Quinta-feira, 14 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 19 de setembro de 2024
Vestir o uniforme curto à la soldadinho de chumbo, com chapéu e botas brancas. Ajudar a controlar as crianças no palco. Dar assistência a Xuxa durante os programas. Obedecer às ordens da diretora Marlene Mattos. Desviar dos beliscões dos baixinhos e das pisadas nos pés. Cantar, sorrir e dançar. Ser paquita foi um sonho de uma geração de meninas dos anos 1980 e 1990, que deixou marcas profundas nas crianças e adolescentes que alcançaram o cobiçado posto quando elas tinham entre 10 e 17 anos.
Com cinco episódios, a série documental Pra Sempre Paquitas, da Globoplay, colheu depoimentos e promoveu a reunião de 26 das 28 ex-assistentes de palco de Xuxa. Elas relembram situações de abuso moral que enfrentaram para ser magras ou para aprender a cantar, além do trauma de se sentir excluídas, às vezes, passando por isso sozinhas, sem conversar com os pais. Várias relatam ter enfrentado dificuldades na escola devido à rotina intensa de trabalho. Uma delas compartilha ter sofrido até homofobia.
“A gente fala um pouco sobre os abusos morais, que eram normalizados. É importante não errar no tom, né? A forma de você se expressar e cobrar sobre o corpo de crianças e adolescentes em um momento tão transitório de hormônios e formação de identidade…”, diz Ana Paula Guimarães, ex-paquita e diretora artística da série, que desenvolveu bulimia na adolescência.
A produção também revela os encantos dos programas de Xuxa, primeiro na TV Manchete e depois nas manhãs da TV Globo, entre 1986 e 2002. É impressionante rever como o programa funcionava com uma boa dose de improvisação e espontaneidade. Alda, a mãe de Xuxa, era a responsável por confeccionar os figurinos usados pelas companheiras de palco da filha.
Ana Paula, conhecida também como Catuxa, lembra que a relação entre Xuxa e as paquitas era carinhosa, e que ela dava dicas de maquiagem, de produtos para o cabelo. Era um contato próximo que, posteriormente, foi se alterando: “Eu fui a quarta paquita, e conseguimos criar um grupo mais coeso. Acabava se transformando em uma grande família. As primeiras participaram dessa relação mais caseira, até chegar ao boom que virou a Xuxa, com discos de ouro e de platina. Ela passou a fazer mais viagens internacionais, e a carga de trabalho aumentou. Então, isso foi deixando a pessoa sem tempo livre, né?”.
Hierarquia implícita
Havia também uma hierarquia implícita entre as paquitas, que precisavam ser ágeis durante as gravações. “Tinha quem cuidava das brincadeiras, por exemplo, e essa função exigia mais trabalho, então não era muito disputada. Houve também a responsável por entregar a ficha com as informações para Xuxa e ficar mais próxima dela, fazendo a ponte com Marlene Mattos, que estava na sala de controle. Em cada época, uma delas era a líder. Sempre éramos muito amigas, mas, claro, havia atritos, como em qualquer família”, lembra Ana Paula.
No início, todas eram loiras, mas depois surgiram algumas morenas. “A primeira morena foi Tatiana Maranhão, mas, aos poucos, acabava que todo mundo virava loira. Não sei… acho que você vai querendo pertencer, né?”, reflete. “Na primeira geração, Roberta e Mariana queriam muito ser paquitas, mas não passaram no teste e eram morenas, aí a Xuxa criou as Irmãs Metralhas para elas poderem fazer parte do grupo.” A primeira assistente de palco negra nos programas da apresentadora foi Adriana Bombom, em 1996.
O documentário fez uma viagem de ônibus com as ex-paquitas para São Paulo, como se fosse uma turnê dos velhos tempos, que culminou numa gravação para o programa Altas Horas. Há também abraços e acerto de contas da paquita Heloísa Morgado, que sentiu que não houve uma despedida quando Xuxa se mudou da Manchete para a Globo, e não continuou no projeto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.