Sábado, 28 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 15 de junho de 2024
Nesta semana, a Câmara dos Deputados aprovou um pedido de urgência para o projeto de lei que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples – ainda que a Constituição brasileira não estabeleça limite de tempo gestacional para os casos de interrupção legal da gravidez.
Em abril, o Conselho Federal de Medicina (CFM) fez um movimento semelhante ao publicar uma resolução em que proibia a realização de um procedimento necessário para o aborto depois da 22ª semana, a assistolia fetal. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a medida.
Mas afinal, o que é a assistolia fetal, técnica que está no centro das propostas recentes que buscam restringir o aborto legal, e por que ela é defendida pelos especialistas para os casos de interrupção da gravidez em fases avançadas?
A assistolia fetal é um método recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) quando a gestação é interrompida acima de 20 semanas, segundo as últimas diretrizes divulgadas em junho de 2023.
Consiste na injeção de determinados agentes farmacológicos, geralmente o cloreto de potássio, para interromper os batimentos cardíacos do feto, que depois é retirado da barriga da mulher para completar o procedimento do aborto.
Na época da resolução do CFM, Rosires Pereira, presidente da Comissão Nacional Especializada em Violência Sexual e Interrupção Gestacional Prevista em Lei da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), explicou que a assistolia é indispensável:
“Sem a conduta da assistolia fetal, a interrupção da gravidez tardiamente não pode ser realizada. Porque o direito na Lei é para um aborto que tire a vida do feto. Mas a indução do parto nessa fase gestacional pode levar ao nascimento de bebês com vida e com risco de diversos problemas de saúde, como questões neurológicas. E a Lei não define limite de idade.”
Hoje, no Brasil, a interrupção da gravidez é permitida quando há risco de vida para a mulher e quando a gestação resulta de um estupro, de acordo com o Código Penal, além dos casos em que há anencefalia do feto, por entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). Para todos os casos, não há limite de tempo gestacional.
“Os estudos mostram que (a assistolia fetal) é indolor para o feto. Com o feto morto, se induz o aborto, e será expulso via vaginal. Não é um parto. Outra mentira é que esse procedimento é feito com oito ou nove meses. Isso não ocorre. Existe um ou outro caso de sete meses, como aquele de Santa Catarina, porque enclausuraram a menina por motivações ideológicas”, disse o ginecologista Olímpio Moraes, diretor médico da Universidade de Pernambuco e referência em aborto legal no País, em entrevista ao jornal O Globo.
Pereira da Febrasgo lembrou ainda que muitos casos chegam a idades gestacionais avançadas devido a fatores como a baixa oferta de serviços no País, a burocracia necessária para acessar o direito, como exames e, por vezes, autorização judicial, e o fato de grande parte dos casos serem em menores de idade que foram violentadas:
“Como temos poucos serviços que o fazem, muitas mulheres não têm acesso no início da gestação. Outro ponto é que meninas de 10, 11 anos que engravidam por um estupro demoram para buscar o procedimento, porque muito frequentemente a violência vem da própria casa, de familiares. Podem demorar até mesmo para notarem as mudanças corporais. E há muitos casos de violência em que as mulheres são mantidas em cativeiro. São esses casos, que geralmente envolvem mulheres pobres, negras e sem acesso, que serão afetados pela resolução”, continua.