Durante uma audiência na 4ª vara do Trabalho de Diadema, em São Paulo, o advogado Rafael Dellova surpreendeu a todos os presentes e deu voz de prisão à juíza Alessandra de Cássia Fonseca Tourinho. O clima de tensão, já instalado, intensificou-se quando o advogado interrompeu o depoimento de sua cliente e, diante de uma ordem da juíza para que a audiência prosseguisse, ele deu a voz de prisão. Este ato provocou um imediato tumulto no local. O caso ocorreu no último dia 2.
Segundo o artigo 301 do Código de Processo Penal, qualquer cidadão está autorizado a deter outra pessoa que esteja cometendo um delito em flagrante, mesmo na ausência de uma autoridade policial. Na prática, porém, é bem diferente.
De acordo com o artigo 33 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), um juiz não pode ser preso se não for por ordem do Tribunal ou do Órgão Especial competente para o julgamento. O único momento em que esta lei pode ser burlada é se o juiz for pego em flagrante cometendo crime inafiançável: racismo, tortura, tráfico de drogas, terrorismo e ataques contra o Estado Democrático de Direito, além dos crimes hediondos (que atentam à vida).
No caso da juíza Alessandra, porém, não há prova de nenhum desses crimes e o abuso de autoridade, alegado por Rafael, não está dentro da classificação necessária para a voz de prisão.
Nas imagens que circulam nas redes sociais é possível ver quando Rafael disse para a juíza que estava dando voz de prisão a ela por abuso de autoridade. Ele alegou que a magistrada gritou com ele durante a audiência e o expulsou da sala.
A juíza negou que tenha gritado e chegou a afirmar que foi Rafael quem tumultuou a audiência. “Eu não gritei com o senhor. O senhor começou a tumultuar a audiência, atrapalhando”, disse a magistrada. “Está gravado, eu tenho direito. Em nenhum momento fui desrespeitoso. A doutora gritou e mandou eu sair da sala”, rebateu o advogado.
Alessandra, então, afirmou: “Doutor, me poupe”. E o advogado respondeu: “Não vou te poupar. Estou dando voz de prisão por abuso de autoridade”. No vídeo ainda é possível ver quando a juíza se retirou da sala, disse no corredor que estava se sentindo ameaçada e que ia chamar a polícia. Rafael a escutou e rebateu, novamente: “E eu fui expulso da sala de audiência. Eu estou dando voz de prisão, Excelência”.
Posicionamento
Após o ocorrido, várias entidades rapidamente se posicionaram em defesa da juíza. A Associação de Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região (Amatra-2) expressaram apoio à Tourinho, destacando a importância da independência judicial e condenando ações que possam comprometer a dignidade da magistratura.
“Condutas desrespeitosas, além de violar o devido processo legal, em nada contribuem para os reais e legítimos interesses dos cidadãos que, por meio de seus advogados, estão em busca de justiça”, escreveu a AMB em nota.
A Amatra-2 também apontou uma possível dimensão de gênero na ação do advogado, sugerindo que a firmeza de uma juíza ao tomar decisões pode ser interpretada de maneira enviesada como uma agressividade indevida. “Caso tal como o de tantas outras juízas, que sofreram e sofrem, em termos estatísticos, como expressiva maioria dos episódios de desrespeito e ofensa ao exercício da Judicatura”, afirmou em nota. As informações são do Terra e do G1.