O ex-presidente Lula não deu o show que gostaria, mas conseguiu evitar que o interrogatório conduzido pelo juiz Sergio Moro gerasse contradições que pudessem incriminá-lo no caso do apartamento triplex, segundo advogados e professores de direito. As perguntas de Moro que não tinham relação com a ação penal, o apartamento do Guarujá (SP) que teria sido ofertado pela empreiteira OAS ao ex-presidente como propina disfarçada, foram criticadas pelo trio.
“Lula não se saiu mal no interrogatório”, diz Gustavo Badaró, advogado e professor de direito penal da USP. “Ele confirmou encontros e situações que os investigadores conheciam, mas negou a prática de atos ilícitos. Foi uma boa estratégia”. Para Badaró, o fato de o juiz ter extrapolado a acusação do Ministério Público é preocupante. “Juiz que extrapola a denúncia é um indício de perda de imparcialidade. No caso do Moro, acho que isso não compromete o seu trabalho, mas acende uma luz amarela”.
Alberto Toron, criminalista e professor na Faap, diz que a insistência do juiz em repetir certas perguntas mostra um alinhamento com a acusação que não deveria existir. “Não posso dizer que o juiz foi parcial. Ele foi respeitoso com o acusado, mas certas perguntas revelam que ele está buscando provas para condenar”, afirma.
Toron inclui nesse rol as perguntas do juiz em torno da indicação de diretores da Petrobras e a insistência em questionar o ex-presidente se ele sabia da corrupção na estatal. Ele diz que o interrogatório longo também faz parte de uma estratégia para “dobrar o réu”, como se fazia na ditadura militar (1964-1985).
Thiago Bottini, professor do curso de direito da FGV do Rio, também classifica como bom o depoimento de Lula com um senão: “Se alguém esperava que o Lula fosse se auto-incriminar, errou feio”.