Mais três estados dos Estados Unidos colocaram em vigor leis que proíbem o aborto, restringindo ainda mais o acesso ao procedimento dois meses após a histórica decisão da Suprema Corte de reverter o direito das mulheres à escolha. Governados por republicanos, Tennessee, Texas e Idaho se somaram à dezena de estados que também implementaram leis aprovadas antes da decisão do mais alto tribunal, que estavam até então inativas. Analistas acreditam que metade dos 50 estados deve seguir por esse caminho.
No Texas, a nova lei penaliza até mesmo com prisão perpétua qualquer integrante do corpo médico que praticar um aborto, exceto em caso de risco de morte para a mãe. Essa norma se junta a um emaranhado de textos restritivos que já haviam levado ao fim de fato dos abortos nesse estado de 30 milhões de habitantes.
Também no sul do país, no Tennessee, onde a interrupção da gestação era proibida depois das seis semanas, qualquer um que pratique um aborto pode ser condenado à prisão. Em ambos os estados, não há exceções em casos de estupro ou incesto, e os observadores acreditam que a legislação não é clara sobre o caso de uma intervenção para salvar a mãe.
Em Idaho, noroeste do país, o novo texto permite condenar a dois a cinco anos de prisão quem realizar o procedimento, com exceções para estupro ou incesto. A lei, porém, entrou em vigor com dispositivos bloqueados. O estado não pode processar médicos que realizam abortos pelo bem da saúde da mulher grávida, estabeleceu o juiz B. Lynn Winmill, por meio de uma liminar.
A decisão permanecerá em vigor até uma deliberação sobre um processo judicial que contesta a lei do aborto, determinou o magistrado. Idaho, um estado rural e conservador, foi um dos primeiros a aprovar uma lei estrita que proíbe o aborto na maioria dos casos depois que a Suprema Corte anulou o direito nacional ao procedimento.
No inicio da semana, uma decisão judicial inversa havia sido adotada no Texas, o que ilustra a confusão em torno das batalhas legais que estão se multiplicando em todo os EUA.
Segundo o jornal The Washington Post, há atualmente 21 milhões de mulheres, em 13 estados, com a possibilidade de interromper uma gravidez proibida ou severamente restrita. Desde a anulação da famosa sentença “Roe v. Wade”, de 1973, muitas mulheres que desejam abortar têm que viajar milhares de quilômetros para encontrar uma clínica aberta — isso quando podem financiar a viagem.
Com seis juízes conservadores entre seus nove integrantes, a Suprema Corte derrubou, em 24 de junho, o direito constitucional ao aborto, instituído há quase 50 anos. A decisão devolveu a cada estado norte-americano a prerrogativa de legislar sobre o tema.
A longo prazo, cerca de metade dos estados do país, especialmente os do centro e do sul, conservadores e religiosos, podem proibir ou restringir fortemente o aborto. Em Indiana, uma lei desse tipo entrará em vigor em 15 de setembro.
Eleições
Essa vitória histórica para o movimento conservador provocou uma tormenta política e colocou o assunto no centro da campanha para as eleições de meio mandato, marcadas para novembro. Em contraponto, os estados governados por democratas buscam se tornar “santuários” do direito ao aborto.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, fez da defesa ao acesso à interrupção da gravidez um de seus temas de campanha para mobilizar sua base eleitoral, em particular as mulheres, frente às eleições de novembro, que ameaçam sua frágil maioria no Congresso. “As mulheres têm o direito de escolher o próprio destino e como vivem as suas vidas”, reagiu Biden no dia da decisão da Suprema Corte.
Duas vitórias recentes deram esperança ao campo democrata. No início de agosto, os eleitores do Kansas, um estado tradicionalmente de direita, votaram a favor de manter a garantia constitucional do aborto. Além disso, um democrata que fez campanha pelo direito ao aborto venceu contra seu adversário republicano na eleição de um distrito muito disputado do estado de Nova Iorque.