio da Turquia.
O Banco Central da Venezuela tem vendido o seu ouro direto para refinarias turcas, de acordo com duas fontes governamentais da Venezuela. A receita é direcionada ao banco venezuelano de desenvolvimento Bandes para importação de bens de consumo.
Os compradores incluem a Istambul Gold Refinery (IGR) e a Sardes Kiymetli Mandele, uma empresa de importações turca, de acordo com uma pessoa que trabalha na indústria de ouro turca, assim como um diplomata baseado em Caracas e dois servidores venezuelanos. A IGR negou em entrevista à Reuters estar negociando com Caracas. A Sares não respondeu aos pedidos de comentário.